Brics sindical – outro mundo é possível

Por Maria Clotilde Lemos Petta*

tideNo último dia 15, participei da delegação brasileira no III Brics Sindical, evento que ocorreu em Fortaleza, simultaneamente à 6ª Cúpula dos Chefes de Governo e de Estados dos países Brics. A importância destes eventos é inquestionável, já que se inserem num contexto histórico de transição a uma nova ordem mundial marcado por uma grave crise econômica. Com a concretização dos Brics, abre-se uma alternativa à atual ordem internacional, na qual as grandes potências (Estados Unidos, União Europeia e Japão) exercem sua hegemonia sobre uma grande maioria de nações e povos.

A realização deste terceiro fórum sindical dá continuidade a um movimento de centrais sindicais de trabalhadores dos países que constituem os Brics – China, Brasil, Índia, Rússia e África do Sul. O início ocorreu em dezembro de 2012, no 1º Fórum Sindical na Rússia, simultâneo à reunião da 4ª Cúpula, quando foi aprovada a Declaração de Moscou. A reunião da 5ª Cúpula, em Durban, em 2013, quando ocorreu o 2º Fórum Sindical dos Brics, aprovou a declaração “Rumo a uma Plataforma Sindical Progressista”.

O III Brics Sindical, realizado em Fortaleza, foi muito representativo, já que reuniu dirigentes sindicais dos trabalhadores do Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul, sendo que a delegação brasileira foi integrada por representantes das principais centrais: CUT, Força Sindical, CTB, UGT, CGTB. Neste fórum, foi aprovada a Carta de Fortaleza. Este documento reafirma os princípios e compromissos assumidos em Fóruns anteriores e manifesta a posição dos dirigentes sindicais quanto à dinâmica dos Brics e quanto às principais reivindicações dos trabalhadores. Há consenso entre os sindicalistas de que a consolidação dos Brics constitui um elemento importante para o avanço da multipolaridade na ordem internacional abrindo possibilidades de avanço na promoção da paz, da segurança e dos direitos humanos.

No entanto, os dirigentes sindicais questionam a própria dinâmicos dos Brics, que não possibilita a participação oficial dos representantes dos trabalhadores. Nesse sentido, reivindicam que essa instituição reconheça o Fórum do Brics Sindical como um espaço institucional dentro da estrutura oficial do Brics. Reivindicam também que as centrais sindicais estejam representadas nos diversos grupos de trabalho, incluindo no recém-fundado Banco do Desenvolvimento dos Brics. Consideram essa participação como fundamental para que sejam pautados os interesses dos trabalhadores e a promoção de um desenvolvimento sustentável.

É destacada também, na Declaração de Fortaleza, a importância da ação integrada dos Brics em face de profunda crise mundial. É reafirmado o entendimento de que os trabalhadores não podem aceitar as políticas de austeridade aplicadas na Europa e nos EUA como única saída para a crise. O documento defende medidas para frear o “cassino financeiro” e mecanismos de taxação das transações financeiras das grandes fortunas e dos paraísos fiscais. E propõe a aplicação dessas receitas na ampliação do “investimento no setor produtivo e na infraestrutura; nas áreas da educação, ciência e tecnologia; de formação e qualificação profissional, como forma de gerar mais empregos e melhores salários”.

Uma das questões que também mereceu grande destaque nos debates e na declaração do III Fórum Sindical foi a questão ambiental. Há consenso entre os trabalhadores de que o objetivo do desenvolvimento econômico deve estar ancorado também no desenvolvimento socioambiental. O uso sustentável dos recursos naturais, o respeito às comunidades locais e a busca por uma matriz energética de baixo carbono, limpa, devem ser base para o projeto de desenvolvimento. Sendo assim, “o crescimento econômico não pode” estar dissociado da “promoção da segurança alimentar e energética, na erradicação da pobreza, o combate à fome e à desnutrição, bem como as medidas para a criação de empregos necessários à melhoria dos níveis de vida”.

O que chama atenção neste posicionamento do Brics Sindical é que ele expressa uma concepção sindical mais abrangente, na qual os temas são debatidos na sua articulação com a conjuntura internacional dentro de uma dimensão social progressista. É reafirmado o compromisso de luta pela defesa dos direitos dos trabalhadores tais como trabalho decente, piso de proteção social universal e trabalho formal. Nessa concepção, esta luta se articula com uma agenda de desenvolvimento “que coloque a industrialização, a justiça ambiental e o progresso humano através de modelos de crescimento equitativos e justos no centro de nossos compromissos”.

No entanto, embora haja unidade no que se refere aos encaminhamentos de propostas, é evidente que uma participação tão ampla, no caso do Brasil, de cinco centrais, possibilita diferentes análises do significado da participação dos trabalhadores nos Fóruns dos Brics. A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB defende a elaboração de uma plataforma unitária do movimento sindical dos países que integram os Brics. Divanilton Pereira, secretário de Relações Internacionais da CTB, no seu pronunciamento durante o III Fórum, considerou a importância desta plataforma “para que possamos disputar projetos de desenvolvimento e influenciar de forma mais decisiva nas decisões do Brics”. Por isso, conforme Divanilton, é preciso que a classe trabalhadora pressione no sentido de que “o novo arranjo econômico e geopolítico não seja uma mera reprodução do sistema capitalista-imperialista com novos atores”.

Este alerta reforça nossa convicção de que é necessário e urgente aprofundar o debate e a compreensão de que projeto de desenvolvimento e qual ordem mundial interessa aos trabalhadores. Sendo assim, teremos condições de ocupar o espaço em organismos internacionais como os Brics.

Como considerações finais, quero ressaltar a importância do III Brics Sindical realizado em Fortaleza. Reunir dirigentes sindicais de vários países, que vivenciam as mais diferentes realidades, possibilita um rico compartilhamento de experiências. O fato de este fórum ser simultâneo a um evento tão importante como a Cúpula dos Brics também reforça a convicção de que o movimento sindical pode e deve ter papel protagonista neste processo.

O grande desafio que se apresenta para os trabalhadores, na atual conjuntura é sua participação na construção de um projeto de desenvolvimento sustentável com valorização do trabalho e solidariedade entre os povos. Este é o grande desafio! Vivenciar um momento histórico no qual ocorre a transição para uma nova ordem mundial reforça a esperança de que outro mundo é possível.

*Maria Clotilde Lemos Petta é coordenadora da Secretaria de Políticas Internacionais da Contee

Foto da home: CTB

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