CUT participa de seminário de combate ao racismo em São Paulo

Movimento conseguiu avanços nos últimos dez anos de luta, mas a batalha ainda não está ganha

Escrito por: Henri Chevalier – CUT Nacional

Na segunda-feira (18) o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC encerrou uma importante etapa no processo de formação sindical para o combate à discriminação racial. Com a presença da Secretária Nacional de Combate ao Racismo da CUT, Maria Júlia Reis Nogueira; da Secretária Estadual de Combate à Discriminação Racial da CUT/SP, Rosana Aparecida da Silva; e da Deputada Federal Janete Pietá, foram realizados seminários e a diplomação dos alunos do “Curso de Cultura Afro-Brasileira e Africana”, organizado pela Comissão de Igualdade Racial do Sindicato.

Em dez encontros durante o ano de 2013, a formação debateu as políticas públicas construídas para o combate ao preconceito, bem como a história do movimento negro e sua inserção na História do Brasil. Entre os assuntos, se destaca a Lei 10.639, de 2003, que institui no currículo oficial do ensino básico o tema “História e Cultura Afro-Brasileira”.

“É extremamente importante debater a Lei 10.639 e fazer com que ela efetivamente seja aplicada. A história e a cultura dos afrodescendentes precisam ser incluídas nas escolas públicas e privadas porque esse será o diferencial que nos levará a nos apropriar de nossa trajetória e ter embasamento para contrapor toda e qualquer iniciativa racista que vise diminuir as negras e os negros desse país”, afirmou a Secretária Nacional de Combate ao Racismo da CUT, Maria Júlia Reis Nogueira.

Após dez anos, a lei ainda tem dificuldades para ser efetivada. Segundo Daniel Calazans, coordenador da Comissão de Igualdade Racial dos Metalúrgicos do ABC e diretor executivo do sindicato, apenas 5% das escolas brasileiras adotaram em seus currículos o ensino da cultura africana. O número é muito baixo e impacta diretamente na visão que a sociedade tem da cultura negra.

Para o dirigente, é importante trazer à tona características culturais da população negra que não são tocadas cotidianamente. Uma crítica é à abordagem exclusiva dos negros como descendentes de escravos.  “Trata-se o negro como se só tivesse contribuído com mão de obra no Brasil. Quando não foi. Vieram da África grandes pensadores e grandes profissionais qualificados, tanto na área agropecuária, quanto na metalúrgica e em ciências como medicina e matemática. O povo já tinha um valor acumulado, um saber. E tudo isso foi colocado debaixo do tapete”, afirma Calazans. Para ele, apenas nos últimos dez anos estão sendo construídas políticas públicas efetivas de resgate ao valor da cultura negra.

Presidente da CUT/SP, Adi dos Santos Lima, pontua que a Lei 10.639 apenas não está forte porque a sociedade ainda não percebeu que a identidade do povo brasileiro tem raízes africanas. “Para sair do papel, é preciso que a sociedade assuma como um todo a responsabilidade pela aplicação dessa lei. Apenas a lei não resolve. O que resolve são as medidas na prática”.

O professor do Curso, Deivison Nkosi, do grupo Kilombagem, concorda com a necessidade da prática das medidas e lembra que a Lei modifica a educação escolar, mas o combate ao preconceito é necessário em outras estruturas da sociedade. “A lei é uma das ferramentas. Mas é necessário que haja movimentação para outras ações. Se citarmos o PL pela extinção dos autos de resistência [o que diminuiria o número de assassinatos cometidos por policiais em serviço] por exemplo, ele é importante por inibir a possibilidade de extermínio da juventude negra e pobre. É preciso olhar também para a sociedade, para a mídia, apara as forças de repressão do estado”, destaca o professor.

PROBLEMAS DA IMPLEMENTAÇÃO EM SP

A Secretária Estadual de Combate à Discriminação Racial da CUT/SP, Rosana Aparecida da Silva, lembra que a implementação oficial da temática depende de governos estaduais e municipais. O estado de São Paulo, segundo a dirigente, que também é da área educacional, não demonstra disposição para tomar atitudes nesse sentido. “O movimento negro, os ativistas e os sindicatos, fazem formação paralela para implementar a Lei por conta própria. Isso é ruim, é preciso ser implementada como política de estado”, pontua. Para Rosana, é a construção do novo olhar da criança que permitirá que, adulta, ela tenha visões plurais do mundo. “Só se acaba com o preconceito quando se tem educação para a inclusão”, declara Rosana. “A criança não nasce racista. O ambiente social é que a torna um adulto racista.”

PROCESSO LENTO E TRABALHOSO

Segundo a Deputada Federal Janete Pietá, presidenta da Subcomissão Permanente da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) da Câmara e militante do movimento negro, é importante fortalecer o diálogo com os países africanos como forma de aproximar as culturas. E, no Brasil, é necessário que se quebre as estruturas conservadoras de ensino, construídas por uma elite branca.

O processo, segundo a deputada, não é fácil e nem rápido. “Mudar o conceito de educação, como propõe a Lei 10.639 não ocorre de uma vez, rapidamente. É necessário todo esse processo que estamos fazendo, desde a criação da Seppir [Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial], a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, a discussão das cotas nas Universidades Federais”, afirma. “Nós fomos cerceados do conhecimento mais profundo sobre a sabedoria do povo negro. Há um tabu a se quebrar”, lembra a deputada.

Para Pietá, o encontro foi de extrema importância, pois é um momento em que o movimento se encontra, discute e fortalece a mobilização e, neste momento, precisa defender a aprovação de mais um projeto afirmativo em pauta: o PL que reserva 20% de vagas para negros no funcionalismo público federal. “Eu considero que a CUT é fundamental no processo de discussão e esse é um estimulo à continuação do debate”, afirma Janete.

Maria Júlia também elogiou a iniciativa do curso: “Iniciativas como essa contribuem decisivamente para que os sindicalistas tenham visão mais técnica de ações que nós podemos desenvolver. Técnica no sentido de conhecimento da nossa historia, que nos leva a ter mais ações propositivas e positivas na perspectiva de combater o racismo no país.”. Para a dirigente, é fundamental que haja espaços de discussão para além das datas comemorativas e que o processo seja constante. “O curso foi uma sequência de dez encontros, onde se tem o aprofundamento necessário para o debate de um tema tão complexo.”, destaca.

Da CUT

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