Entidades da Igreja Católica divulgam carta em defesa do PL 2630, de combate às fake news
“Garantir transparência nos processos e garantir mecanismos que visam a responsabilização por conteúdos maliciosos não é censura, como vem sendo defendido por grupos opositores ao projeto”, menciona o texto
Organizações ligadas à Igreja Católica no Brasil divulgaram, nesta segunda-feira (8), uma carta em defesa da aprovação do Projeto de Lei (PL) 2630, conhecido como PL das Fake News, que está em tramitação no Congresso Nacional. As entidades consideram que, à luz do Evangelho, a nova legislação trará liberdade, responsabilidade e transparência à internet.
Assinam a carta a Associação SIGNIS Brasil, a Pastoral da Comunicação (Pascom Brasil), o Grupo de Reflexão sobre Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), o Observatório da Comunicação Religiosa (OCR), o Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp) da PUC Minas e a Comissão Brasileira de Justiça e Paz (CBJP).
“Garantir transparência nos processos e garantir mecanismos que visam a responsabilização por conteúdos maliciosos não é censura, como vem sendo defendido por grupos opositores ao projeto”, diz o texto.
As entidades apontam que “a regulação pública das plataformas, a exemplo do que acontece em outras partes do mundo, é fundamental para o pleno exercício da democracia e combate à criminalidade, aos discursos de ódio e à desinformação”.
“O PL também não atenta contra a liberdade religiosa. Há grupos afirmando, de maneira inverídica, que se quer, com a aprovação desta lei, cercear a liberdade religiosa das igrejas. Essa estratégia dos grupos extremistas visa apenas a confundir o debate e a propagar o medo, uma vez que a liberdade religiosa é garantida pela Constituição Federal (artigo 5º, inciso VIII), e isso não será alterado. Afirmamos que a fé não deve ser usada como ferramenta de manipulação”, diz a carta.
Para as entidades católicas, “é importante destacar que a soberania de uma nação só é garantida quando os direitos inalienáveis de seus cidadãos e cidadãs estão garantidos. Não é saudável e seguro permitir que empresas dominem o espaço online sem se submeter aos princípios constitucionais. Da forma como as plataformas operam atualmente, os usuários possuem poucas ou quase nenhuma garantia para reivindicar a proteção de sua dignidade diante de ataques, preconceitos ou mentiras”.
“A ausência de regulação permite que a desinformação gere medo e insegurança na população, como na recente onda de violência nas escolas brasileiras. Muitos dos crimes cometidos nesse âmbito se deram nas plataformas, onde criminosos publicaram ameaças, discursos de ódio e apologia ao nazifascismo”, aponta a carta.
No dia 2 de maio de 2023, o presidente da Câmara Federal, deputado Arthur Lira (PP), adiou a votação do PL 2630, após campanhas de Big Techs e outros grupos extremistas que disseminaram narrativas enganosas nas plataformas. O texto segue sem previsão de data para votação.
Veja a íntegra da carta:
Acompanhamos com atenção a discussão em torno do Projeto de Lei (PL) 2630, em tramitação no Congresso Nacional e prestes a ser votado na Câmara Federal[1], que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet.
A discussão do assunto exige o envolvimento de múltiplos atores sociais, dentre os quais nos colocamos, dada a relevância do debate e os impactos provocados por ele sobre toda a população brasileira. Como organismos eclesiais, temos consciência de que “é dever da Igreja investigar a todo o momento os sinais dos tempos, e interpretá-los à luz do Evangelho” (Constituição Pastoral Gaudium et Spes, n. 4). Por isso, a partir dos princípios do Evangelho, afirmamos a necessidade da aprovação do PL 2630, o PL das Fake News.
Na mensagem para o Dia Mundial das Comunicações em 2018, o Papa Francisco dedicou sua reflexão às fake news e ao jornalismo de paz. Desde então, viu-se o crescimento exponencial da desinformação e seus efeitos nefastos na sociedade e também na Igreja. Na ocasião, já alertava o pontífice que não há antídoto mais eficaz para combater a mentira do que deixar-se purificar pela verdade, que “tem a ver com a vida inteira de todas as pessoas” (Papa Francisco, Mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais 2018).
“O drama da desinformação é o descrédito do outro, a sua representação como inimigo, chegando-se a uma demonização que pode fomentar conflitos. Deste modo, as notícias falsas revelam a presença de atitudes simultaneamente intolerantes e hipersensíveis, cujo único resultado é o risco de se dilatar a arrogância e o ódio.” (Papa Francisco, Mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais 2018)
Por isso, a regulação pública das plataformas, a exemplo do que acontece em outras partes do mundo, é fundamental para o pleno exercício da democracia e combate à criminalidade, aos discursos de ódio e à desinformação. Garantir transparência nos processos e garantir mecanismos que visam a responsabilização por conteúdos maliciosos não é censura, como vem sendo defendido por grupos opositores ao projeto. É indispensável que seja criada uma entidade independente para fiscalizar o cumprimento das regras, instaurar processos administrativos e aplicar sanções.
O PL também não atenta contra a liberdade religiosa. Há grupos afirmando, de maneira inverídica, que se quer, com a aprovação desta lei, cercear a liberdade religiosa das igrejas. Essa estratégia dos grupos extremistas visa apenas a confundir o debate e a propagar o medo, uma vez que a liberdade religiosa é garantida pela Constituição Federal (artigo 5º, inciso VIII), e isso não será alterado. Afirmamos que a fé não deve ser usada como ferramenta de manipulação.
É importante destacar que a soberania de uma nação só é garantida quando os direitos inalienáveis de seus cidadãos e cidadãs estão garantidos. Não é saudável e seguro permitir que empresas dominem o espaço online sem se submeter aos princípios constitucionais. Da forma como as plataformas operam atualmente, os usuários possuem poucas ou quase nenhuma garantia para reivindicar a proteção de sua dignidade diante de ataques, preconceitos ou mentiras.
A ausência de regulação permite que a desinformação gere medo e insegurança na população, como na recente onda de violência nas escolas brasileiras. Muitos dos crimes cometidos nesse âmbito se deram nas plataformas, onde criminosos publicaram ameaças, discursos de ódio e apologia ao nazifascismo. A relutância de algumas plataformas em apagar esses conteúdos e colaborar com a justiça atesta a autopercepção de onipotência e uma injustificável defesa de libertarianismo que se traveste de democrático para, na prática, acobertar o cometimento de crimes.
A responsabilidade social e cidadã, aliada ao compromisso com o Evangelho, nos irmana na defesa de uma legislação responsável diante dos crescentes desafios contemporâneos. O debate não se esgota aqui, dada a evolução rápida e constante das formas de comunicabilidade e de troca de informações, mas, por ora, a urgência é defender o respeito aos direitos humanos, à soberania popular e à cidadania democrática.
8 de maio de 2023
Assinam:
Signis Brasil – Associação Católica de Comunicação
Pastoral da Comunicação (Pascom Brasil)
Grupo de Reflexão sobre Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB)
Observatório da Comunicação Religiosa (OCR)
Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp) da PUC Minas
Comissão Brasileira de Justiça e Paz (CBJP)