Governo Lula vai enfrentar inúmeros desafios de política interna e externa e pode ensejar novo momento democrático para o país

Análise da professora de ciência política da Unesp

Para Maria Teresa Kerbauy, discurso de vitória em tom conciliador feito pelo candidato vitorioso do Partido dos Trabalhadores indica desejo de baixar o tom da disputa extremada que marcou a eleição mais parelha desde a redemocratização. Mas pequena diferença entre candidatos mostra que bolsonarismo vai perdurar como força na política, na sociedade e nas redes sociais.

Após uma disputa polarizada e acirrada, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi eleito neste último domingo (30/10) presidente do Brasil pela terceira vez. Lula derrotou o presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno. O petista conquistou 60.345.999 votos — o equivalente a 50,90% dos válidos. Já Bolsonaro, candidato à reeleição, obteve 58.199.287 votos — 49,10 % dos válidos.

No dia 1º de janeiro de 2023, Lula assume novamente à frente do Palácio do Planalto e se torna o político mais vezes levado ao comando do Poder Executivo pelo voto direto na história da República.

O petista recebeu a maior votação da história, em termos absolutos. O recorde anterior era dele mesmo, em 2006, com 58.295.042 votos. Esta é a quinta eleição que um candidato do PT vence para comandar a nação, sempre em segundo turno, e foi a primeira vez em que um presidente no exercício do mandato perdeu a reeleição.

O experiente político acompanhou a apuração em casa e fez o primeiro pronunciamento em um hotel próximo à avenida Paulista, região central de São Paulo. Em Brasília, Bolsonaro decidiu não se pronunciar sobre a derrota no domingo, e ainda não o fez.

Lula é o primeiro a ser eleito presidente da República pelo voto direto três vezes. Anteriormente venceu em 2002 e 2006. Rodrigues Alves (1902 e 1918), Fernando Henrique Cardoso (1994 e 1998) e Dilma Rousseff (2010 e 2014) venceram duas vezes. Getúlio Vargas foi eleito indiretamente em 1934 e pelo voto direto em 1950.

Agora, Lula volta a liderar o Executivo três anos depois de deixar a prisão em Curitiba, onde foi condenado pela Justiça após investigações da Operação Lava Jato. A sentença, referendada em segunda instância, tirou seus direitos políticos e a chance de disputar a eleição de 2018. À época, ele liderava as pesquisas de intenção de voto. Em 2021, as decisões tomadas pelo ex-juiz Sergio Moro (União Brasil) foram anuladas pelo STF (Supremo Tribunal Federal), medida que gerou a possibilidade dele concorrer nesta eleição.

Conciliação após a vitória

Em seu primeiro pronunciamento após ser eleito presidente, adotou um tom conciliador. Sem citar o nome do seu adversário, o petista criticou o atual presidente e prometeu que vai governar “para 215 milhões de brasileiros e não apenas para aqueles que votaram” nele. “É hora de baixar as armas que jamais deveriam ter sido empunhadas. Armas matam e nós escolhemos a vida”.

Em seguida, Lula foi à Avenida Paulista e discursou para apoiadores e militantes. Diante de uma multidão, ele disse: “Derrotamos o autoritarismo e o fascismo deste país”. “Nós não enfrentamos um adversário. Nós enfrentamos a máquina do Estado brasileiro colocada a serviço do candidato da situação para tentar evitar que nós ganhássemos as eleições”, disse.

Além disso, Lula não só pontuou as falhas da gestão Bolsonaro nas questões econômica, social e ambiental como tocou sutilmente em outros pontos críticos do presidente, como os sigilos de 100 anos adotados sobre diversos assuntos, que o petista criticou durante toda a campanha.

O novo presidente também falou indiretamente sobre sua prisão em decorrência da operação Lava Jato. “Tentaram me enterrar vivo e estou aqui para governar esse país”, disse. Geralmente, durante pronunciamentos e entrevistas, o petista sempre destaca que sua prisão foi motivada para impedi-lo de disputar a eleição de 2018.

Maria Teresa Kerbauy, professora e cientista política da Unesp câmpus de Araraquara, acredita que a postura de Lula após a vitória pode sinalizar um novo momento democrático no país. “O discurso de conciliação e paz feito por Lula pode ser um bom sinal para minimizar a guerra e ódio que existe hoje na sociedade brasileira devido às disputas políticas. Além disso, o governo que se formou com uma ampla frente democrática deve fortalecer a democracia brasileira que sofreu inúmeros ataques nos últimos tempos”.

Entretanto, Kerbauy explica que os desafios são inúmeros. “Não vai ser uma gestão fácil. Ao contrário, o novo governo terá que lidar com pontos delicados como o crescimento econômico interno e externo, redução da desigualdade e vulnerabilidade social que existe no país, retomar programas sociais, trazer de volta a renda básica e o combate a fome”. “Por outro lado, os pronunciamentos dos presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira e do Senado, Rodrigo Pacheco, os quais legitimaram o resultado e se colocaram à disposição para dialogar e construir pontes, podem ajudar a minimizar os atritos e gerar maior interação entre os poderes”.

Em relação à política externa, a cientista política realça a boa repercussão que o resultado gerou internacionalmente. “Países importantes como EUA, Alemanha, França e vizinhos da América Latina reconheceram a vitória. Esses reflexos mostram o protagonismo do Brasil e que Lula deve dar início a uma nova fase de relações diplomáticas”.

Já sobre a continuidade do Bolsonarismo, a professora da Unesp acredita que a pequena vantagem entre os candidatos ainda deve deixar o Bolsonarismo com uma determinada força e influência na política, na sociedade e nas redes sociais, espaço onde eles sempre tiveram mais impacto.

Para ouvir a íntegra da entrevista clique no link abaixo.

Jornal da Unesp

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