Justiça Federal desmente Aras: investigação vazada por Bolsonaro é sigilosa

Informação corrobora conclusão da Polícia Federal; Aras havia opinado que documentação era pública e por isso pediu arquivamento da investigação contra o presidente

O jornal O Globo informou que pediu à 12ª Vara Federal do Distrito Federal cópia do processo propagado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). O pedido, porém, foi negado, sob o argumento de que a investigação é sigilosa.

“Informo a Vossa Senhoria que o Inquérito Policial 1065955-77.2020.4.01.3400 trata de investigação sigilosa e que, no momento, encontra-se tramitando entre a Polícia Federal e o Ministério Público”, respondeu a 12ª Vara Federal do DF.

A Polícia Federal e a PGR (Procuradoria-Geral da República) divergiram da condição de inquérito divulgado pelo chefe do Poder Executivo para levantar suspeitas, sem provas, sobre o sistema eleitoral.

A PF informou que o material não podia ser compartilhado, pois estava sob sigilo, e concluiu que Bolsonaro cometeu crime.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, a seu turno, alegou que a investigação era pública e pediu arquivamento da notícia-crime contra Bolsonaro.

ENTENDA O FATO

A investigação vazada pelo presidente da República apura as circunstâncias de ataque hacker ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e teve início após pedido do próprio TSE à PF.

Não há nenhuma relação com as urnas eletrônicas, mas Bolsonaro exibiu a documentação em ‘live’ em agosto do ano passado apresentando o inquérito como suposta evidência da vulnerabilidade das urnas, o que não é verdade.

Após Bolsonaro vazar a documentação, o TSE pediu à PF a abertura de inquérito sobre a divulgação do documento. A delegada Denisse Dias Ribeiro concluiu que o caráter tinha natureza sigilosa e apontou que Bolsonaro cometeu crime de violação de sigilo funcional.

CRONOLOGIA DOS FATOS

Em razão desse suposto crime, Bolsonaro foi intimado a prestar depoimento à PF, em 28 de janeiro, no âmbito do inquérito que apura o vazamento de documentos sigilosos.

O prazo de 28 de janeiro havia sido estabelecido anteriormente pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Alexandre de Moraes, relator do caso, e foi ratificado dia 27 de janeiro, após decisão que negou pedido da AGU (Advocacia-Geral da União) para Bolsonaro não dar a declaração.

Ainda no dia 27 do mês passado, a AGU apresentou agravo para que Bolsonaro não depusesse, recurso que não foi aceito por Moraes.

ATO CRIMINOSO

Dia 4 de agosto de 2021, Bolsonaro divulgou, em entrevista à Rádio Jovem Pan e em plataformas e redes sociais, documentos sobre suposta invasão a sistemas e bancos de dados do TSE.

Bolsonaro estava acompanhado, na transmissão, do deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), então relator da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) do chamado voto impresso. A proposta foi rejeitada na Câmara dos Deputados em agosto do ano passado.

Cinco dias depois, em 9 de agosto, os ministros do TSE enviaram notícia-crime ao STF pedindo a apuração do eventual crime cometido pelo delegado de PF, Victor Feitosa Neves Campos, e, na sequência, por Bolsonaro e Barros.

Os sete ministros do TSE assinam o documento — entre eles, o então presidente da Corte Eleitoral, Luís Roberto Barroso, e o próprio Alexandre de Moraes.

No pedido, os ministros afirmam que o vazamento de dados sigilosos é o crime tipificado no artigo 153, parágrafo 1º, do Código Penal, que preceitua que é crime “divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública”.

AVISO DE SIGILO

No texto da notícia-crime está escrito ainda que “os documentos encaminhados pelo TSE à Polícia Federal contêm tarja destacada em vermelho com o aviso de sigilo”, assim descartando a possibilidade de os envolvidos não terem conhecimento da restrição nos dados.

À época, o TSE esclareceu que o “ataque hacker” a que Bolsonaro se referia, o acesso aos sistemas do tribunal, não representou risco à integridade das eleições de 2018, já que, segundo o TSE, o código-fonte dos programas utilizados passa por sucessivas verificações e testes que fazem com que seja possível identificar qualquer alteração ou manipulação.

Moraes, no acolhimento da notícia-crime, dia 12 de agosto de 2021, pediu o afastamento do delegado Campos e a abertura de procedimento disciplinar para apurar os fatos na PF; oitiva com o delegado e com Barros; e a retirada dos documentos sigilosos do FacebookTwitterTelegramCloudfare e Bitly que foram postados em contas de Bolsonaro.

Dia 29 de novembro, Moraes determinou que Bolsonaro teria 15 dias para depor, podendo escolher hora, dia e local. O presidente solicitou mais 60 dias de prazo, e Moraes concedeu 45 — o prazo expirou dia 28 de janeiro. Um dia antes (27), no entanto, a AGU apresentou petição para que Bolsonaro não fosse interrogado. Moraes negou.

Inicialmente tramitando no inquérito das fake news (4781), essa investigação específica do suposto vazamento de documentos está atualmente num inquérito independente no Supremo (4878) — ambos de relatoria do ministro Alexandre de Moraes.

FAKE NEWS

Em agosto de 2021, o ministro Alexandre de Moraes havia acatado pedido do TSE para incluir Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news.

Moraes recebeu outra notícia-crime feita pelo TSE, em que acusa o presidente de ter espalhado informações falsas e ataques contra as instituições, em especial ao ministro Luís Roberto Barroso, então presidente do TSE, em ‘live’ dia 29 de julho de 2021.

O inquérito das fake news foi aberto em março de 2019, por decisão do ministro Dias Toffoli, então presidente do STF, com a intenção de investigar ameaças a ministros da Corte e notícias falsas sobre eles.

Ainda em agosto de 2021, Bolsonaro entrou com ação em que questionou a legalidade do inquérito. O STF começou a julgar a ação, mas, com o placar em 4 a 0 para negar o pedido de Bolsonaro, o ministro Nunes Marques pediu vista e o julgamento foi suspenso. Não há data para ser retomado.

M. V.

Hora do Povo

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