“Marco temporal não existe”, diz coordenador do Cimi Regional MT, Gilberto Vieira

Projeto foi aprovado na Câmara e está em discussão no Senado. Supremo pode votar recurso que questiona a tese defendida por ruralistas e empresários do agronegócio. Na Corte, a votação está 1 a 1

Segundo Gilberto Vieira, que coordenada o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) Regional Mato Grosso, o “marco temporal não existe”. Ele foi o entrevistado desta segunda-feira (5) no Contee Conta, que debateu os “desafios sobre a Amazônia, marco temporal, meio ambiente e sustentabilidade.

Vieira foi enfático: o agronegócio quer “emplacar a tese [do marco temporal], como se de fato existisse. Essa tese “vem sendo construída pelo setor” há muito tempo.

Para explicar, didaticamente o problema, ele citou dois artigos da Constituição de 1988, que embasam que a tese é furada e não para em pé: o 231 e 232.

“Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.”

“Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.”

Portanto, os povos originários são legítimos defensores dos direitos que advogam a tese contrária ao marco temporal.

O Contee Conta foi mediado pela jornalista da Confederação, Táscia Souza, com a coordenação da diretora da Secretaria de Relações Internacionais, Cristina Castro.

Inconstitucional

O PL 490/07, aprovado pela Câmara dos Deputados na semana passada, está agora em discussão no Senado Federal, Casa revisora. E o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) disse que não vai haver urgência para o projeto. Disse também que a matéria vai ser examinada com “cautela e debate”.

O senador Omar Aziz (PSD-AM), a propósito, crê que o projeto “não vai passar no Senado”. Ele concedeu entrevista sobre o tema ao portal UOL, na semana passada.

Vieira lembrou, na entrevista, que o “PL 490 é inconstitucional”, pois não é possível alterar a Constituição por meio de projeto de lei. O instrumento legislativo para mudar a Carta Política é a PEC (proposta de emenda à Constituição).

Outro aspecto que Vieira lembrou é que “não há jurisprudência” para a tese do marco temporal. Trata-se, segundo o representante do Cimi, de “tentativa de trazer para a sociedade distorção sobre a realidade”, a partir dos interesses econômicos do agronegócio.

Eis o pano de fundo

O marco temporal propõe que apenas os indígenas que ocupavam ou reivindicavam terras até o dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição brasileira, têm direito a morar em terras demarcadas.

O PL (Projeto de Lei) 490/07 foi aprovado na Câmara dos Deputados, na noite do dia 30 de maio, por 283 votos a favor e 155 votos contrários.

Embora façam parte da base aliada do governo, PSD, MDB e União votaram a favor da proposta na Câmara. O posicionamento foi seguido por partidos de oposição e do Centrão. Os partidos PT, PSol, PDT, PSB, PCdoB e PV votaram contra.

Discussão no Supremo

O STF (Supremo Tribunal Federal) pode retomar, nesta quarta-feira (7), o julgamento do RE (Recurso Extraordinário) 1017365, que discute se a data da promulgação da Constituição Federal deve ser adotada como marco temporal.

O julgamento no STF já foi iniciado, mas foi suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes em setembro de 2021.

O placar está em 1 a 1. O relator, ministro Edson Fachin, votou contra o marco temporal (a favor da tese dos indígenas) e Nunes Marques a favor (contra os povos originários).

Assista a íntegra da conversa:

Marcos Verlaine

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