O embrutecimento de uma nação: um projeto

‘Só assim o projeto de Bolsonaro se torna factível; só emburrecendo e — mais! — embrutecendo a nação’

Por João Batista da Silveira*

Foi em Eldorado, no interior paulista, no último dia 20 de junho, que ficou claro qual é o projeto educacional do presidente Jair Bolsonaro para o país. Até então, fazíamos análises, conjecturas e prognósticos. O fato de o ministro da Economia, Paulo Guedes, ser irmão de Elizabeth Guedes, dirigente de uma das principais entidades representativas das empresas de educação privada, dava-nos, por exemplo, indícios de como o setor privatista seria beneficiado em detrimento do ensino público gratuito e de qualidade socialmente referenciada.
Os anunciados cortes de investimentos e a tentativa de desmoralizar a universidade pública corroboraram para que chegássemos a essa compreensão, assim como a declaração do ministro Abraham Weintraub no início de junho ao defender o setor privado como principal agente na expansão do ensino superior, algo que fez disparar na bolsa de valores as ações de empresas como Kroton e Estácio.

Em outra ponta, foi fácil antevermos que a perseguição ideológica nas instituições de ensino recrudesceria. Tanto a nomeação de Ricardo Vélez Rodríguez como titular do MEC quanto sua substituição por Weintraub indicaram que a censura, o revisionismo histórico, os delírios de combate a um suposto marxismo cultural e a uma imaginária ideologia de gênero seriam as marcas de um ministério marcado pelo despreparo e pela tentativa de eliminação do pensamento crítico. Mas por quê?

Foi a resposta a essa pergunta que Bolsonaro revelou no dia 20 de junho, no município de Eldorado, ao oferecer seu “muito obrigado a quem votou e quem não votou” nele e afirmar que “lá na frente, todos votarão, tenho certeza”. Para que isso seja possível, de fato, a educação crítica e a capacidade de reflexão são obstáculos que precisam ser eliminados. Para que todos — vejam bem, ele disse todos — os eleitores brasileiros votem a favor de uma eventual reeleição sua (algo que ele tinha demagogicamente descartado durante a campanha, no ano passado), é preciso tirar de uma sociedade inteira a percepção do quanto a reforma da Previdência é danosa e arranca direitos dos trabalhadores e daqueles que, ao saírem da escola, ainda o serão; é necessário roubar de toda uma população a compreensão do quanto a Justiça brasileira deixou, em muitos casos, de fazer jus a essa maiúscula para se tornar um conluio que se coloca a favor de interesses financeiros; é imprescindível anular em um país inteiro, de norte a sul, o entendimento sobre a importância da pesquisa e da ciência para seu desenvolvimento sustentável e soberano; é urgente usurpar de todo um povo o processo cognitivo que o dota da faculdade de ler e interpretar os fatos, incluindo os que dizem respeito à conspiração e prevaricação praticadas pelo ministro Sérgio Moro, ao tráfico de cocaína no avião presidencial, ao desaparecimento do motorista Fabrício Queiroz, às relações escusas do presidente e seus filhos com a milícia. Só assim o projeto de Bolsonaro se torna factível; só emburrecendo e — mais! — embrutecendo a nação. O projeto de poder Bolsonaro só se sustenta na ignorância.

João Batista da Silveira é Secretário de ensino, advogado, professor de História e membro das diretorias executivas da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), da Federação Sindical dos Auxiliares de Administração Escolar no Estado de Minas Gerais (Fesaaemg) e do Sindicado dos Auxiliares de Administração Escolar de Minas Gerais (Saaemg)

Da Carta Capital

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