Pandemia aumenta riscos à saúde mental de professores

Dados da Plataforma de Apoio Psicológico para Profissionais da Educação mostram que, entre os 269 atendimentos prestados em 17 estados brasileiros, 90% foram de mulheres. Em sua maioria, negras, educadoras no ensino fundamental e moradoras de regiões periféricas

São Paulo – A pandemia do novo coronavírus ampliou os desafios para todos os profissionais da educação. Mas as novas dinâmicas de trabalho sobrecarregaram e prejudicaram ainda mais a saúde mental das professoras negras, moradoras de regiões periféricas e que lecionam no ensino fundamental. É o que apontam dados preliminares da Rede de Educadores em Luta divulgados nesta semana em que se celebra o Dia dos Professores.

O coletivo é responsável pela Plataforma de Apoio Psicológico para Profissionais da Educação, criada em meio à crise sanitária e econômica. Com o intuito de dialogar com a categoria e entender como os professores e professoras estavam passando por esse momento, a rede construiu esse canal que conecta os docentes a psicólogos e psicólogas voluntárias.

Um primeiro balanço da plataforma, contudo, mostrou que, entre os 269 atendimentos prestados inicialmente em 17 estados brasileiros, 90% deles foram de mulheres. Em sua maioria negras, educadoras no ensino fundamental e moradoras de regiões periféricas. Os dados também indicam que a cidade de São Paulo concentrou 70% de toda a demanda.

Fatores comuns

Integrante do coletivo e um dos responsáveis pela plataforma, o professor e sociólogo Gabriel Teixeira revela ainda que, entre a base de dados, não só o perfil, mas as histórias das profissionais de educação também se repetem.

“É a professora que no meio da pandemia se viu com uma diminuição significativa de renda, que tem de conciliar, além da segunda e terceira jornada de trabalho, trabalhar dentro de casa, cuidar do filho que está sem creche, preparar a comida, limpar a casa e fazer compras. Como mediadores, as informações que nos chegam dão conta de mostrar que o perfil de adoecimento psíquico não está diretamente relacionado com a covid-19, mas com outras dinâmicas que se acirram por conta do isolamento social”, comenta o professor em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual.

E inúmeros

Durante a pandemia, os educadores passaram a lidar com reduções salariais, ameaças de desemprego, o aumento da jornada de trabalho e ainda com a possibilidade de retorno às aulas presenciais mesmo em meio à pandemia.

A mulher que é professora, de acordo com Teixeira, também não escapou da violência de gênero, agravada por conta do confinamento. Como a convivência com algum parente alcoólatra, ou com a própria violência doméstica, reforçando os fatores que abalam a saúde mental são inúmeros.

“Sem contar que, de uma hora para outra tivemos que traduzir aquela aula voltada a contextos presenciais para modalidades remotas. Muitas vezes quem está do outro lado vê aquele vídeo de 20, 30 minutos e acha que foi uma coisa simples de fazer. Mas o professor ficou três horas para conduzir algo sucinto, que não seja enfadonho para os seus estudantes. A gente demora um tempo para produzir isso, o que se traduz em sobrecarga de trabalho”, acrescenta o professor e sociólogo.

O papel do Estado

A dimensão dos impactos da pandemia na saúde mental dos professores brasileiros, no entanto, pode ser ainda maior. Logo após as primeiras cinco horas de divulgação da plataforma, os cadastramentos tiveram de ser cancelados porque o número de trabalhadores inscritos já estava ultrapassando o total de psicólogos voluntários. Ao todo, 352 educadores se inscreveram pelo país.

O objetivo da Rede de Educadores em Luta é viabilizar novos atendimentos. Mas também a médio prazo “travar uma discussão para mostrar que isso não pode ficar nas mãos de grupos com boa vontade”, observa Teixeira.

“Isso tem que ser uma política de Estado. Os equipamentos de saúde pública, sobretudo de saúde mental, têm que ser fortalecidos. Essas pessoas têm que contar com o SUS para acessar serviços como este. A plataforma é um serviço imediato, a gente gostaria que isso fosse algo público, de qualidade, disponível para todos os brasileiros e brasileiras”, destaca o professor e sociólogo.

Brasil de Fato

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