Quatro anos sem Marielle, sem respostas e sem justiça

Nesses 1.461 dias sem respostas, que a espera de hoje também não seja para sempre. As manifestações em homenagem à vereadora assassinada seguem em várias partes do Brasil

Quatro anos. São 1.461 dias sem resposta à duas perguntas diretas e objetivas. E essas permanecem sem respostas até o momento. Quem mandou matar Marielle? E por quê?

No Twitter, a jornalista, escritora e documentarista Eliane Brum, que faz a contagem e os questionamentos diariamente, acrescentou a esses hoje, em caixa alta: “QUATRO ANOS DE IMPUNIDADE. QUATRO ANOS SEM JUSTIÇA. QUATRO ANOS DE VERGONHA. QUATRO ANOS DE DOR. QUATRO ANOS SEM MARIELLE E ANDERSON. A CADA DIA A MAIS SEM SABER QUEM MANDOU MATAR MARIELLE O BRASIL SE APEQUENA — E NÓS COM ELE”.

No site do Instituto Marielle Franco, fundado após a execução, no centro do Rio de Janeiro, da vereadora do PSol e o motorista dela, Anderson Gomes, dia 14 de março de 2018, ela é apresentada como “mulher, negra, mãe, filha, irmã, esposa e cria da favela da Maré”. O próprio instituto foi criado pela família dela, como destacado no site, “com a missão de inspirar, conectar e potencializar milhares de jovens, negras, LGBTQIA+ e periféricas a seguirem movendo as estruturas da sociedade”.

Porque, sim, tal como Marielle, mulheres são mortas de forma violenta diariamente, mulheres negras ainda mais. Assim como, por motivos distintos, pessoas LGBTQIA+ e moradoras da periferia.

Conotação e relevo

Reunindo todos os perfis num único, é claro que a morte de Marielle ganhou conotação e relevo para todos esses grupos, e não é por acaso que nome dela foi destacado em cada ato do 8 de março, Dia Internacional da Mulher, e também desta segunda-feira (14).

Em Brasília, a manifestação desta segunda-feira foi realizada na Praça Marielle Franco e a Contee esteve presente. “São quatro anos de incerteza, quatro anos de angústia, quatro anos que a gente pergunta quem mandou matar Marielle Franco?”, declarou o estudante Lucas Souza, de 16 anos, que destacou a luta das mulheres periféricas negras e a importância de os homens se aliarem à essa pauta.

“Marielle, uma vereadora negra, que lutava contras as chamas obscuras do patriarcalismo, do obscurantismo, do negacionismo, e que foi brutalmente assassinada. Nossa luta precisa ser diária e constante para representar Marielle, porque eles pensam que conseguiram calar a voz de Marielle matando ela, mas não conseguiram. Desde que Marielle morreu, nós nos tornamos outras Marielles.”

Danielle Sanchez, do mandato do deputado distrital Fábio Felix (PSol), ressaltou que “a gente vive no País um momento de extrema violência de gênero dentro da política. E a gente sabe que o o assassinato de Marielle teve também o objetivo de silenciar mulheres negras que conseguem ascender politicamente, que conseguem construir e discutir política pública”.

Segundo ela, “diante de tanta violência, saber quem mandou matar Marielle significa dizer para o Estado brasileiro que mulheres negras não vão se silenciar”.

Mas por quê?

Ser mulher negra periférica e LGBTQIA+ faz vítimas no Brasil. Mulheres negras periféricas têm as vozes caladas todos os dias. Mas isso, porém, responde de fato às perguntas: quem mandou matar Marielle? E por que ela, especificamente?

Na série de atos que está sendo realizada nesta segunda-feira, não apenas em Brasília e no Rio de Janeiro, mas também em outras cidades do País, o intuito é marcar a data e cobrar das autoridades agilidade e transparência nas investigações.

Nesta manhã, os advogados das famílias da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes protocolaram mandado de segurança no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro para que as informações dos autos sobre os mandantes do assassinato sejam compartilhadas.

Até agora o que se sabe continua sendo o descoberto três anos atrás, quando o policial reformado Ronnie Lessa — vizinho de Bolsonaro e contrabandista de armas —  foi preso como provável assassino de Marielle, assim como o ex-PM Élcio Vieira de Queiroz.

Na mesma época, foram descobertas as ligações do vereador Carlos Bolsonaro com o “Escritório do Crime” (com o qual Lessa e Queiroz também tinham relação), empregando parentes de Adriano da Nóbrega, o chefe do Escritório. Antes disso, ainda em 2018, como lembra o jornalista Luis Nassif no Jornal GGN, o general Braga Netto, então interventor federal da Segurança do Rio de Janeiro, declarou que a solução do caso estava próxima. “Depois se cala e se torna o superpoderoso ministro de Bolsonaro. Não há nada de estranho nisso?”, questiona Nassif.

Marielle foi uma mulher negra e homossexual assassinada. Mais uma. Mas também — e neste caso não engrossa estatísticas, mas expõe uma particularidade — foi uma ameaça. Uma liderança política jovem e de força crescente; uma opositora de um dos Bolsonaros na Câmara Municipal; uma possível forte adversária de outro deles na disputa por cadeira no Senado; uma voz que denunciava a atuação da milícia e que poderia chegar (se é que não havia chegado) à ligação dos milicianos com a família do futuro presidente da República.

Nos atos desta segunda, a palavra de ordem é: “Marielle semente, hoje e sempre”. Quem lembra a memória dela clama por respostas e justiça. Que a espera de hoje também não seja para sempre.

Táscia Souza, com colaboração e entrevistas de Fred Vázquez

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