Sinpro/RS: Poliomielite pode causar surtos no Brasil

Meio milhão de crianças não receberam a vacina contra a poliomielite no país. Fake news, acomodação e cultura antivacina estão entre as causas

A poliomielite ainda ameaça meio milhão de crianças brasileiras ainda não vacinadas, o que pode causar novos surtos. Em 2020, o Brasil voltou à lista dos oito países da América Latina (Bolívia, Brasil, Equador, Guatemala, República Dominicana, Suriname e Venezuela) com alto risco da volta da doença.

Um dos responsáveis pela erradicação da poliomielite no país, o pesquisador Akira Homma, registra que o Brasil hoje se encontra com um dos índices mais baixos de sua história na imunização contra a pólio vírus, em média 68% nos últimos quatro anos.

Em 2021 a cobertura foi de 59,19%. Muito abaixo do ideal que é 95%.

“Hoje, no país, temos 500 mil crianças que não foram vacinadas”, fala. O último caso de poliomielite vírus selvagem foi registrado no Brasil em 1989, na cidade de Sousa, Paraíba.

Bio-Manguinhos

Homma foi fundador e diretor por muitos anos do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), que é a unidade da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) responsável por pesquisa, inovação, desenvolvimento tecnológico e pela produção de vacinas, kits para diagnóstico e biofármacos voltados para atender prioritariamente às demandas da saúde pública nacional.

Ali fica o complexo Tecnológico de Vacinas (CTV) do Instituto, um dos maiores centros de produção da América Latina, instalado no campus da Fiocruz, garante a autossuficiência em vacinas essenciais para o calendário básico de imunização do Ministério da Saúde (MS).

Atualmente, ele atua como assessor científico sênior da Bio-Manguinhos.

Poliomielite pode seguir tendência do sarampo

“O sarampo já voltou e está presente em praticamente todas as regiões do país. A eliminação que aconteceu em 2018 voltou pelo Norte, com a migração de venezuelanos infectados e se espalhou pelo país porque havia muitos suscetíveis, não protegidos”, registra.

Para o pesquisador o exemplo é reflexo do fato de que todas as coberturas vacinais estão caindo há cinco ou seis anos de forma gradativa, apesar de ter se acentuado nos anos da pandemia.

E o Brasil não é um caso isolado. Em 2019, a Organização Mundial de Saúde (OMS) apontou as baixas coberturas vacinais como um dos dez principais problemas de saúde pública do mundo.

Motivos

Basicamente, para Homma, dois são os motivos para essa queda. O primeiro, paradoxalmente, é o sucesso das vacinas.

“As pessoas, não vendo casos como de vítimas de poliomielite, fruto da própria vacinação, se sentem seguras e acabam achando que não é necessário”, diz.

O exemplo maior, cita o pesquisador, é o caso da covid-19. “Vendo a situação – os doentes – a população foi atrás da vacinação”.

O segundo caso é a intensa campanha de fake news que circula mundo afora e que acaba levando temor.

“No Brasil, tivemos até uma autoridade dizendo que podia se virar jacaré, não é?”, lembra.

A alternativa, na opinião do pesquisador, é melhorar a comunicação.

“Tem que se convocar a população, tornar mais transparente a necessidade da vacinação”, fala.

Discurso criminoso

Homma deixa claro que a vacinação é extremamente necessária. “Se a doença estivesse erradicada completamente no mundo inteiro, não precisaria.

Mas, enquanto houver países com pólio, é preciso continuar vacinando as crianças justamente para evitar a entrada do vírus selvagem, sobretudo com um alto número de suscetíveis”.

A lógica para o pesquisador é simples. Qualquer pessoa que entrar infectada no país, pode ocasionar um surto que “vai deixar sequelas, quando não até mortes”.

Sarampo voltou, pólio também pode

O exemplo mais imediato e claro é o do Sarampo, lembra. Homma registra ainda a proximidade do Brasil com países onde a pólio está na categoria de “muito alto risco”, segundo a Opas: “O Haiti, no Caribe, e a Bolívia, nossa vizinha”.

Sobre o discurso da liberdade individual, constantemente usado para que a vacinação seja algo opcional, Homma afirma que a liberdade, no caso de saúde pública, é cerceada pelo interesse coletivo.

“Quando você se torna uma ameaça a coletividade, termina a sua liberdade. Ninguém está sozinho no mundo. Você contamina a sua família, que vai contaminar toda a sua vila, que vai contaminar toda a cidade e por aí vai, contamina todo o país. Não pode ter esse ‘direito’. Isso não é direito. Isso é crime!”, conclui indignado.

Do jornal Extra Classe, do Sinpro/RS

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