Eleições são primeira prova de fogo do PNE
Por Daniel Cara*
O momento de comemoração já passou. Agora é preciso tirar o PNE do papel, transformando-o em realidade. Para isso, cinco fatores precisam ser observados. E as eleições de 2014 são um momento-chave para a implementação do plano.
Demorou 1288 dias para o Brasil ter um novo PNE (Plano Nacional de Educação). O processo de construção da Lei 13.005/2014 foi longo e conflituoso. Como registrado por diversos veículos de comunicação, se não fosse a interlocução entre a sociedade civil e a Câmara dos Deputados, hoje o Brasil não contaria com um PNE do tamanho de suas necessidades.
Diante de sua envergadura, o plano não nasceu como deveria. A comunidade educacional esperava uma cerimônia de sanção envolvendo a presidente, governadores, prefeitos, ministros, secretários e conselheiros de educação, professores, parlamentares de todos os partidos e representantes da sociedade civil. O objetivo era firmar um pacto sólido em torno dos desafios estabelecidos pelo PNE. Mas a cerimônia, que chegou a ser marcada para a manhã do dia 25 de junho de 2014, acabou sendo cancelada.
Graças a uma inesperada e extenuante negociação, o PNE foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff sem vetos, mas sem rito. E para sair do papel cinco fatores precisam ser observados, sendo as eleições de 2014 o momento-chave para o sucesso do plano.
Os cinco fatores
Em primeiro lugar, o fator imediato: o PNE deve ser o tema central das eleições de 2014. Essa será a primeira prova de fogo do plano. Tanto os candidatos à Presidência da República como os candidatos aos governos dos Estados e do Distrito Federal devem dizer como pretendem viabilizar o plano naquilo que se refere ao período dos seus mandatos. Diante das eleições, na prática, 2015 será o primeiro ano de vigência do PNE. E o próximo governo será a organizar os meios para o cumprimento do PNE, em uma espécie de maratona de revezamento.
Em segundo lugar, o sucesso do PNE depende essencialmente de sua valorização social. A opinião pública, a sociedade civil e os cidadãos em geral devem exigir dos governos (federal, estaduais, distrital e municipais) a busca incansável pelo cumprimento de cada uma das metas do plano.
Os governantes, normalmente, não gostam de documentos legais como o PNE. Avaliam que eles engessam a gestão e coíbem as estratégias de marketing político. Esse suposto defeito é, na verdade, sua maior qualidade: o PNE busca superar a corriqueira descontinuidade entre as gestões em favor da promoção do direito à educação.
Em terceiro lugar, em um regime democrático, a boa gestão exige a interação entre a sociedade civil e os governos. Um claro exemplo do que não pode ocorrer foi o cancelamento arbitrário e unilateral da Conferência Nacional de Educação de 2014 por parte do MEC. O PNE seria debatido no evento, dias antes de sua votação final na Câmara dos Deputados.
Certamente o texto sairia fortalecido. Saiu enfraquecido e com uma desagradável novidade: o Governo Federal e os empresários da educação conseguiram incluir os gastos com parcerias público-privadas na meta de investimento público em educação pública, instituindo uma nova forma de contabilidade criativa. Apenas PCdoB, PDT, PSB e PSOL votaram em favor do princípio da aplicação exclusiva do recurso público para a educação pública.
Em quarto lugar, é imprescindível elaborar e aprovar os planos estaduais e municipais de educação, sempre em consonância com as metas do PNE. Esses planos devem ser formalizados em leis específicas e são importantes, especialmente, no caso da educação básica. Isso ocorre porque a educação infantil é de responsabilidade prioritária dos municípios, cabendo aos Estados a oferta do ensino médio. Já o ensino fundamental é uma prioridade compartilhada por ambos.
Pela primeira vez graças à formulação e pressão da sociedade civil, em especial da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, o PNE estabeleceu que o Governo Federal terá que colaborar decisivamente com a educação básica, transferindo recursos para Estados e municípios que não atingirem os valores do Custo Aluno-Qualidade Inicial.
Em quinto lugar, as leis orçamentárias anuais e os próximos planos pluri anuais (PPAs) – tanto do Governo Federal, como de Estados, Distrito Federal e municípios – devem trazer o PNE como um dos seus temas centrais, determinando fontes para sua viabilização financeira. Se isso não ocorrer, dificilmente o novo plano educacional sairá do papel, pois faltarão recursos e estratégias de dispêndio.
Em suma, o momento de comemorar a aprovação do PNE já passou. Agora é a hora de tirá-lo do papel e mudar a realidade da educação pública brasileira. Vai exigir sacrifício, mas chegou a hora do país colocar as políticas públicas educacionais no centro de suas prioridades. Há 20 anos fez isso com a economia, quando foi lançado o Plano Real. Agora é a vez da educação.
*Daniel Cara é coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, bacharel em ciências sociais e mestre em ciência política pela USP
Do UOL Educação