IES na Bolsa de Valores colocam a educação superior em risco
A lucratividade e o “ótimo desempenho” das ações das Instituições de Ensino Superior (IES) na Bolsa de Valores são exaltados diariamente na mídia. A atratividade de novos investidores, as políticas de benefícios fiscais oferecidas pelo Governo Federal e a margem de lucro exorbitante prometem caminhos de crescimento o valor das ações IES de capital aberto.
Com empresários satisfeitos e confiantes, as notícias só parecem ruins para quem se preocupa com o desenvolvimento do País e com a soberania nacional. Neste sentido, o Brasil parece afastar-se a cada dia da perspectiva de oferta de uma educação superior de qualidade, democrática, pública e gratuita. Os profissionais da educação privada estão entre as principais vítimas do aprofundamento do processo de mercantilização da educação – ocasionado pela financeirização do setor.
As medidas regulatórias propostas pelo Governo ainda estão muito distantes do mínimo necessário para garantir qualidade de ensino e formação dos jovens, bem como valorização profissional dos professores e trabalhadores técnicos e administrativos dos estabelecimentos de ensino brasileiros.
Na última segunda-feira, dia 24/09, foram divulgados no jornal paulista Folha de São Paulo novos dados sobre o crescimento das ações das IES que operam na Bovespa – atingindo alta de até 90%. Segundo a publicação, “no ano em que o Ibovespa acumula ganho de apenas 8%, o setor de educação se destaca. As ações das três empresas ligadas principalmente ao ensino superior listadas na Bolsa dispararam em 2012. Os papéis da Kroton (KROT11), a maior alta, subiram 90,9% no ano. Em seguida vem a Estácio (ESTC3), com valorização de 84,7% e, depois, a Anhanguera (AEDU3), com 62,1%”.
Entretanto, analistas entrevistados pelo jornal destacam o risco associado aos que desejam investir nesses papéis. De acordo com especialistas entrevistados pela Folha, “o perfil mais adequado é o investidor que tem mais apetite para o risco, já que as ações têm pouca liquidez e tendem a sofrer mais em momentos de crise”. Para Thiago Macruz, analista do Itaú BBA, “historicamente, tem sido um setor mais arriscado, com volatilidade operacional. Em 2012, talvez estejamos iniciando um caminho diferente, mas não vejo ainda como defensivo. Mesmo com o Fies, que pode torná-lo menos cíclico, ainda é um setor cíclico, dependente da atividade econômica”.
A situação, tantas vezes repudiada pela Contee, preocupa. Tal cenário, demonstra que a educação superior brasileira, atualmente concentrada no ensino privado, com cerca de 75% do total de matrículas, apresenta-se como setor vulnerável, de atratividade especulativa, sem compromisso com a formação dos jovens ou com o desenvolvimento do País.
Para a Coordenadora Geral da Contee, Madalena Guasco Peixoto, a partir da entrada dessas Instituições de Ensino na Bolsa de Valores a educação superior passou a correr riscos. “A situação é muito preocupante, pois se os investidores especulativos acharem que essas ações não são mais lucrativas, eles, simplesmente, vão embora”.
Os empresários apostam nas garantias de financiamento estudantil e nos incentivos fiscais do Governo, combinados com a crescente demanda de acesso à graduação, para sustentar as perspectivas positivas para o setor. O grande nicho em que essas IES pretendem avançar é o da educação à distância, vista por elas como “galinha dos ovos de ouro”. Sem compromisso ou preocupação com a qualidade do ensino, apostam no baixo custo operacional da EAD.
Em artigo publicado na mesma Folha, o professor associado do Uerj/PPFH (Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana), Zacarias Gama, afirma que “É o governo brasileiro o grande avalista desse negócio da China. Suas transferências de recursos públicos para as IES privadas, os recursos do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) e do ProUni (Programa Universidade para Todos) garantem a rentabilidade desse mercado educacional que já se coloca entre os dez maiores do mundo”.
Para ele, “salvo as honrosas exceções, a grande maioria de IES produz um autêntico derrame de diplomas sem valor agregado. Inúmeros são os seus diplomados nas filas de empregos ou nas atividades econômicas informais”.
Para Gama, é preciso questionar “Qual o papel estratégico que tais IES ocupam no novo projeto de sociedade que vem se desenhando nos últimos anos? Estão comprometidas com a produção de conhecimento com valor agregado para sustentar o nosso atual e futuro desenvolvimento? Que tipo de cidadãos e quadros estão formando para as nossas Forças Armadas, Legislativo, Judiciário, indústria e comércio? Que inovações, ciência, tecnologia, compreensões de sociedade e cultura desenvolvem?
Questões fundamentais a serem debatidas e solucionadas a partir da implementação de políticas públicas de Estado, efetivas e qualificadas.
Da redação