SinproSP: Terceirização no Supremo
O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou para a próxima quarta-feira (22) o julgamento de dois processos que tratam de terceirização.
Uma das ações (ADPF 324) foi proposta em 2014 pela Associação Brasileira do Agronegócio (ABRAG) e questiona a constitucionalidade da Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho. A segunda foi apresentada, em 2013, ao STF pela Celulose Nipo-Brasileira S/A (Cenibra) em 2013 e tornou-se a um símbolo da pressão de empresas para “legalizar” a terceirização a qualquer custo, como se verá adiante. Trata-se do Recurso Extraordinário 95825, que tem repercussão geral, ou seja, as decisões que vierem a ser tomadas se estenderão para as ações idênticas que transitam em instâncias inferiores.
Os dois processos são anteriores a 2017, ano em que foram promulgadas leis (13.429 e 13.467) que autorizaram a terceirização em qualquer atividade. As ações referem-se, portanto, a contratações, que, àquela época eram irregulares. Se o Supremo manifestar-se favoravelmente, estará abrindo um precedente em favor de empresas que decidiram contratar à margem da lei. Em bom português, essas empresas podem ser beneficiadas por uma espécie de anistia.
O que está em julgamento
Até 2017, a legislação só autorizava a contratação terceirizada para substituição temporária de até 90 dias (L. 6019) ou para serviços de vigilância e transporte de valores (L. 7102). A Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho passou a admitir a contratação terceirizada também em serviços de limpeza e conservação e nas “atividades meio”, aquelas que não são a função principal da empresa.
O que não se enquadrava nessas possibilidades era considerada contratação ilegal, o que permitia ao trabalhador reclamar o vínculo empregatício na Justiça.
A ação da ABRAG pede que o Supremo declare a Súmula 331 inconstitucional, por impedir a “liberdade de contratação de serviços” (1). Para a entidade patronal, o agronegócio não contrata pessoas, mas serviços. Não precisa, portanto, se sujeitar à CLT. O relator da ação é o ministro Luís Roberto Barroso.
A ação da empresa de celulose, a Cenibra, também questiona a Súmula 331 e a competência do Tribunal Superior do Trabalho para discutir a ação, numa tentativa de se livrar das inúmeras ações que tramitam contra ela.O processo, contudo, ganhou destaque pelo caminho que percorreu no STF e o interesse que provocou nos mais diferentes setores da economia. É o que se verá a seguir.
A ação da Cenibra
A Companhia Nipo-Brasileira de Celulose (Cenibra) foi alvo de uma ação civil pública movido pelo Ministério Púbico do Trabalho (MPT) e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas de Guanhães (MG), por terceirização irregular. Em meados dos anos 90, a Cenibra demitiu trabalhadores e passou a recontratá-los por meio de “empresas prestadoras de serviços”.
Na Justiça, alegou que atividades de plantio, corte e manejo de árvores não eram a atividade principal de um empresa de celulose e por isso, poderiam ser terceirizadas. O MPT conseguiu provar que o reflorestamento faz parte da cadeia de produção do papel e que a Cenibra mantinha controle sobre as empresas prestadores de serviços e, consequentemente, sobre os trabalhadores. Em suma, a terceirização era simplesmente uma burla à legislação trabalhista.
A empresa foi condenada em todas as instâncias, inclusive no Tribunal Regional do Trabalho, e não havia mais possibilidade de recurso. Contudo, numa manobra jurídica, a Cenibra recorreu ao STF, em 2013, questionando a constitucionalidade da Súmula 331 e a competência do TST para deliberar sobre essa questão. Para a empresa, a lacuna na lei só poderia ser suprida pelo poder legislativo.
Num primeiro momento, o recurso foi negado por decisão do ministro Luiz Fux, depois reafirmado pela 1ª Turma do STF. Surpreendentemente, um ano depois (2014), o mesmo Fux mudou de ideia. Aceitou os embargos feitos pelos advogados da empresa, deu andamento à ação e propôs que ela tivesse repercussão geral. Ou seja, o que viesse a ser julgado, valeria para ações em instâncias inferiores.
Em 2016, Fux ‘congelou’ todas as ações contra a Cenibra até que o STF julgasse o recurso extraordinário. Na época, o processo foi visto por muitas entidades patronais como uma possibilidade de “legalizar” esse modelo de contratação, já que os projetos de lei no Congresso não avançavam.
O julgamento, marcado para novembro de 2016, acabou não acontecendo e será retomado agora. É certo que neste tempo, o Congresso tratou de golpear os trabalhadores, liberando a terceirização sem limite, abrindo possibilidade até mesmo para a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ), sem vínculo de emprego.
Nada disso, contudo, tira a importância do julgamento, cujo resultado pode até mesmo piorar o que já existe.