O esquartejamento do Ministério do Trabalho

A diluição das competências do Ministério do Trabalho entre várias pastas e secretarias resultará numa grave perda de relevância dos temas da área no contexto governamental, agravando, pelo déficit de coordenação, problemas como falta de recursos, coerência e efetividade.

Antônio Augusto de Queiroz*

O Ministério do Trabalho foi extinto e suas competências e atribuições foram distribuídas em quatro outros ministérios (Economia, Justiça e Segurança, Cidadania e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) com dupla finalidade. De um lado, facilitar a implementação da reforma trabalhista, inclusive em sua dimensão sindical. De outro, esvaziar o poder da fiscalização, tanto na exigência de cumprimento da legislação e das normas coletivas, quanto na elaboração e implementação das Orientações Normativas em matéria de segurança e medicina do trabalho.

O Ministério da Economia terá competência, além dos temas previdenciários, sobre os seguintes assuntos relacionados ao trabalho: I – política e diretrizes para a modernização das relações do trabalho; II – fiscalização do trabalho, inclusive do trabalho portuário, e aplicação das sanções previstas em normas legais ou coletivas; III – política salarial; IV – política e diretrizes para a geração de emprego e renda e de apoio ao trabalhador; V – formação e desenvolvimento profissional; VI – segurança e saúde no trabalho; e VII – regulação profissional.

Todos esses temas, cuja palavra final caberá ao ministro Paulo Guedes, estão distribuídos em várias instâncias institucionais do Ministério da Economia, que incluem três secretarias especiais, cujos titulares exercem cargo de natureza especial, uma secretaria do Trabalho, duas subsecretarias, um conselho e uma fundação, observando essa ordem hierárquica para a tomada de decisão.

O homem forte do governo Bolsonaro no mundo do trabalho será o economista e relator da reforma trabalhista na Câmara dos Deputados, o ex-deputado Rogerio Marinho (PSDB/RN). Nomeado como titular da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, terá competência: I – dirigir, superintender e coordenar as atividades das secretarias e demais unidades que integram a respectiva estrutura e orientar-lhe a atuação; II – expedir os atos normativos relacionados ao exercício de suas competências; III – supervisionar as seguintes matérias de competência do Ministério: a) previdência e legislação do trabalho; b) fiscalização e inspeção do trabalho, inclusive do trabalho portuário, e aplicação das sanções previstas em normas legais ou coletivas; c) relações do trabalho; d) política salarial; e) formação e desenvolvimento profissional; e f) segurança e saúde no trabalho; IV – assistir o Ministro de Estado na supervisão e na coordenação das atividades de órgãos colegiados e entidades vinculadas à sua área de atuação, conforme ato próprio do Ministro de Estado; V – acompanhar o cumprimento, em âmbito nacional, dos acordos e das convenções ratificados pelo Governo brasileiro junto a organismos internacionais, em especial à OIT, nos assuntos de sua área de competência? VI – supervisionar as Superintendências Regionais do Trabalho, em articulação com as demais Secretarias Especiais que utilizem a estrutura descentralizada das Superintendências; VII – editar as normas de que trata o art. 200 do Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 – CLT; VIII – acompanhar o cumprimento, em âmbito nacional, dos acordos e das convenções ratificados pelo Governo brasileiro junto a organismos internacionais, em especial à OIT, nos assuntos de sua área de competência? e IX – elaborar proposições legislativas sobre matéria previdenciária, trabalhista ou correlata.

Subordinada à Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, dirigida pelo ex-deputado Rogério Marinho, foi criada uma Secretária de Trabalho, que terá duas subsecretarias a ela vinculadas: a Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, onde estão lotados os auditores-fiscais do Trabalho, e a Subsecretaria de Políticas Públicas e Relações de Trabalho.

Na Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, cujo titular é o economista Carlos Alexandre Da Costa, haverá a Secretaria de Políticas Públicas para o Emprego, com as competências relativas a política e diretrizes de trabalho, emprego, renda, salário e de empregabilidade, formação e desenvolvimento profissional. Essas competências envolvem temas como formular e propor políticas públicas de trabalho, emprego, renda, salário e de empregabilidade, como qualificação profissional, aprendizagem e estágio, seguro-desemprego e abono salarial; planejar, controlar e avaliar os programas relacionados com a geração de emprego e renda, o apoio ao trabalhador desempregado, a formação e o desenvolvimento profissional para o mercado de trabalho; planejar e coordenar as atividades relacionadas com o Sistema Nacional de Emprego quanto às ações integradas de orientação, recolocação, qualificação profissional e habilitação ao seguro-desemprego. Contudo, essa secretaria não terá as competências relativas ao FAT.

Outra Secretaria Especial do Ministério da Economia, a de Fazenda, cujo secretário é o engenheiro Waldery Rodrigues Junior, ficará responsável pelos dois departamentos relacionados aos fundos cujos recursos pertencem aos trabalhadores: o Departamento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o Departamento do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Além disso, também ficarão vinculados aos Ministério da Economia: a) o Conselho Nacional do Trabalho e b) a Fundacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho).

O Ministério da Justiça e da Segurança Pública, cujo titular é o ex-juiz da Lava-Jato Sérgio Moro, tem entre suas atribuições o registro sindical e concentrará as competências relativas a imigração. Competirá à Secretaria Nacional de Justiça, cuja secretária é a procuradora do Ministério Público Maria Hilda Marsiaj, que atuou na Lava-Jato até se aposentar em 02 de janeiro de 2019, coordenar as ações relativas ao registro sindical.

Os ministérios da Cidadania, cujo titular o ex-deputado OsmarTerra (PMDB/RS), e da Mulher, Família e Direitos Humanos, cuja ministra é a advogada Damares Alves, por sua vez, vão cuidar respectivamente das questões relacionadas a promoção de oportunidades de trabalho aos beneficiários do Bolsa-Família e do trabalho da mulher, da conciliação família e trabalho e do combate ao trabalho escravo.

Como se depreende da leitura das atribuições da Secretaria Especial do Previdência e Trabalho – listadas no art. 67 do anexo I do Decreto 9.679, de 2 de janeiro de 2019, que trata da estrutura regimental do Ministério da Economia – o secretário-especial Rogério Marinho, ex-relator da reforma trabalhista, foi escolhido para atender ao anseio do presidente Jair Bolsonaro de aprofundar e ampliar o escopo dessa reforma, inclusive com poderes para “editar” as orientações normativas de que trata o art. 200 do Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, competência que antes competia ao Ministro do Trabalho, mas passa a ser exercida pelo Secretário Especial.

Por sua efetividade na reforma trabalhista, que será ampliada com a revisão das Orientações Normativas de Segurança e Medicina do Trabalho, Rogerio Marinho também recebeu a missão de formular, articular e aprovar a reforma da previdência, dando sua contribuição para o ajuste fiscal, mediante a revisão dos critérios de acesso e das regras de concessão de benefícios previdenciários. A reforma da previdência, assim como ocorreu com a reforma trabalhista em relação ao empregador, irá reduzir os custos previdenciários do Estado, ao modificar os três fundamentos da concessão do benefício: a idade, que deve aumentar; o tempo de contribuição, que deve aumentar; e o valor do benefício, que deve diminuir.

A diluição das competências do Ministério do Trabalho entre várias pastas e secretarias resultará numa grave perda de relevância dos temas da área no contexto governamental, agravando, pelo déficit de coordenação, problemas como falta de recursos, coerência e efetividade. O sucateamento afetará gravemente as estruturas regionais, que passarão a sofrer a ingerência de vários órgãos, sem uma política e direção unificadas. Tudo isso facilitará a ação do Governo no sentido de tornar os temas da área trabalho cada vez mais distantes dos interesses dos trabalhadores e cada vez mais submetidos às orientações econômicas do Governo e aos interesses do empresariado.

(*) Jornalista, consultor e analista político, diretor de Documentação licenciado do Diap e sócio-diretor da Queiroz Assessoria.

Diap

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