Proposta de Bolsonaro inviabiliza Fundeb para 2021 e adia votação
Na véspera da votação da proposta que torna permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais de Educação (Fundeb), que teve início nesta segunda-feira, 20, o Governo Bolsonaro sugeriu a líderes partidários na Câmara dos Deputados mudanças na proposta de emenda à Constituição (PEC) 15/15, sabotando acordo para a sua aprovação.
A votação do texto estava prevista para esta semana, mas o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que vai aguardar o texto alternativo do governo. Defendeu que o Executivo encaminhe uma contraproposta que não seja “distante” do relatório apresentado pela Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO).
O novo Fundeb aumenta de 10% para 20% a complementação da União para o fundo e sua participação alcançará 23 estados (atualmente são apenas nove). Contrário ao investimento no ensino, o governo quer desviar recursos da educação para o programa social que poderá substituir o Bolsa Família e também para pagar creches.
Maia reagiu: “Se o governo quiser fazer um outro programa para educação, dentro do Fundeb, pode ser aceito, claro. Mas precisa ser para educação. O foco é a educação, mas se quiser que a educação infantil tenha prioridade, eu até concordo porque apenas 30% das crianças estão na creche, como não é o foco do Fundeb, tem que ser algo complementar. Se não for distante do que está no texto da deputada Dorinha, sim, todos querem votar a favor e vamos construir isso. Estamos dialogando”, afirmou.
O presidente da Câmara também afirmou ser contra adiar a entrada em vigor das mudanças em discussão no fundo para 2022, como propõe Bolsonaro. “Começar em 2021 é fundamental, é um grande consenso na Câmara e do ponto de vista fiscal não vai ter nenhum impacto. Vamos ter o ano de 2020 muito complicado para as crianças, muitas vão quase perder o ano e adiar o Fundeb para 2022 é uma sinalização muito negativa”, arguiu.
Defesa da educação
As entidades ligadas ao setor educacional – sindicatos de trabalhadores, organizações universitárias e secundaristas – e os setores progressistas da sociedade defendem urgência na votação da proposta de Fundeb apresentada por Dorinha, mesmo com algumas ressalvas sobre o seu teor. Mobilizam-se na campanha #FundebPraValer, que tem a participação da Contee, dentre outras entidades. Se o Fundeb não for aprovado este ano, a partir de 1º de janeiro de 2021 a União deixará de repassar recursos aos estados e municípios.
Articulados pela governadora Fátima Bezerra (PT), do Rio Grande do Norte, 20 governadores assinaram documento manifestando “apoio à imediata aprovação do substitutivo à PEC 15/2015, apresentado pela Deputada Federal Professora Dorinha Seabra Resende no último dia 10 de julho, considerando tratar-se de proposta derivada de amplo e democrático processo de discussão, a qual sintetiza formulações de diversos setores da sociedade e permite aos Entes Federativos avançar nos aspectos fundamentais da matéria: acesso, qualidade e valorização dos profissionais de educação”.
Para o líder do PT, Ênio Verri (PT-PR), há divergências entre o texto que vem sendo construído pela relatora e o que o governo espera aprovar. “O governo, em cima da hora, tem apresentado destaques e emendas muito ruins para a educação”, disse, após participar da reunião de líderes.
Debate sem trabalhadores
Pela manhã, a comissão mista presidida pelo senador Confúcio Moura (MDB-RO) e que tem como relator o deputado Francisco Júnior (PSD-GO) convidou representantes do Ministério da Educação (MEC) e do empresariado do ensino para debateram a educação. A comissão discute os impactos da pandemia na economia brasileira e, para esta sessão, não foi chamado nenhum representante dos trabalhadores.
Ilona Lustosa, secretária de Educação Básica do MEC, afirmou que os dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) de 2018 evidenciam uma distância muito grande de qualidade em relação a outros países. Reconheceu que só 2% de um total de recursos de R$ 1,6 bilhão de 2020 foram empenhados.
Também do MEC, o secretário de Educação Profissional e Tecnológica, Ariosto Culau, falou dos problemas de conectividade com a internet para alunos em situação de vulnerabilidade. “A ideia é que a gente possa atingir um mínimo de 400 mil alunos e a meta principal é chegar à totalidade dos alunos com renda familiar de até um salário mínimo e meio, que seriam 900 mil alunos”, disse, alegando que para isso ainda falta um edital do ministério.
O presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), Ademar Pereira, relatou que o índice de inadimplência no setor é alto. Na educação infantil, a previsão é que 15 mil das 20 mil escolas deixem de funcionar, com a ameaça de faltar vagas para crianças de 0 a 3 anos. Questionou: “Vamos fazer mais uma vez um Fundeb para financiar a escola estatal nesse modelo que está aí, que não funcionou por 30 anos? Nós vamos continuar insistindo nesse modelo?” Em seguida, pediu que o Senado analise destinar a verba do Fundeb também para os empresários do ensino: “A gente poderia fazer um trabalho junto ao governo porque precisaria haver dinheiro, um voucher, por exemplo, nos municípios, para atender [crianças] de zero a três anos, para que as escolas pequenas não quebrem, para que ano que vem haja escola para pôr as crianças”.
A Contee é contrária a esse posicionamento empresarial. Segundo a coordenadora-geral, em exercício, Madalena Guasco Peixoto, “é preciso que reafirmemos a bandeira de que o Fundeb, como fundo de verbas públicas, seja usado exclusivamente para investimentos no fortalecimento da educação básica pública, gratuita, democrática, inclusiva e de qualidade socialmente referenciada”.
Carlos Pompe