O MEC, para Bolsonaro: “Minha Estrada da Corrupção”
Por Gilson Reis*
Está até na Wikipédia: “O Ministério da Educação (MEC) é um órgão do governo federal do Brasil, fundado pelo decreto n.º 19.402, em 14 de novembro de 1930, com o nome de Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública, pelo então presidente Getúlio Vargas, e era encarregado do estudo e despacho de todos os assuntos relativos ao ensino, saúde pública e assistência hospitalar”. Foram 23 anos até, em 1953, também sob a batuta de Getúlio, a pasta se separar da Saúde — que ganhou ministério próprio — e se tornar o Ministério da Educação e Cultura, assumindo a sigla atual, MEC. Esta, por sua vez, permaneceu mesmo depois de, no primeiro dia do governo Sarney, em 15 de março de 1985, a Cultura ter ganhado um órgão de Estado só para si, com a criação do MinC.
A administração Bolsonaro parece ter feito uma miscelânea controversa — se é que este pode ser um eufemismo para “criminosa”, o adjetivo que cabe de fato — de tais reformas administrativas de tantas décadas. Primeiro, extinguiu o MinC em 2 de janeiro de 2019, um dia depois da posse como presidente da República. Como, porém, não voltou a Cultura para a pasta da Educação, preferindo realocá-la junto ao Ministério do Turismo, tentou agora, ao que tudo indica, encontrar um novo sentido para o C de MEC, deslocado da função há 37 anos. Nesse novo MEC, tornado o “Mega Esquema de Corrupção” de Bolsonaro, Milton Ribeiro e cia., o governo ressignifica até o originário nome getulista. Com a diferença de que, no “Ministério dos Negócios da Educação” bolsonarista, não é equívoco algum pressupor que se trata, obviamente, de negócios escusos.
A primeira notícia, que já discuti neste espaço no último dia 23 de março, com o artigo “Ministério da (má-)fé”, foi a do gabinete paralelo composto por lobistas evangélicos que vendiam a prefeitos, a preço (literal) de ouro, vantagens para obtenção de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
Depois veio a denúncia de que o governo Bolsonaro aceitou pagar R$ 480 mil por um ônibus escolar que custaria, no máximo, R$ 270,6 mil. No total, o MEC (Mega Esquema de Corrupção) pretendia comprar 3.850 veículos para utilização exclusiva de alunos da rede pública em escolas situadas nas regiões rurais. A compra engloba o programa Caminho na Escola, também financiado pelo FNDE.
O nome do programa, provavelmente, deveria ser invertido, já que a “escola”, como figura de linguagem que abarca o direito constitucional que ela representa, é que se encontra no caminho dos interesses nefastos do governo. Aliás, se fosse questionado sobre o significado da sigla MEC, ainda mais com tantos veículos superfaturados ao dispor, Bolsonaro talvez se visse tentado a dar-lhe um significado bem pessoal: “Minhas Estrada da Corrupção”, diria, pela qual os motoristas a guiar tantos ônibus, transportando milhões de reais com destino a bolsos privados, são os militares, os pastores evangélicos, os empresários da educação e a famiglia do presidente da República.
Por fim, a informação mais recente é de que a gestão de Jair Bolsonaro também destinou R$ 26 milhões de recursos do mesmo MEC (leiam a sigla como quiserem, afinal) para a compra de kits de robótica a serem destinados a escolas de pequenas cidades do interior de Alagoas, na quais nem sequer há água encanada ou salas de aula adequadas, quanto mais computadores e internet.
“Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública” era o nome da pasta na Era Vargas, quando foi criado o que viria a ser o Ministério da Educação. Mais de 90 anos depois, os negócios da educação e da saúde pública são os que desviam recursos dos dois primeiros direitos sociais assegurados pelo artigo 6° da Constituição Federal: a compra de supostos kits de robótica por um governo anticiência; as negociatas com imunizantes, em plena pandemia, por um governo antivacina.
Já “ministério”, naquele sentido etimológico de “estar a serviço dos outros” — por “outros” entendendo-se o povo, como deveria ser numa res publica —, sob a égide de Bolsonaro, simplesmente não existe.
*Gilson Reis é coordenador-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino — Contee