MP 936 é inconstitucional e sindicatos são quem define o processo negocial
A Medida Provisória (MP) 936, que equivale à lei ordinária temporária (sua validade é de, no máximo, 120 dias), ao excluir do manto da proteção sindical os trabalhadores que recebem até três salários mínimos (R$ 3.135,00) e aqueles com diploma de curso superior, com salário superior a R$ 12.012,12 (duas vezes o valor do teto regime geral de previdência social, que é de R$ 6.101,06), afronta de forma monstruosa as garantias constitucionais constantes do Art. 7º, incisos VI e XIII, da Constituição Federal (CF), que, respectivamente, somente admitem redução salarial e alteração de jornada de trabalho por meio de convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Afronta também o Art. 8º, incisos III e VI, igualmente da CF, que, respectivamente, atribuem aos sindicatos o inafastável dever de defender os direitos e interesses coletivos e individuais dos integrantes da categoria e a obrigatoriedade da participação sindical em toda negociação coletiva.
Essas inconstitucionalidades são expressamente reconhecidas pelo ministro do STF, Ricardo Lewandowski, em sede de medida cautelar concedida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6363, ao dia 6 de abril corrente.
Todavia, o referido reconhecimento de inconstitucionalidade da MP em questão não se presta a autorizar os sindicatos a limitar a sua ação no tocante à medida provisória sob questionamento a rechaçar os “acordos individuais”, visando à redução salarial ou suspensão temporária de contrato.
Ao contrário, por força do que determinam o Art. 8º, inciso III, da CF, e a decisão constante da mencionada medida cautelar, os sindicatos, sempre que acionados, devem prontamente assumir as negociações coletivas, mesmo sabendo que seu objeto único é a redução de direito.
Essa conduta ativa mostra-se essencial para dar um mínimo de segurança aos trabalhadores relegados à própria má-sorte pela MP sob comentários, bem como para evitar que sua recusa ou omissão dê validade jurídica aos termos de tais “acordos individuais”, tornando seus termos inquestionáveis, como sobressai da comentada cautelar.
Frise-se que a manifestação formal e solene das entidades sindicais à formalização de negociações coletivas para esse indesejável mister tem de se dar no prazo máximo de oito dias, por analogia ao Art. 617 da CLT.
No entanto, em nenhuma hipótese a ação sindical deve ter como norte a mera homologação desses nefastos “acordos” para evitar a demissão sumária dos trabalhadores que foram obrigados a submeter-se aos seus termos.
O Art. 2º da MP 936 assevera que o “Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda”, limitado ao período de calamidade pública, possui os seguintes objetivos:
“I – preservar o emprego e a renda;
II – garantir a continuidade das atividades laborais e empresariais; e
III – reduzir o impacto social decorrente das consequências do estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública”.
Com base nesses objetivos, a negociação individual e/ou coletiva que vise à redução salarial e à suspensão temporária dos contratos de trabalho deve ter, como ponto de partida, a comprovação de que, sem a sua concretização, não haverá condições de se manter, sem grave comprometimento, os contratos de trabalho dos profissionais da educação escolar e dos estabelecimentos de ensino no âmbito da representação da Contee.
Desse modo, ao assumir a negociação coletiva com vistas à discutida pactuação, faz-se legítima e necessária a exigência de que as escolas interessadas apresentem, imediatamente, os seus balancetes contábeis específicos relativos aos últimos seis meses, pelo menos; bem assim, os pedidos de transferência, caso haja, e as comunicações de suspensão de pagamento de mensalidades escolares ocorridos após o início do estado de calamidade pública.
Caso os estabelecimentos de ensino (ou alguns deles) se recusem a fornecer esses destacados documentos, que terão o sigilo preservado, ou os forneça de maneira insatisfatória, as negociações devem ser suspensas até que o façam.
Para prevenir e resguardar direitos, em casos que tais, os sindicatos devem, com amparo no Art. 726 do Código de Processo Civil (CPC) e na Orientação Jurisprudencial (OJ) 392 do Tribunal Superior do Trabalho (OJ), notificar solenemente as empresas recalcitrantes da impossibilidade de se negociar e/ou de se dar validade jurídica a “acordos individuais” enquanto perdurar a sua recusa em fornecer os destacados documentos essenciais para esse mister.
Há de se registrar que tal recusa atenta contra os princípios de probidade e boa-fé que regem a conduta de todos os contratantes, tanto na celebração quanto na execução de contratos, conforme estabelece o Art. 422 do Código Civil (CC).
Por derradeiro, a Contee recomenda aos sindicatos a ela filiados que documentem de maneira formal e solene todos os atos que praticarem durante o repisado processo negocial, desde o momento em que forem instados a fazê-lo até eventual celebração de acordo ou de sua inviabilização.
Gilson Luiz Reis
Coordenador-geral da Contee