Sinpro/RS: Sistemas de ensino devem reorganizar ano letivo, diz CNE
Diretrizes aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação orientam estados, municípios e escolas sobre as práticas que devem ser adotadas durante a pandemia e propõem normas nacionais
Por Gilson Camargo*
Estados e municípios devem buscar alternativas para minimizar a necessidade de reposição presencial de dias letivos, a fim de permitir que seja mantido um fluxo de atividades escolares aos estudantes enquanto durar a situação de emergência em virtude da pandemia do novo coronavírus. A orientação é do Conselho Nacional de Educação (CNE) e integra as diretrizes aprovadas em plenário virtual pelos 21 conselheiros, na terça-feira, 28, que visam orientar escolas da educação básica e instituições de ensino superior durante a pandemia do coronavírus. O Conselho reitera que aulas e atividades não presenciais sejam validadas como carga horária.
Elaborado com a colaboração do Ministério da Educação (MEC), o parecer traz orientações e sugestões para todas as etapas de ensino, da educação infantil à superior, propõe normas nacionais gerais e delibera que a reorganização dos calendários é de responsabilidade dos sistemas de ensino. O parecer – que em grande parte reitera políticas de governo sobre a recomposição do ano letivo, a exemplo do que determina a Medida Provisória P 932/2020 – está em revisão e deve ser homologado pelo ministro da Educação.
DANOS – Os sistemas de ensino em todos os estados do país suspenderam as aulas no início do ano letivo, atendendo a decretos municipais e estaduais de isolamento social para conter o avanço da pandemia, conforme orientações da Organização Mundial da Saúde(OMS). No mundo, de acordo com os últimos dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que monitora os impactos da pandemia na educação, 191 países determinaram o fechamento de escolas e universidades, o que atinge cerca de 1,6 bilhão de crianças e jovens, o que corresponde a 90,2% de todos os estudantes. Para os conselheiros, esse cenário poderá provocar problemas de aprendizagem especialmente aos alunos oriundos de famílias de baixa renda ou socialmente vulneráveis. A evasão escolar também é uma preocupação expressa no documento, que não descarta o comprometimento dos próximos anos letivos devido às alterações impostas pela pandemia. “Sob este aspecto, é importante considerar as fragilidades e desigualdades estruturais da sociedade brasileira que agravam o cenário decorrente da pandemia em nosso país, em particular na educação se observarmos as diferenças de proficiência, alfabetização e taxa líquida de matrícula relacionados a fatores socioeconômicos e étnico-raciais”, destaca o parecer do CNE.
As pautas mais importantes debatidas no encontro virtual foram o calendário escolar de 2020 e se as aulas e as atividades a distância contarão como horas letivas ou terão de ser integralmente repostas quando as aulas presenciais forem retomadas. No Rio Grande do Sul, o Conselho Estadual de Educação(CEEd/RS) informou que aguarda a homologação das diretrizes pelo ministério para manter ou adequar as orientações à realidade do estado. As normas para a regulamentação do ano letivo aprovadas pelo CNE coincidem com a MP 934/2020, publicada em 1º de abril, que dispensa o cumprimento dos 200 dias letivos e estabelece o mínimo de 800 horas-aula previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). A MP 934, por sua vez, foi precedida de um Parecer do CEEd/RS que já considerava as atividades domiciliares realizadas pelos professores e alunos como dias e horas para o cumprimento das exigências do calendário letivo, lembra Sani Cardon o conselheiro do CEEd/RS e diretor do Sindicato dos Professores (Sinpro/RS). “O Parecer emitido pelo Conselho Estadual já contempla as alterações da MP, não somente os dias letivos, mas também as horas mínimas necessárias através de aulas on-line, bem como tarefas domiciliares de forma excepcional”, esclarece.
O presidente do CNE, Luiz Curi, lembrou que o parecer foi construído com base em ações que o MEC já vinha desenvolvendo. “O documento é importante porque apoia e estimula ações frente à pandemia do novo coronavírus. Isso auxilia as redes de ensino estaduais e municipais no acolhimento ao direito de aprendizado no país”, ressaltou. Para o secretário de Educação Superior do Ministério da Educação, Wagner Vilas Boas de Souza, as diretrizes propõem o protagonismo das instituições de ensino. “O parecer do CNE vem em uma boa hora e vai, não só regulamentar, como tirar as dúvidas. Esse parecer vem, inclusive, com o papel de fomentar que as instituições tomem medidas mais ativas, mais eficientes, para garantir ensino e aprendizagem neste tempo de pandemia”, apontou.
REPOSIÇÃO – Para repor a carga horária ao fim do período de emergência, o CNE sugere a utilização de períodos não previstos como recesso escolar do meio do ano, de sábados, e a reprogramação de períodos de férias. A ampliação da jornada escolar diária por meio de acréscimo de horas em um turno ou utilização do contraturno para atividades escolares também são alternativas que podem ser consideradas.
Além disso, o CNE autorizou os sistemas de ensino a computar atividades não presenciais para cumprimento de carga horária de acordo com deliberação própria de cada sistema. Uma série de atividades não presenciais que podem ser utilizadas pelas redes de ensino durante a pandemia foi listada: meios digitais, videoaulas, plataformas virtuais, redes sociais, programas de televisão ou rádio, material didático impresso e entregue aos pais ou responsáveis são algumas das alternativas sugeridas.
Para pensar em soluções eficientes, evitar aumento das desigualdades, da evasão e da repetência, o Conselho recomenda que as atividades sejam ofertadas, desde a educação infantil, para que as famílias e os estudantes não percam o contato com a escola e não tenham retrocessos no seu desenvolvimento. “Estamos fazendo todos os esforços no sentido de dar boas soluções ou mitigações às aflições que estão na ponta, das aflições das redes de ensino dos estados e dos municípios”, disse a secretária de Educação Básica, Ilona Becskeházy.
Confira as recomendações contidas no Parecer do CNE:
EDUCAÇÃO INFANTIL – A orientação para creche e pré-escola é que os gestores busquem uma aproximação virtual dos professores com as famílias, de modo a estreitar vínculos e fazer sugestões de atividades às crianças e aos pais e responsáveis. As soluções propostas pelas escolas e redes de ensino devem considerar que as crianças pequenas aprendem e se desenvolvem brincando prioritariamente.
ENSINO FUNDAMENTAL – Sugere-se que as redes de ensino e escolas orientem as famílias com roteiros práticos e estruturados para acompanharem a resolução de atividades pelas crianças. No entanto, as soluções propostas pelas redes não devem pressupor que os “mediadores familiares” substituam a atividade do professor. As atividades não presenciais propostas devem delimitar o papel dos adultos que convivem com os alunos em casa e orientá-los a organizar uma rotina diária.
ENSINO TÉCNICO – A ideia é ampliar a oferta de cursos presenciais em cursos de educação a distância (EaD) e criar condições para realização de atividades pedagógicas não presenciais de forma mais abrangente a cursos que ainda não se organizaram na modalidade a distância. Os estágios vinculados às práticas na escola deverão ser realizados de forma igualmente virtual ou não presencial.
ENSINO SUPERIOR – O CNE sugere que, para a continuidade das atividades de ensino aprendizado nesse nível de ensino, as instituições possam disponibilizar atividades não presenciais.
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA) – Enquanto perdurar a situação de emergência sanitária, as medidas recomendadas para EJA devem considerar a harmonização dos objetivos de aprendizagem ao mundo do trabalho, a valorização dos saberes não escolares e as implicações das condições de vida e trabalho dos estudantes.
EDUCAÇÃO INDÍGENA E QUILOMBOLA – As escolas poderão ofertar parte das atividades escolares em horário de aulas normais e parte em forma de estudos dirigidos e atividades nas comunidades, desde que estejam integradas ao projeto pedagógico da instituição, para garantir que os direitos de aprendizagem dos estudantes sejam atendidos. Nos estados e municípios onde existam conselhos de educação escolar indígenas e quilombolas, estes devem ser consultados e suas deliberações consideradas nos processos de normatização das atividades.
AVALIAÇÃO – Sugere-se que as avaliações nacionais e estaduais considerem as ações de reorganização dos calendários de cada sistema de ensino antes de realizar o estabelecimento dos novos cronogramas das avaliações em larga escala de alcance nacional ou estadual. É importante garantir uma avaliação equilibrada dos estudantes em função das diferentes situações que serão enfrentadas em cada sistema de ensino, assegurando as mesmas oportunidades a todos que participam das avaliações em âmbitos municipal, estadual e nacional.
Nesse sentido, as avaliações e os exames de conclusão do ano letivo de 2020 das escolas deverão levar em conta os conteúdos curriculares efetivamente oferecidos aos estudantes, considerando o contexto excepcional da pandemia, com o objetivo de evitar o aumento da reprovação e do abandono no ensino fundamental e médio.
Aprovado pelo CNE, o documento ainda será homologado pelo MEC. Conselhos estaduais e municipais de educação poderão ainda definir como cada localidade seguirá as orientações. As decisões finais de como o calendário será cumprido caberão a estados e municípios. Para o CNE, o que deve ser levado em consideração é o atendimento dos objetivos de aprendizagem e o desenvolvimento das competências e habilidades a serem alcançados pelos estudantes em circunstâncias excepcionais provocadas pela pandemia.
Também participaram das discussões sobre o documento o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), o Fórum dos Conselhos Estaduais e a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME). Houve ainda contribuições da sociedade, por meio de consulta pública.
*Com reportagem de Bianca Estrella e Larissa Lima, do Portal MEC