A monstruosa face do STF que ameaça os direitos trabalhistas

Por José Geraldo de Santana Oliveira*
O surreal – ou, nem tanto, nos dias atuais – romance Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde (“O estranho caso do Dr. Jekyll e o Sr. Hyde”, ou, em tradução livre, “O médico e o monstro”), do escritor escocês Robert Louis Stevensen, publicado em 1886, tem como enredo central a dupla personalidade do respeitado Dr. Jekyll, que, graças a uma fatídica poção, por ele criada, transforma-se no sinistro e inescrupuloso Hyde, conforme relatado em, por assim dizer, sua carta testamento.
Passados 139 anos da publicação dessa fantástica e consagrada obra do gênero terror, o Brasil se depara com o que se pode qualificar como dupla personalidade do Supremo Tribunal Federal (STF), como que a dar razão à ironia do escritor irlandês Oscar Wilde, para quem a vida imita muito mais a arte do que é por ela imitado.
No campo dos direitos e garantias fundamentais individuais e da defesa da ordem política democrática, o STF encarna com intrepidez absoluta o Dr. Jekyll, rechaçando com todo vigor possível qualquer ameaça que interponha sua integridade – como o fez com a tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, abortado graças à sua destemida e pronta ação.
Porém, desafortunadamente, no tocante aos direitos fundamentais sociais, o STF se veste inteiramente de Hyde, revelando-se infiel guardião da Constituição Federal (CF), ao abrir e sustentar ostensiva guerra contra todos os chamados direitos trabalhistas e a Justiça do Trabalho, a quem cabe sua proteção.
Essa face de Hyde, do STF, é desnudada a partir do julgamento do processo RE 590415, em 2015, quando ele abriu largos para prevalência do negociado in pejus – em prejuízo – sobre o legislado. Desde então, só se multiplicou e ganhou cruenta dimensão, sendo que todos os direitos fundamentais sociais que a ele chegam, em busca de proteção, saem envoltos em uma sangrenta mortalha, metaforicamente falando.
Tal como o senador Catão, “o Velho” – que sempre encerrava seus discursos com o célebre grito de guerra “Delenda est Carthago” (com tradução livre, “Cartago tem de ser destruída”), no auge das chamadas guerras púnicas, de 264 a 146 a.C –, desde a concessão de liminar na ADPF 323, em 18 de outubro de 2016, que suspendeu todos os processos que tinham como fundamento a Súmula 277 do TST, com a redação de 2012, que assegurava a ultratividade das normas coletivas, o ministro Gilmar Mendes, sempre acompanhado pela maioria, em todas as decisões que profere em processos que versam sobre direitos fundamentais sociais, de forma direta ou indireta, renova o brado de que a Justiça do Trabalho e os direitos trabalhistas têm de ser aniquilados.
Por isso, a decisão proferida no ARE 1532603, aos 14 de abril corrente, determinando a suspensão de todos os processos que tenham como tema a pejotização, e que ganhou destaque nacional, não causa surpresa alguma a quem tem o doloroso dever de acompanhar as decisões sobre direitos trabalhistas que se emanam do STF, sejam monocráticas ou colegiadas, com exceção dos ministros Edson Fachin e Flávio Dino.
Nessa decisão, o ministro Gilmar Mendes anotou em sua decisão monocrática:
“[…] No caso dos autos, está em discussão: 1) a competência da Justiça do Trabalho para julgar as causas em que se discute a fraude no contrato civil de prestação de serviços; 2) a licitude da contratação de trabalhador autônomo ou pessoa jurídica para a prestação de serviços, à luz do entendimento firmado pelo STF no julgamento da ADPF 324, que reconheceu a validade constitucional de diferentes formas de divisão do trabalho e a liberdade de organização produtiva dos cidadãos; e 3) a questão referente ao ônus da prova relacionado à alegação de fraude na contratação civil, averiguando se essa responsabilidade recai sobre o autor da reclamação trabalhista ou sobre a empresa contratante.
A controvérsia sobre esses temas tem gerado um aumento expressivo do volume de processos que tem chegado ao STF, especialmente por intermédio de reclamações constitucionais. Como já destaquei na manifestação sobre a existência de repercussão geral, parcela significativa das reclamações em tramitação nesta Corte foram ajuizadas contra decisões da Justiça do Trabalho que, em maior ou menor grau, restringiam a liberdade de organização produtiva. Esse fato se deve, em grande parte, à reiterada recusa da Justiça trabalhista em aplicar a orientação desta Suprema Corte sobre o tema.
Conforme evidenciado, o descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica, resultando na multiplicação de demandas que chegam ao STF, transformando-o, na prática, em instância revisora de decisões trabalhistas.
Essa situação não apenas sobrecarrega o Tribunal, mas também perpetua a incerteza entre as partes envolvidas, afetando diretamente a estabilidade do ordenamento jurídico. Feitas essas considerações, entendo necessária e adequada a aplicação do disposto no art. 1.035, § 5º, do CPC, ao caso dos autos, para suspender o processamento de todas as ações que tramitem no território nacional e versem sobre os assuntos discutidos nestes autos.
Entendo que essa medida impedirá a multiplicação de decisões divergentes sobre a matéria, privilegiando o princípio da segurança jurídica e desafogando o STF, permitindo que este cumpra seu papel constitucional e aborde outras questões relevantes para a sociedade.
Ante o exposto, determino a suspensão nacional da tramitação de todos os processos que tratem das questões mencionadas nos presentes autos, relacionadas ao Tema 1.389 da repercussão geral, até julgamento definitivo do recurso extraordinário. Comunique-se à Presidência do Tribunal Superior do Trabalho e aos Presidentes de todos os Tribunais Regionais do Trabalho, que deverão informar os juízes sob sua jurisdição acerca o teor desta determinação. Publique-se. Brasília, 14 de abril de 2025. Ministro GILMAR MENDES Relator Documento assinado digitalmente”.
Em absoluto desprezo aos trabalhadores e aos seus direitos, o ministro Gilmar Mendes asseverou na ADI 5685:
“4. Paternalismo e a necessária refundação do Direito e da Justiça do Trabalho Nelson Rodrigues já dizia que ‘subdesenvolvimento não se improvisa; é fruto de séculos’. Os dilemas que hoje o mercado nos impõe, e que exige que reflitamos a respeito do nosso modelo de direitos sociais, nomeadamente os trabalhistas, são fruto de uma cultura paternalista que se desenvolveu há décadas. O Direito do Trabalho brasileiro baseia-se em uma premissa de contraposição entre empregador e empregado; na prática, uma perspectiva marxista de luta entre classes”.
Faltou ao ministro dizer que, em contraposição à perspectiva marxista de luta entre classes, que ele repudia, impõe a perspectiva capitalista de submissão absoluta da classe trabalhadora à dos empresários, a quem suas decisões dedicam todas as loas e garantias.
Na reclamação 72873, o ministro Gilmar Mendes assevera:
“[…] Não é novidade que o Supremo Tribunal Federal tem chamado a atenção diuturnamente para os entraves impostos pela Justiça do Trabalho à liberdade de organização produtiva dos cidadãos. Como reflexo desse posicionamento temos uma enxurrada diária de reclamações ajuizadas perante essa Corte, as quais, em sua grande maioria, são julgadas procedentes.
O que se observa é que a justiça trabalhista tem se negado reiteradamente a aplicar as orientações desta Suprema Corte sobre a matéria. Apenas para que tenhamos a devida dimensão da problemática, aponto que, segundo dados extraídos do portal Corte Aberta, entre 1º1.2024 e 30.9.2024, foram distribuídas mais de 7.360 reclamações a todos os Ministros da Corte, das quais 4.440 reclamações foram classificadas pelos sistemas internos deste Tribunal nas categorias ‘Direito do Trabalho’ e ‘Direito Processual Civil e do Trabalho’. Em 9.10.2024, tramitavam 3.663 reclamações nesta Suprema Corte, sendo certo que 2.223 reclamações possuíam a mesma classificação.
Não precisamos de métodos estatísticos elaborados ou de grandes matemáticos para chegarmos à conclusão de que parcela significativa das reclamações que tramitam nesta Corte envolvem a seara trabalhista. Com efeito, no período compreendido entre 1º.8.2024 e 30.9.2024, foram apreciadas por ambas as Turmas mais de 180 reclamações e mais de 570 reclamações com decisões monocráticas, que tinham por objeto decisões da Justiça do Trabalho que, em maior ou menor medida, negavam a liberdade de organização produtiva. No primeiro semestre deste ano (1º.2.2024 a 1º.7.2024), foram julgadas colegiadamente mais de 460 reclamações com o mesmo objeto. Em termos de decisões monocráticas, nesse mesmo período, foram proferidas mais de 1.280 por todos os integrantes da Corte. Os números assustam! Eles servem para demonstrar que essa quantidade infindável de reclamações sobre os mesmos temas trabalhistas têm dificultado o adequado exercício das funções constitucionais atribuídas a esta Corte. Tudo isso fruto de uma renitência da Justiça do Trabalho em dar efetivo cumprimento às deliberações desta Corte.
Cuida-se de uma tentativa inócua de frustrar a evolução dos meios de produção, os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas significativas. Se a própria Constituição Federal não impõe um modelo específico de produção, não faz qualquer sentido manter as amarras de um modelo verticalizado, fordista, na contramão de um movimento global de descentralização. Diante desse cenário, tendo em vista o reconhecimento da licitude de outras formas de organização do trabalho assentada no julgamento da ADPF 324, a jurisprudência dominante desta Corte tem se firmado no sentido de que a formalização de contrato por pessoas jurídicas para prestação de serviços inerentes à atividade fim da empresa contratante (“pejotização”) não configura fraude a justificar o reconhecimento da relação de emprego.
Todavia, após longa reflexão sobre a matéria, entendo que a discussão merece novo encaminhamento. Cumpre registrar que, na grande maioria dos casos que tem chegado a esta Corte sobre a matéria, existe um contrato firmado entre as partes para a prestação de serviços, regido pela legislação civil, em especial pelos arts. 593 e seguintes do Código Civil.
[…]
Diante do reconhecimento da natureza civil/comercial do contrato, esta Corte firmou orientação no sentido de que as relações envolvendo a incidência da Lei 11.442/2007 devem ser analisadas pela Justiça Comum, e não pela Justiça do Trabalho, ainda que eventualmente se discuta a alegação de fraude à legislação trabalhista, consubstanciada nos arts. 2º e 3º da CLT.
[…]
Desse modo, em linha com precedentes do Tribunal, entendo que as causas que discutam a regularidade de contrato civil ou comercial devem ser apreciadas pela Justiça Comum e, caso seja verificada qualquer nulidade no negócio jurídico, nos termos do art. 166 e seguintes do Código Civil, caberá a remessa dos autos à Justiça do Trabalho para apuração de eventuais direitos trabalhistas. Feitas essas considerações, passo à análise do caso concreto.
[…]
Entretanto, antes da discussão acerca da existência de eventuais direitos trabalhistas, é necessária a análise prévia da regularidade do contrato civil de prestação de serviços (eDOC 11), que, conforme já amplamente demonstrado acima, compete à Justiça Comum. Ressalto ainda que, caso verificado qualquer vício no negócio jurídico, a Justiça Comum deve fazer a remessa dos autos à Justiça do Trabalho, a quem compete apreciar as questões atinentes à seara trabalhista.
Ante o exposto, julgo procedente a reclamação para cassar o acórdão reclamado, ante a incompetência da Justiça do Trabalho, determinando a remessa dos autos à Justiça Comum. Comunique-se. Publique-se. Brasília, 21 de outubro de 2024. Ministro GILMAR MENDES Relator”.
Por tudo que já foi anotado acima, pode-se afirmar, sem medo de se cometer qualquer deslize, que quem se der ao trabalho de examinar as decisões de natureza trabalhista, proferidas pelo STF, monocrática e coletivamente, sem o olhar ambicioso e antissocial do capital, forçosamente concluirá que não há exagero algum no título do livro dos procuradores do trabalho do MPT da 1ª Região, Rio de Janeiro, Cássio Casagrande e Rodrigo Carelli, “A SUPREMA CORTE CONTRA OS TRABALHADORES – COMO O STF ESTÁ DESTRUINDO O DIREITO DO TRABALHO PARA PROTEGER AS GRANDES CORPORAÇÕES”. Ao contrário, esse título calha como luva sob encomenda para a pletora de decisões que dele emanam, sempre em prejuízo dos trabalhadores.
Apenas a título de ilustração, enumeram-se, aqui, algumas das mais nocivas decisões do STF, proferidas em processos que têm como objeto direitos trabalhistas, e que corroboram a assertiva de que, em casos que tais, a Suprema Corte veste-se de Hyde, da obra citada Robert Stevenson, “O médico e o monstro”.
I Tema 725
“Tema 725: É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante.”
II ADI 2200
“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA PROVISÓRIA N. 1.950-62/2000, CONVERTIDA NA LEI N. 10.192/2001. REVOGAÇÃO DOS §§ 1º E 2º DO ART. 1º DA LEI N. 8.542/1992. ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVOS DE TRABALHO. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 13.467/2017. PREJUÍZO DA AÇÃO. 1. Argumentação genérica quanto à indicação de afronta ao inc. XXXVII do art. 5º da Constituição da República. 2. A conversão da Medida Provisória n. 1.950-62/2000 na Lei n. 10.192/2001 torna prejudicado o debate sobre o preenchimento da excepcionalidade exigida pelo art. 62 da Constituição da República. 3. Nos incs. VI e XXVI do art. 7º da Constituição da República não se disciplinam a vigência e a eficácia das convenções e dos acordos coletivos de trabalho. A conformação desses institutos compete ao legislador ordinário, que deverá, à luz das demais normas constitucionais, eleger políticas legislativas aptas a viabilizar a concretização dos direitos dos trabalhadores. 4. Superveniência da Lei n. 13.467/2017, que expressamente veda ultratividade no direito do trabalho brasileiro. Esvaziamento da discussão quanto à lei revogadora. Impossibilidade de repristinação das normas revogadas pelos dispositivos questionados. 5. Ação direta de inconstitucionalidade prejudicada.”
III Tema 383
“Tese firmada: A equiparação de remuneração entre empregados da empresa tomadora de serviços integrante da administração pública e empregados da empresa contratada (terceirizada) fere o princípio da livre iniciativa, por se tratar de agentes econômicos distintos, que não podem estar sujeitos a decisões empresariais que não são suas.”
IV Tema 1046
“São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.”
V ADI 5994
“Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Jornada de trabalho 12 por 36. Pactuação por acordo individual. Art. 59-A da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 13 de julho de 2017. Reforma Trabalhista. 3. Alegação de violação ao disposto no artigo 7º, incisos XIII, XIV e XXVI, da Constituição Federal. Inocorrência. 4. ADI 4.842, Rel. Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 14.9.2016. 5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente.”
Não se pode esquecer que o Art. 59-A da CLT, reputado constitucional pelo STF, é o que autoriza a jornada de 12×36, por “acordo individual”, sem intervalo para repouso e alimentação.
VI O ministro Nunes Marques, relator designado da ADI 5826, que declarou a constitucionalidade do contrato intermitente – o qual, nas felizes palavras do ministro Edson Fachin, relator vencido, é contrato zero hora e zero salário –, ao proferir voto divergente, que foi acompanhado pela maioria, asseverou:
“[…] na referida modalidade de contratação, é assegurado ao empregado o pagamento de verbas tradicionalmente previstas, como repouso semanal remunerado, férias e décimo terceiro salário proporcionais e recolhimentos previdenciários.
Ademais, o valor da hora de trabalho não pode ser inferior ao valor hora do salário-mínimo ou daquele salário devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função porém em relação de contrato de trabalho comum. Depois, sob o enfoque da proteção social, embora o contrato de trabalho tradicional ofereça maior segurança ao trabalhador, na medida em que estabelece salário e jornada fixos, há que considerar que o novo tipo contratual eleva a proteção social em relação aos trabalhadores informais, que executam serviços sem nenhum tipo de contrato”.
Segundo dados do Caderno de Negociação N. 83, do Dieese, e do Boletim de Emprego em Pauta N. 28, publicados em novembro de 2024, os 417 mil contratos intermitentes, ao final de 2023, revelam que 41% não geraram trabalho ou renda; e, para 76% dos que tiveram remuneração mensal, essa foi inferior ao salário-mínimo ou não tiveram remuneração. A remuneração média dos intermitentes foi de apenas R$ 762, ou 58% do salário-mínimo de 2023 (R$ 1.300).
O grau de aniquilamento dos direitos trabalhistas, em que se avulta a pejotização, posta no balaio da terceirização, ungida pelo STF como aríete da modernidade (RE 958252 e ADPF 324), chegou a tal grau de dramaticidade, que mereceu do ministro Flávio Dino as seguintes ponderações, durante o julgamento da RCL 67348, conforme matéria publicada no portal Migalhas de 27/10/2024:
“Acho que nós tínhamos que revisitar o tema, não para rever a jurisprudência, mas para delimitar até onde ela vai, porque hoje nós vamos virar uma nação de pejotizados. […] O pejotizado vai envelhecer e ele não terá aposentadoria. Esse pejotizado vai sofrer um acidente de trabalho e ele não terá benefício previdenciário. Se for uma mulher, ela vai engravidar e não terá licença gestante”.
Em todas as decisões proferidas pelo STF em processos que envolvem direitos trabalhistas, ainda que se procure com lupa – ou com lanterna acesa ao meio-dia, como fizera Diógenes, à procura de um homem honesto –, não se encontra nem uma palavra sequer em prol dos valores sociais do trabalho, erigido como quarto fundamento da República Federativa do Brasil, pelo Art. 1º, IV, da CF, em pé de igualdade com os da livre iniciativa – aliás, não aleatoriamente, topograficamente insculpido antes desses. Isso porque todas as loas e garantias são reservadas à livre iniciativa, como se essa fosse única e estivesse acima da própria sociedade.
Se se decompuser cada decisão do STF, acima mencionadas, às quais se somam dezenas de outras que não foram retratadas, restará claro que todas elas, sem exceção, põem de ponta cabeça os princípios que sempre regeram o Direito do Trabalho.
Assim, o princípio da proteção tem seu eixo deslocado para a classe detentora do capital; o da condição mais benéfica e o da norma mais favorável são igualmente revertidos ao empregador; o da irrenunciabilidade dos direitos é substituído pela possibilidade de renúncia total deles, como se não houvesse assimetria entre as partes contratantes; o da primazia da realidade cede lugar ao da primazia da forma, ainda que vise a fraudar, o que via de regra acontece, os direitos irrenunciáveis, como é regra na pejotização.
Diante desse horizonte de trevas, desenhado e implementado pelo STF, contra todos os fundamentos, princípios e garantias constitucionais em matéria de direitos fundamentais sociais, urge que o movimento sindical dos trabalhadores ouse em suas ações e denuncie essa Corte à OIT, por graves violações às suas convenções, ratificadas pelo Brasil. Bem assim, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Isso, sem prejuízo de denúncias internas, como providencialmente fizera como os constituintes que tentavam impedir a aprovação da Constituição cidadã.
O certo é que não se pode assistir inerte à proposital e orquestrada destruição dos direitos trabalhistas e da Justiça do Trabalho, exatamente por quem tem o dever constitucional de guardar a CF cidadã.
*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Co