Fusão de Anhanguera e Kroton está na berlinda
Por Beth Koike | De São Paulo
Anhanguera será a mais prejudicada se a transação não for adiante
Faltando três meses para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) dar seu parecer final, a fusão entre Anhanguera e Kroton nunca foi tão questionada. Juntas, as companhias vão formar o maior grupo de ensino superior do mundo com valor de mercado de cerca de R$ 20 bilhões.
No Cade, a transação é considerada extremamente complexa, principalmente na área de ensino a distância (EAD). Esta é a primeira fusão entre grandes grupos de educação no país, ambos com forte atuação nesse segmento. Ainda não há parâmetros para os técnicos do Cade se basearem e as decisões tomadas devem servir de referência para os próximos negócios. Outra operação envolvendo ensino a distância que também está sob análise da autarquia é a aquisição da UniSeb pela carioca Estácio.
“Se em relação ao mercado de graduação presencial o Cade já possui um razoável número de decisões emitidas que permitiriam a formação de sua jurisprudência, a análise do mercado de graduação EAD ainda é incipiente, dada a própria característica dessa modalidade de ensino, ainda recente no Brasil”, informou a superintendência-geral da autarquia em seu parecer emitido em dezembro.
Atualmente, o tribunal do Cade está definindo se considera a fusão sob a ótica da concorrência nacional ou se mantém uma análise regional. O ponto sensível da transação é a competição no mercado nacional. Segundo a autarquia, Anhanguera e Kroton juntas detinham cerca de 40% do mercado de ensino a distância em 2012. O caso de cinco cursos foi considerado crítico: administração, ciências contábeis, serviço social, gestão de RH e gestão hospitalar. Com exceção de administração, as empresas têm entre 78% e 94% de participação de mercado nos quatro cursos em questão. Outro agravante é que os cursos de ciências contábeis, serviço social, gestão de RH e gestão hospitalar estão entre os cinco mais procurados pelos alunos.
Diante desse cenário, já se aventa a possibilidade de o Cade pedir para as companhias venderem um dos seus três ativos de ensino a distância: Uniderp (que foi comprada pela Anhanguera por R$ 248 milhões em 2007), Unopar ou Uniasselvi – estas adquiridas pela Kroton, por um total de R$ 1,8 bilhão.
Porém, é pouco provável que a Kroton aceite se desfazer de um dos seus ativos de ensino a distância, uma vez que eles demandaram alto investimento, geram rentabilidade superior à dos cursos presenciais e colocaram o grupo na liderança do setor. Para a Anhanguera, a venda da Uniderp também seria uma perda importante, uma vez que o credenciamento dos cursos de ensino a distância no MEC é feito por essa instituição.
Se o Cade considerar apenas a concorrência no âmbito regional, os impactos serão menores. Nesse caso, há uma sobreposição em 171 municípios onde estão 51 mil alunos, que representam apenas cerca de 6% do total de estudantes matriculados nas instituições de ensino.
Do lado dos investidores, o cenário é ainda mais complexo. Os minoritários da Kroton reclamam da relação de troca de ações. Na época do anúncio da fusão, em abril do ano passado, o acordo previa que cada ação da Anhanguera valeria 0,4548 da Kroton. Mas de lá pra cá, as ações das empresas caminharam em sentidos diferentes. Os papéis da Kroton tiveram alta de 70,89%, partindo da cotação do pregão de 19 de abril, um dia antes da união, e foram os mais valorizados do Ibovespa no ano passado. Já as ações da Anhanguera tiveram aumento de 15% no período.
O Credit Suisse divulgou relatório no fim de fevereiro destacando que a fusão, nos atuais termos, não é interessante para a Kroton. Esta, sozinha, tem potencial de valorização de 23% e a Anhanguera de apenas 6% – percentuais superiores ao estimado se houver a fusão. “Sem nenhuma mudança na atual relação de troca, o valor de mercado implícito da nova empresa seria de R$ 20,2 bilhões, deixando apenas espaço de alta de 5% que viria da combinação das duas empresas e as sinergias esperadas”, informou em seu relatório o analista Victor Schabbel, do Credit Suisse. De acordo com Schabbel, considerando as sinergias que serão obtidas e o preço-alvo da “nova Kroton”, a companhia fruto da fusão valeria R$ 21,3 bilhões.
Caso a associação seja reprovada, a mais prejudicada será a Anhanguera que vive em compasso de espera há quase um ano, tendo em vista que o principal executivo da nova companhia será Rodrigo Galindo, atual presidente da Kroton. O Bank of America Merrill Lynch (BofA) estimou em relatório, também no fim de fevereiro, que se o acordo fracassar, o preço-justo para a ação da Anhanguera seria de R$ 8,80 – uma desvalorização de mais de 30% do preço atual. Porém, o BofA seguia acreditando que a fusão irá adiante, apostando que o Cade fará uma análise regional da concorrência.
O mau humor do mercado também é motivado, em parte, pelas expectativas do balanço da Anhanguera. “Acreditamos que a Kroton deve anunciar resultados sólidos. Na Anhanguera, esperamos resultados fracos no quarto trimestre”, informa relatório do Santander.
Se a transação fracassar, a candidata mais provável a entrar no jogo seria a Estácio, que chegou a negociar com Anhanguera 15 dias antes de Kroton. Porém, segundo o Valor apurou na época, as negociações entre o grupo carioca e a Anhanguera foram marcadas por desentendimentos. De acordo com fontes do setor, a Anhanguera teria negado as reivindicações da Estácio de fazer uma pré-auditoria, acordos jurídicos e reuniões no MEC e Cade antes de tornar a fusão pública. Em paralelo, a Anhanguera negociou com a Kroton e fechou a operação em menos de uma semana. O acordo teve como protagonistas o professor Gabriel Rodrigues, acionista da Anhanguera, e Walfrido dos Mares Guia, sócio da Kroton. Procuradas pela reportagem, Anhanguera, Kroton e Estácio informaram que não comentam rumores de mercado.
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Do Valor Econômico