Um bom professor

No dia 3 de junho, os parlamentares brasileiros aprovaram o Plano Nacional de Educação (PNE), que tramitava há três anos e meio no Congresso Nacional. O próximo passo é a sanção presidencial, que deve acontecer ainda esta semana. A participação da sociedade civil na formulação de políticas públicas em educação não é novidade. Desde 2008, quando uma portaria ministerial instituiu a Conferência Nacional de Educação (Conae), diversos grupos sociais atuam junto com o poder público com o objetivo de colocar as suas demandas em pauta. A aprovação do PNE foi uma vitória para muitos deles (leia mais aqui e aqui), mas também levantou uma luz vermelha. Uma de suas estratégias (a 7.36, que faz parte da meta 7) diz o seguinte:

“estabelecer políticas de estímulo às escolas que melhorarem o desempenho no Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica], de modo a valorizar o mérito do corpo docente, da direção e da comunidade escolar”
A estratégia é problemática porque dá brecha para a instituição de políticas “míopes” de incentivo financeiro a professores. O Ideb, criado em 2007, é calculado com as médias de desempenho na Prova Brasil e as taxas de aprovação dos estudantes. Ao “valorizar o mérito do corpo docente” tendo por base apenas o Ideb, corremos o risco de aferir a qualidade do trabalho docente de maneira incompleta. Será que resultados de testes e taxas de aprovação são capazes de dizer quais professores são “bons” para serem recompensados e quais não são?

Um post publicado em um blog do Banco Interamericano de Desenvolvimentotambém no começo de junho dá algumas pistas. Questionado por um educador sobre como seria o professor ideal, um grupo de estudantes respondeu: “O melhor professor é aquele que sabe quem nós somos; o que escuta, faz perguntas e se importa com os nossos interesses e paixões; é aquele cujo entusiasmo em ensinar é contagiante e aquele que tentará diversas vezes até que seus alunos tenham compreendido o material ensinado”.

Se um professor ideal escuta, cuida, é entusiasmado e determinado, qualquer método de avaliação do trabalho docente deve aferir essas qualidades – principalmente se a aferição estiver atrelada a incentivos financeiros. O problema é que, atualmente, essa avaliação ideal não existe. O Ideb, como se vê, tem medidas restritas de qualidade. Mesmo em países como o Chile, onde se busca avaliar o docente de maneira mais holística, são deixados de lado aspectos fundamentais do processo de ensino e aprendizagem, como a dedicação, o entusiasmo, a paixão, a flexibilidade para desenvolver diversas estratégias de ensino e o empenho em reconhecer o contexto no qual os alunos estão inseridos.

Aqui, nos Estados Unidos, há um grande esforço do meio acadêmico para se construir novas medidas ou se melhorar as já existentes. Entrevistei uma pesquisadora recentemente que fez um pedido para os formuladores de políticas públicas norte-americanos: esperem até que nós tenhamos um modelo de avaliação menos problemático. Neste post, faço o mesmo apelo aos brasileiros: vamos cobrar da presidente Dilma Rousseff que a estratégia 7.36 do PNE seja vetada. E, na sequência, discutir os moldes de um sistema de avaliação do trabalho docente que seja mais justo.

Em tempo: estou escrevendo uma reportagem para a revista Educação sobre os problemas dos métodos de avaliação docente que estão em voga nos Estados Unidos. A discussão é mais técnica, mas se você se interessou pelo assunto, vale a pena conferir. Estará no ar no dia 5 de julho: www.revistaeducacao.com.br.

Por Beatriz Rey, para o Brasil Post

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