Nota de Solidariedade ao quilombola Flávio Ferreira de Souza
As entidades subscritas vêm manifestar solidariedade ao quilombola Flávio Ferreira de Souza, da comunidade quilombola Nova Betel, detido às 16:30h do dia 21 de abril de forma irregular por um agente de segurança que presta serviços a empresa do monocultivo do dendê, Brasil Bio Fuels (BBF), com sede no município de Acará.
Após a apreensão, Flávio foi levado para a Seccional de Marituba, sendo apresentado na Delegacia somente às 22:00h, fato que já está sendo investigado pelo Ministério Público do Estado do Pará.
No dia da apreensão (21), Flávio e cerca de mais de 200 pessoas, entre indígenas, quilombolas e ribeirinhos, participava de um ato legítimo de protesto contra os impactos que atingem as populações na Amazônia Brasileira, causados pelo uso excessivo de agrotóxicos no monocultivo do dendê que, ao longo dos anos, vem prejudicando a saúde dos integrantes das comunidades, incidindo no próprio modo de vida dessas pessoas, e contaminando os aquíferos da região.
No dia seguinte (22), em uma atitude arbitrária, o Juiz responsável pelo caso, suspendeu a audiência de custódia, decidindo às 6:45hs do mesmo dia, pela prisão de Flávio. De forma descuidada, o juiz acabou por emprestar créditos à versão do segurança da empresa. O laudo do exame de corpo delito acusou indícios de espancamento, o que foi observado pelo Promotor de Justiça de Acará, razão pela qual será retomado o rito realizando a audiência de custódia que acontecerá na próxima segunda-feira no município de Acará.
No dia 24 de abril, após inúmeras manifestações de apoio ao Quilombola Flávio Ferreira de Souza o juiz responsável pelo caso procedeu com a audiência de custódia efetuando a liberação da liderança. O processo prossegue, desta forma, urge que os subscritores continuem a acompanhar essa é outras violações aos Direitos socioterritoriais das comunidades Originárias e Quilombolas.
Essa tentativa de favorecimento a BBF foi em vão, mas chama a atenção para a total vigilância da sociedade, no sentido de que se faça justiça e os devidos ritos legais sejam cumpridos para o caso em tela.
Vigilantes exigimos respeito ao direito da manifestação pública dos povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos, cujos direitos humanos são constantemente violados. Foi exatamente o que se deu no dia 21, quando as comunidades tradicionais de Acará decidiram expressar seus sentimentos ante os constantes ataques da coalizão empresa BBF, maior produtora de dendê da América Latina.
O sofrimento vem se acumulando desde que a Biopalma, subsidiária da Vale, iniciou o plantio do dendê, ampliando cada vez mais a área explorada na região, chegando a passar tratores nas plantações das comunidades, substituindo a agricultura familiar (subsistência dos povos tradicionais) pelo dendê.
Com a chegada da BBF anunciando o projeto “Bio sustentável” como alternativa de vida, a situação piorou, acentuando as violações e, portanto, os conflitos.
Além de avançar na ocupação do território o que se vê é o despejo de toneladas de veneno glifosato (agrotóxico) e outros rejeitos da produção de palma, causando a morte de peixes pelo envenenamento, em total descuidado com o meio ambiente e com as comunidades tradicionais, pois o projeto do monocultivo de palma de dendê é uma imposição externa que fere a prática da agricultura familiar.
Nós apoiamos a decisão dessas Populações em recuperar seus territórios, que originalmente pertencem a esses povos, tendo em vista o direito de herança de seus ancestrais e da população ribeirinha têm o direito de viverem em paz e harmonia em seus territórios ancestrais, dos quais dependem intimamente suas sobrevivências.
Por outro lado, essas populações se queixam também da ausência das autoridades governamentais, que terminam por favorecer direta ou indiretamente a empresa, pela falta de fiscalização e leniência diante de tantas violações de direitos humanos e ambientais, e indícios de fraudes nos licenciamentos ambientais e nos registros de propriedade das áreas adquiridas pela BBF da Biopalma, em novembro de 2020. Do mesmo modo, a morosidade na titulação definitiva de uso coletivo das terras das comunidades tradicionais, contribui para o conflito em si, e para a angústia e perda da qualidade de vida dessas comunidades.
Por fim, reiteramos que, diante de todas as questões acima expostas, é justo que às comunidades se organizem e queiram resgatar o pleno direito de uso de seus territórios. Ratificamos ainda, que toda manifestação pública por direitos é amparada pelo Estado Democrático de Direitos, é que privar os indivíduos de fazê-lo significa depor contra a liberdade, sob a qual está assentada — mesmo que sob ataques constantes praticadas por um governante com tendências fascistas, a nação brasileira.
Belém, 24 de abril de 2022.