Nota pública sobre o PNE
Ao ser enviado para a Congresso Nacional, em dezembro de 2010, o projeto do novo Plano Nacional de Educação (PNE) já não atendia demandas e discussões fundamentais feitas pela primeira Conferência Nacional de Educação (Conae), realizada no mesmo ano. No entanto, após trabalho político intenso e determinado feito pelas entidades que defendem a educação, entre as quais a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino – Contee, o projeto aprovado pela Câmara dos Deputados no ano passado se aproximou mais das deliberações e preocupações expressas na Conae. Um exemplo disso foi a exigência de ampliação do investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% do Produto Interno Bruto (PIB) do país no quinto ano de vigência do plano e, no mínimo, o equivalente a 10% ao final do decênio (o projeto original previa investimentos de apenas 7% do PIB). Apesar disso, ainda foram deixados de fora pontos importantes como a criação do Sistema Nacional de Educação (SNE) e a regulamentação da educação privada.
Agora, em sua primeira prova de fogo no Senado, na votação da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), ainda que o relatório inicial do senador José Pimentel (PT-CE), o qual trazia enormes prejuízos, tenha sofrido algumas alterações, o PNE continuou sendo desfigurado em sua função primeira de assegurar investimentos na qualidade da educação pública e manteve problemas muito significativos que visam exclusivamente a beneficiar os interesses do setor privado.
A despeito de restabelecer a meta intermediária de investimentos no prazo de cinco anos – o que teria sido catastrófico por eliminar as possibilidades de investimento imediato e os mecanismos de controle social das aplicações de recursos -, o projeto substitutivo final que segue para as comissões de Constituição e Justiça e de Educação manteve a supressão da exigência de que os investimentos públicos sejam feitos exclusivamente em educação pública, o que oficializa as portas abertas para o repasse de verba pública para a iniciativa privada.
O mesmo acontece com as modificações aprovadas nas metas 11 e 12 do PNE, cujo texto final do substitutivo manteve a troca da ampliação da oferta de vagas públicas por vagas gratuitas, o que, longe de ser meramente uma questão semântica, representa uma opção deliberada pela expansão do ensino superior e do ensino técnico e profissionalizante via setor privado, por meio de programas como o Universidade para Todos (ProUni), o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Tais programas deveriam ser políticas de governo emergenciais e transitórias, e não políticas de Estado oficializadas no Plano Nacional de Educação. Contudo, programas como ProUni, Fies e Pronatec somente serão transitórios se tivermos empenho político e verbas suficientes para ampliar a oferta dos ensinos superior, técnico e profissionalizante públicos, o que não é verificado no projeto substitutivo do PNE.
Outro prejuízo, ainda que o substitutivo tenha tentado amenizá-lo estabelecendo um prazo de vigência até 2016, é a manutenção, na meta 4 do PNE, do repasse de verbas do Fundeb para instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos, conveniadas com o poder público, que prestem atendimento escolar aos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. É preciso frisar que, no Brasil, existem apenas dois segmentos na educação: o público e o privado. Instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas não são instituições públicas e não podem, portanto, ser tratadas, de forma absurda, como tal. Precisam, antes sim, ser regulamentadas sob exigências idênticas às aplicadas à educação pública, incluindo plano de carreira para os trabalhadores e gestão democrática e transparente.
Pelas alterações aprovadas, fica evidente que as negociações foram feitas de modo a fortalecer o setor privado. A correlação de forças é desfavorável ao fortalecimento da educação pública e os acordos que estão sendo costurados somente prejudicam a luta para colocar a educação pública como estratégica para o desenvolvimento da nação.
Além disso, como já demonstraram reportagens veiculadas na imprensa nacional, recursos públicos têm servido ao fortalecimento de empresas de capital aberto para a obtenção de lucros com o oferecimento de cursos superiores de curta duração e de péssima qualidade. O mesmo ocorre com a formação profissional, na qual, inclusive, professores são chamados de “instrutores” como forma de o setor privado driblar a legislação trabalhista e precarizar o trabalho.
A Contee, enquanto representante de quase 1 milhão de professores e técnicos administrativos que atuam no setor privado, vem mais uma vez defender a necessidade de um PNE que assegure uma educação pública, gratuita e de qualidade socialmente referenciada, bem como a regulamentação da educação privada com exigências legais idênticas às feitas para a educação púbica. Não podemos permitir que prejuízos e retrocessos sejam aprovados nas próximas etapas da tramitação do PNE. Os estabelecimentos privados de ensino devem ser uma alternativa democrática de escola, e não a alternativa oferecida e custeada pelo Estado que não cumpre o direito assegurado na Constituição.
Brasília, 29 de maio de 2013.
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino – Contee