49 anos da Revolução dos Cravos: as portas que abril abriu
“Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos do passado
se chamava esse país
Portugal suicidado.
(…)
Ora passou-se porém
que dentro de um povo escravo
alguém que lhe queria bem
um dia plantou um cravo.
Era a semente da esperança
feita de força e vontade
era ainda uma criança
mas já era a liberdade.
Era já uma promessa
era a força da razão
do coração à cabeça
da cabeça ao coração.
(…)
Foi esta força viril
de antes quebrar que torcer
que em vinte e cinco de Abril
fez Portugal renascer.
(…)
E se esse poder um dia
o quiser roubar alguém
não fica na burguesia
volta à barriga da mãe!
Volta à barriga da terra
que em boa hora o pariu
agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu!”
(As portas que abril abriu, de José Carlos Ary dos Santos)
De Portugal Chico Buarque nos enviou ontem (24) um cheirinho de alecrim. “Valeu a pena esperar por esta cerimônia, marcada não por acaso para a véspera do dia em os portugueses descem a Avenida da Liberdade a festejar a Revolução dos Cravos”, discursou ao enfim receber, depois de 4 anos de espera, o Prêmio Camões que lhe foi concedido pelos governos de Portugal e do Brasil.
“No que se refere ao meu país, 4 anos de um governo funesto duraram uma eternidade, porque foi um tempo em que o tempo parecia andar para trás. Aquele governo foi derrotado nas urnas, mas nem por isso podemos nos distrair, pois a ameaça fascista persiste, no Brasil como um pouco por toda parte”, continuou.
Foi um lembrete oportuno — a necessidade de não nos distrairmos — para ser feito ontem. Assim como é uma lembrança oportuna celebrar, nesta terça-feira, 25 de abril de 2023, os 49 anos da Revolução dos Cravos, que derrotou o fascismo em Portugal não depois de 4, mas sim de mais de 40 anos.
Parafraseando o discurso de Chico, recordar essa história não é tratá-la apenas como uma honraria, um episódio do qual Portugal pode se orgulhar, mas como um desagravo a todos quantos foram, lá e/ou aqui, humilhados e ofendidos durante os anos (os que se encerraram em 1974, em 1985 ou agora mesmo, em 2022) de estupidez e obscurantismo.
Vivas à Revolução dos Cravos e às portas que abril abriu!
Táscia Souza