Sobre o tenebroso crescimento da violência nas escolas
Por Margot Andras*
Estamos chocados, mais uma vez sem palavras, arrasados nesta quarta feira (5), véspera do feriado de Páscoa, acompanhando famílias enlutadas por situações inimagináveis. Se existiam dois lugares em que sempre nos ensinaram que estaríamos em segurança, eram em casa e na escola. Quando esses espaços são invadidos, nosso mundo vem abaixo.
De 2002 a 2017, num período de 15 anos, aconteceram quatro casos de violência em escolas, incluindo o chocante episódio de Realengo. Nos últimos 7 anos, contudo, os casos se multiplicaram por três. E não se trata de coincidência, uma vez que estamos assistindo ao crescimento da violência e do discurso de ódio, além de uma tolerância incompreensível em relação a manifestações contrárias à humanidade das pessoas. Como na poesia, não podemos nos calar e minimizar esse crescimento absurdo.
Não é por acaso que esses episódios aumentaram nessa frequência nos anos de governos antidemocráticos, ao mesmo tempo em que o número de armas nas mãos de civis também cresceu — e muito! Temos cerca de 1,9 milhão de armas em circulação no Brasil, segundo dados de junho de 2022. São armas registradas na Polícia Federal e Exército, nas mãos de pessoas que, muitas vezes, não as guardam e não as usam com precaução e cuidado.
A desvalorização da democracia nesses últimos tempos e a facilidade de se consumir e disseminar ideologias de ódio na internet contribuem para que a violência seja regra, mobilizando aqueles que se sentem prejudicados pela mudança nas relações de poder, nos direitos das mulheres, dos negros, dos indígenas, e no reconhecimento de todas as pautas identitárias.
Sempre existiu intolerância, mas esse quadro de publicização, permissão e estímulo ao ódio é um plano de formação e incentivo ao fascismo e ao nazismo, reforçado pelos governos que estiveram à frente do nosso país de 2016 a 2022, os quais não só alimentavam, como faziam pouco caso dessa violência.
A constatação de que todos os criminosos são do sexo masculino, enquanto as vítimas fatais são geralmente mulheres, meninas e crianças, mostra a força que a escalada de ideias de cunho nazista pode refletir no comportamento de crianças e adolescentes, mas principalmente entre os meninos. Isso traz a construção de uma masculinidade violenta, o que explica que a maioria dos ataques seja cometida por adolescentes e jovens do sexo masculino.
Todos nós somos responsáveis por garantir a proteção de crianças e adolescentes, o que só irá acontecer se a sociedade se comprometer com uma educação igualitária, calcada no respeito às diferenças, de modo a superar o modelo de masculinidade construído com base na violência. É fundamental abrir espaço para o diálogo e permitir que frustrações e fragilidades sejam trabalhadas. Com escolas de qualidade, com professores e professoras valorizados, com políticas públicas.
A Contee defende uma ampla discussão, em todas as instâncias, sobre a violência nas escolas? Que as escolas contem com serviço de atendimento capacitado de acolhimento e acompanhamento de jovens em sofrimento. E que tenhamos um SUS forte, bem como Caps (Centros de Atenção Psicossocial) atuantes para o acolhimento desses jovens assim que encaminhados pelas escolas.
*Margot Andras é coordenadora da Secretaria de Defesa das Diversidades, Direitos Humanos e Respeito às Etnias e Combate ao Racismo da Contee