Desafios da adoção de tecnologias na educação brasileira
Nesta última segunda-feira (16/9), o programa Contee Conta trouxe uma discussão de extrema relevância: o papel da inteligência artificial (IA) no projeto de educação do Brasil. Com o tema “Inteligência Artificial: Influência ou Interferência na Educação?”, o programa contou com a presença de Renata Mielli, coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil e estudiosa do tema, além de Alan Francisco de Carvalho, coordenador geral em exercício da Contee.
Renata Mielli, especialista em comunicação e tecnologias digitais, apresentou um panorama equilibrado sobre a IA na educação. Quando questionada pela jornalista Romênia Mariani, apresentadora do programa, sobre se a IA representa uma influência ou uma interferência no sistema educacional, Mielli adotou uma postura cuidadosa. “Eu vou fazer o papel do equilibrista na corda bamba e vou dizer que ela pode ser as duas coisas ao mesmo tempo”, afirmou.
Para Mielli, estamos em um momento de transição. Ela comparou a situação atual ao estágio inicial de uma tecnologia, enfatizando que ainda temos a oportunidade de moldar o impacto da IA. “Estamos na infância dessa nova tecnologia. Ainda estamos em condições de ter alguma influência sobre seu desenvolvimento e definir se ela será uma interferência ou uma intervenção”, explicou.
A especialista destacou que não adota nem uma posição completamente otimista, nem alarmista em relação à IA, mas prefere avaliar os impactos de maneira cautelosa. “Eu acho que ela pode trazer benefícios significativos para a educação, especialmente para os professores, mas estamos no caminho de entender o real impacto dessa tecnologia”, completou Mielli.
O programa ressaltou a importância de uma discussão constante sobre o papel das tecnologias na educação, um tema que se torna cada vez mais urgente à medida que a inteligência artificial avança no cenário global.
Alan Francisco de Carvalho, coordenador-geral em exercício da Contee, trouxe à tona uma reflexão sobre os desafios e oportunidades que a tecnologia oferece, ressaltando a necessidade de políticas públicas e espaços democráticos para garantir que essas ferramentas não prejudiquem o mundo do trabalho, de modo especial o da comunidade escolar.
Renata Mielli, que já havia destacado o equilíbrio entre os benefícios e riscos da IA, reforçou que é fundamental discutir essas questões de maneira crítica. Ela mencionou a urgência de estabelecer diretrizes claras sobre o uso dessas tecnologias na educação. “Nós precisamos de políticas públicas e formação para que os profissionais envolvidos na educação conheçam os riscos e benefícios, e possam mitigar os problemas”, destacou.
Para Alan, essa preocupação se conecta com o histórico temor de que as máquinas substituam o trabalho humano, uma visão que ele comparou ao movimento ludista, que surgiu com a Revolução Industrial. Ele enfatizou que, apesar dos avanços tecnológicos, é necessário um espaço de debate democrático para que as melhores escolhas sejam feitas. “O medo de os professores serem substituídos pela inteligência artificial, como você mencionou, Renata, pode ser alarmista, mas é algo que precisa ser discutido”, apontou.
O coordenador-geral também destacou o papel crucial da Contee na proteção dos direitos dos profissionais da educação, incluindo docentes, auxiliares e técnicos-administrativos. “A Contee, em seu trabalho contínuo, precisa garantir que o processo de decisão sobre o uso dessas tecnologias seja participativo e democrático”, afirmou ele, reforçando que isso depende da correlação de forças na sociedade.
A coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil destacou os desafios que escolas públicas e privadas enfrentam ao introduzir tecnologias como a internet e a inteligência artificial nas salas de aula. De acordo com Mielli, a pesquisa TIC Educação, conduzida pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGIBR), revela grandes disparidades na adoção dessas tecnologias. “A adoção das TICs no processo educacional é assimétrica”, afirmou ela, destacando as diferenças entre escolas particulares de diferentes classes sociais e as escolas públicas. A falta de padronização no uso de tecnologias educacionais, como o computador e o celular, e a ausência de infraestrutura adequada são problemas recorrentes, com a maioria das escolas sem salas de informática e com o uso da internet e dos celulares frequentemente proibido.
Além disso, Mielli sublinhou a ausência de uma política pública clara para capacitar professores e técnicos no uso dessas ferramentas tecnológicas. “Não temos uma formação ou requalificação estabelecida para o uso dessas tecnologias no processo ensino-aprendizagem”, apontou. Essa lacuna contribui para que muitas escolas vejam a tecnologia como algo nocivo, ao invés de um recurso para melhorar a educação.
Alan Francisco de Carvalho, coordenador-geral em exercício da Contee, também destacou a necessidade urgente de um debate público sobre o uso dessas tecnologias na educação. Para ele, a falta de orientação e padronização amplia as desigualdades no sistema educacional brasileiro.
Mielli encerrou a discussão enfatizando a importância de desenvolver políticas públicas que não apenas mencionem a tecnologia nas bases curriculares nacionais, mas que realmente preparem os educadores para integrar essas ferramentas de forma eficaz na sala de aula. “Precisamos dar um passo atrás e reavaliar como estamos lidando com a incorporação das tecnologias no ensino”, concluiu.
O programa destacou que, sem uma política estruturada e sem a devida formação dos educadores, a adoção da inteligência artificial pode aprofundar ainda mais as desigualdades existentes no sistema educacional brasileiro.
Por Vitoria Carvalho, estagiária sob supervisão de Romênia Mariani