“Dize-me com quem andas, que te direi quem és”
Eleições municipais 2024: o chamado inescusável da democracia
Por José Geraldo de Santana Oliveira*
Há o inescusável chamado da democracia, que se estende a 153.703.233 eleitores/as de 5569 das 5571 cidades brasileiras- só os/as 2.206.000 eleitores/as de Brasília e os/as 3447 de Fernando de Noronha não são alcançados por esse chamado, pois nessas duas cidades não haverá votação-, para, no próximo dia 6 de outubro, comparecerem às urnas e elegerem 5569 prefeitos/as e 58.114 vereadores/as; nas 103 cidades, com mais de 200 mil eleitores/as, caso nenhum dos candidatos a prefeito/a obtenha a maioria absoluta (metade mais um) dos votos válidos, haverá segundo turno, no dia 27 de outubro, entre os dois candidatos mais votados. A eleição para vereador só acontecerá dia 6 de outubro.
O eleitorado é composto por 81.806.914 mulheres, 74.076.997 homens e 28.769 sem identificação de gênero. A cidade de São Paulo, com 9.322.444 eleitores/as, elegerá 55 vereadores/as, o maior número. Já Serra da Saudade-MG, com 1294 eleitores/as- muito embora conte com 831 habitantes-, elegerá 9 vereadores/as, que é o menor número. Nos termos do Art. 29, da Constituição Federal (CF), as cidades com até 15 mil eleitores/as elegem 9 vereadores/as; e, as com mais 8 milhões, 55.
A história dos municípios brasileiros remonta-se aos primórdios da formação do Brasil colonial. Muito embora sejam previstos, constitucionalmente, desde a Constituição de 1824- Art. 167: “Art. 167. Em todas as Cidades, e Villas ora existentes, e nas mais, que para o futuro se criarem haverá Câmaras, às quais compete o Governo econômico, e municipal das mesmas Cidades, e Villas.-, somente com a Constituição de 1988 adquiriram a condição de entes federativos autônomos, dotados de poderes políticos-administrativos, regidos por constituições próprias (leis orgânicas), em conformidade com os Arts. 1º, 18 e 29, que assim estabelecem: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: .Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição. Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:”
A relevância política dos municípios é ressaltada, com singular sabedoria, pelo saudoso e acreditado constitucionalista Paulo Bonavides: “[..] não há uma única forma de união federativa contemporânea onde o princípio da autonomia municipal tenha alcançado grau de caracterização política e jurídica tão alto e expressivo quanto aquele que consta da definição constitucional do novo modelo implantado no País com a Carta de 1988″ (BONAVIDES, 1996, p. 314)”.
Portanto, diversamente do que diz e propaga o senso comum, as eleições municipais, em hipótese alguma, podem ser tomadas como eventos políticos menores, aos quais se comparece principalmente para cumprir dever legal, posto que o voto é obrigatório (Art. 14, § 1º, da CF). Ao contrário, são eventos de primeira grandeza, com igual dimensão aos que se relacionam com as eleições estaduais e nacional. Em certa medida, pode-se afirmar que as eleições municipais são as que se apresentam com maior relevância, pois é no município que a vida pulsa, se concretiza e se desenvolve.
Para se poder aquilatar o significado das eleições municipais, basta que se tomem as competências constitucionais atribuídas aos municípios, pelo Art. 30, da CF: “ Art. 30. Compete aos Municípios:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
III – instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
IV – criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;
V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;
VI – manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino fundamental;
VI – manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental;
VII – prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;
VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
IX – promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual”.
Colhe-se desse dispositivo constitucional que o poder municipal é determinante para o bem ou mal-estar do cotidiano da vida de todos os munícipes (moradores do município). Se é fato que o poder municipal, sem apoio, cooperação e colaboração do poder estadual e do federal não consegue cumprir suas inafastáveis atribuições constitucionais, que se consubstanciam em dignidade e bem-estar de seus munícipes. Igualmente o é que, se não estiver a serviço dessas atribuições, o cumprimento das obrigações dos poderes estadual e federal não é bastante para garantir o bem-estar da população do município.
Por tudo isso, o chamado da democracia, para que todos/as eleitores/as, no dia 6 de outubro de 2024 e, em alguns casos dia 27 (segundo turno), compareçam às urnas e, com dois simples toques na tecla confirma, escolham os prefeitos e vereadores a quem confiarão suas cidades, nos próximos quatro anos, com reflexos positivos ou negativos, por muitos outros anos, é muito mais que um dever; é, antes de tudo, o direito de escolher que cidades querem para si, seus filhos, netos, bisnetos etc.
Afinal, como diz o multissecular provérbio popular: “dize-me com quem andas, que te direi quem és”.
*José Geraldo de Santana é consultor jurídico da Contee