Curso Anual do NPC discute mídia e poder no Brasil e no mundo
Foi com música e poesia em homenagem ao Dia da Consciência Negra que começou nesta quarta-feira (20) o 19º Curso Anual do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), no Rio de Janeiro. O curso, que tem como tema “Mídia e poder no Brasil e no mundo hoje”, segue até o próximo domingo (24) com debates e oficinas relacionados não só às questões técnicas das comunicações comunitária, sindical e dos movimentos sociais, mas também sobre os aspectos políticos que envolvem essas produções enquanto meios de enfrentamento e resistência à mídia hegemônica. “Não estamos aqui para discutir apenas técnica, porque a técnica pode ser usada para o bem ou para o mal. Estamos discutindo ideias e valores políticos”, ressaltou o coordenador do NPC, Vito Giannotti.
O curso está sendo realizado num momento em que a defesa da democratização da comunicação está na ordem do dia, com a coleta de assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Mídia Democrática, e enfrenta o lobby das grandes empresas, que tem levado aos sucessivos adiamentos da votação do Marco Civil da Internet na Câmara dos Deputados.
Segundo Vito Giannotti, quase 300 pessoas se inscreveram no curso, que conta com a participação de mais de cem entidades sindicais de todo o Brasil, incluindo a Contee, por meio de sua assessoria de comunicação. “Nunca houve tantos sindicatos inscritos. E por que isso neste curso? Porque está na cara que a mídia tem um papel central na sociedade. Ouve-se falar muito em democratização da mídia, porque ou a gente democratiza ou a gente vai ficar a ver navios”. No entanto, Giannotti frisou que é preciso refletir sobre duas questões: como nossa mídia alternativa está hoje e como podemos melhorá-la “enquanto não chega a tal democratização” e o que vamos fazer com uma mídia democratizada.
A primeira mesa, que contou com o jornalista Beto Almeida, da Telesur, e do historiador, escritor, doutor em Comunicação a ativista negro Joel Rufino dos Santos, abordou “A comunicação e a resistência das classes populares no século XXI”. No debate foram levantadas questões como a crise do neoliberalismo, que propiciou o começo de algumas mudanças progressistas no campo das comunicações, sobretudo na América Latina, mas também tem sido marcado por tragédias violentas, como a guerra imperialista no Iraque e as ameaças à Síria, e pela destruição do estado de bem-estar social na Europa. A mesa também citou experiências bem-sucedidas nos países latino-americanos, como os jornais estatais O Telégrafo e O Cidadão, no Equador; a criação da TeleSur em 2005 pela Venezuela, com sua meta histórica de promover a integração da América Latina; e a nova lei das comunicações da Argentina, cuja finalidade é a desconcentração, estabelecendo um limite nas licenças e concessões para cada grupo empresarial e para os diversos setores da sociedade, o que favorece a pluralidade, a democracia e o avanço da soberania social.
Já a segunda mesa, que teve participação da jornalista e professora da UFRH Beatriz Bissio e do jornalista a cartunista Gilberto Maringoni, professor da UFABC, tratou da oposição entre a mídia burguesa e a mídia popular. Beatriz fez um resgate histórico do trabalho da revista Cadernos do Terceiro Mundo, que realizou grandes reportagens sobre temas como a defesa da libertação da Palestina e da independência de Angola e Moçambique.
Maringoni, por sua vez, ressaltou o atual estágio de luta pela democratização da comunicação. Ele citou a habilidade da imprensa burguesa de passar a impressão de que está defendendo não apenas a burguesia, mas a sociedade inteira. “A Folha de S. Paulo, por exemplo, é claramente de direita, mas foi ela que denunciou a compra de votos no caso da reeleição, no governo Fernando Henrique, ao mesmo tempo em criminaliza os movimentos sociais e os trabalhadores. A mídia burguesa faz isso pela direita: a legitima na sociedade”. Além disso, segundo ele, a mídia burguesa consegue convencer os anunciantes e o Estado a ampará-la. “Não existe mídia burguesa sem apoio do Estado. São isenções fiscais, financiamentos do BNDES, farta publicidade… Os governantes adoram aparecer na mídia burguesa.”
Maringoni enfatizou, contudo, que existe uma “janela de oportunidade” atualmente em prol da luta pela democratização: a briga das empresas de comunicação pelo bolo publicitário enquanto caem suas audiências e tiragens. “Mas não tenhamos a ilusão de que vamos contar com o apoio do Estado brasileiro. A batalha é conseguir nas ruas o 1,5 milhão de assinaturas para a Lei da Mídia Democrática.”
Por Táscia Souza, do Rio de Janeiro