A regra 85/95 e o monstro chamado fator previdenciário

Na noite de ontem (13), o Plenário da Câmara, ao aprovar a Medida Provisória (MP) 664/14, aprovou também a emenda do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que permite a aplicação da chamada regra 85/95 em vez do fator previdenciário. Essa regra prevê que a mulher poderá se aposentar quando a soma de sua idade aos 30 anos de contribuição for de 85 e, no caso do homem, a soma da idade a 35 anos de contribuição somar 95. Com essa regra, a aposentadoria seria integral em relação ao salário de contribuição.

Abaixo, segue uma análise da emenda feita pelo consultor jurídico da Contee, José Geraldo de Santana Oliveira. A Contee ressalta que a regra 85/95 é uma alternativa melhor que o fator previdenciário, mas que nossa luta continua sendo pelo fim do fator, eliminando essa crueldade contra os trabalhadores criada pelo governo FHC.

Leia a análise abaixo:

Por José Geraldo de Santana Oliveira*

O Art. 40 da Constituição Federal (CF), em seu 1º, inciso III, alínea ‘a’, estabelece:

“§ 1º- Os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados, calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º e 17º(redação dada pela Emenda Constitucional N. 41/2003):

(…)

III- voluntariamente, desde que cumprido tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, observadas as seguintes condições- redação dada pela Emenda Constitucional N. 20/98 -:

a) sessenta anos de idade e trinta e cinco de contribuição, se homem, e cinquenta e cinco anos de idade e trinta e de contribuição, se mulher”.

Já o 5º, também com a redação dada pela Emenda Constitucional N. 20/98, estipula:

“§ 5º- Os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em 5 (cinco) anos, em relação ao disposto no § 1º, III, a, para o professor que comprove exclusivamente tempo de contribuição de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio”.

Pois bem. Iguais regras foram propostas para o Art. 201 da CF, que abrange os segurados do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) – empregados, contribuintes individuais, autônomos, donas de casa, estudantes etc.

Como se tratava de emenda constitucional, para aprová-la, o governo necessitava de três quintos dos votos da Câmara Federal e do Senado – 308 deputados e 49 senadores -, conforme o Art. 60, § 2º, da CF. Porém, o então deputado federal pelo PSDB de São Paulo, Antonio Kandir, errou o voto; com isso, a proposta obteve 307 votos, não atingindo, portanto,  os três quintos exigidos, o que implicou a sua rejeição.

A derrota do governo foi justamente comemorada por todos os segurados do RGPS. No entanto, menos de um ano depois, em 1999, aquele se vingou, de forma maligna, fazendo o Congresso Nacional aprovar o Projeto de Lei (PL) que resultou na Lei N. 9876, de novembro de 1999, instituindo o insaciável monstro chamado de fator previdenciário, ou, simplesmente, FP, como, jocosamente, gostam de dizer os doutrinadores previdenciaristas. Equivale a dizer: a vitória dos segurados do RGPS, em 1998, foi de Pirro, ou seja, com amargo sabor e conteúdo de derrota. Aliás, a maior, depois da criação do FGTS pela Lei N. 5107/1996, para acabar com a estabilidade decenal.

A lógica desse monstro – que chega a surripiar metade dos proventos de aposentadoria – é a seguinte: quanto mais distante da perspectiva natural de morte, menores são os proventos; e, vice-versa, quanto mais próximo, maiores.

Frise-se que tal FP só é neutro, ou seja, não implica redução dos proventos de aposentadoria, para a mulher, aos sessenta anos, e, para o homem, aos sessenta e cinco anos.

Os(as) segurados(as) mais penalizados pelo FP são os(as) professores(as), principalmente as professoras, que, como começam a trabalhar cedo, no máximo, aos 18 anos, via de regra, com 43 estão prontas para a aposentadoria; mas, se o fizerem, perdem cerca de metade dos proventos.

Por ironia da história, agora, na conversão da famigerada Medida Provisória (MP) N. 665/2014 – que, metaforicamente falando, tunga a pensão da(o) viúva(o) e reduz o valor médio do auxílio doença -, a Câmara Federal aprovou, por maioria dos presentes, 232 a 210 votos, uma marota emenda – prática comum do governo, quando lhe interessa, na votação de todas as MPs – de autoria do deputado federal Arnaldo Faria de Sá, do PTB de São Paulo, mitigando o FP, ou seja, tornando-o menos monstruoso e maléfico, por meio das fórmulas 85, para a mulher, 95, para o  homem; entretanto,  com alcance menor do que fora proposto em 1998, que, pasmem-se todos, era mais benéfico aos segurados do RGPS, se professores(as).

A comentada emenda altera o Art. 29 da Lei N. 8.213/1991, que é a Lei de Benefícios da Previdência Social, acrescentando-lhe ou lhe modificando os seguintes §§:

“§10. O fator previdenciário não será aplicado quando: I – o total resultante da soma da idade do segurado, considerada na data do requerimento da aposentadoria, com o respectivo tempo de contribuição, desde que este não seja inferior a trinta e cinco anos, se homem, e a trinta anos, se mulher, for igual ou superior a noventa e cinco anos, se homem, e a oitenta e cinco anos, se mulher, somando-se as frações de tempo e idade; ou II – o segurado for pessoa com deficiência.

§11. É garantido ao segurado que optar por permanecer em atividade, se mais vantajoso, o direito ao cálculo do salário de benefício com base na expectativa de sobrevida presente na tábua de mortalidade vigente na data de cumprimento dos requisitos necessários à aposentadoria por tempo de contribuição, considerando se sua idade e tempo de contribuição no momento do requerimento do benefício. (NR)

§12. Para efeito de aplicação da fórmula de que trata o §10, o tempo de contribuição do professor e da professora que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio será acrescido de cinco anos”.

De acordo com a alteração aprovada pela Câmara Federal, para que não sofram os nefastos efeitos do FP em seus proventos de aposentadoria, os segurados terão de comprovar, no mínimo: a mulher, 30 anos de contribuição e 55 de idade, e o homem, 60 anos de idade e 35 de contribuição.

Se a idade da mulher for de 60 anos e o tempo de contribuição de 25, e, se homem, 65 e 30, respectivamente, a nova regra não será aplicada, isto é, continuarão a sofrer a incidência do FP.

Assim o é porque a nova regra não resulta, pura e simplesmente, da soma da idade com o tempo de contribuição; ela exige o tempo mínimo de contribuição de 30 anos para e a mulher, e 35, para o homem.

Para comprovar a assertiva de que a nova regra, para os(as) professores(as) é inferior ao que é assegurado pelo Art. 40, § 5º, da CF, basta que se diga que,  por esta, a professora com 50 anos e idade e 25 de contribuição e o professor, respectivamente, com 55 e 30 podem aposentar-se; já, por aquela, serão necessários: 55 de idade e 30 de contribuição, ou 50 de idade e 35 de contribuição, para a mulher, e 60 anos de idade e 30 de contribuição, ou 55 anos de idade e 40 de contribuição, para o homem.

É  bem de ver-se que a o acréscimo de cinco anos, no tempo de contribuição, para os(as) professores (as), não lhes retira o prejuízo; para isto, os seus fatores teriam de ser, respectivamente, 80 e 90, e não 85 e 95, como foram aprovados.

Vale ressaltar, ainda, que o ínfimo benefício previsto no § 11 da emenda do deputado Arnaldo Faria de Sá – como consolo ao segurado que adquire o direito de se aposentar, mas que opta por não o fazer – de, em caso que tais, tomar como expectativa de vida a da época em que o direito fora adquirido, e não a do momento do requerimento de aposentadoria, a rigor, não compensa.

O melhor que o segurado pode fazer, quando adquire o direito à aposentadoria voluntária é requerê-lo, mesmo sofrendo as consequências do FP; a espera da neutralidade deste não vale a pena, pois pode ser de dez ou mais anos; quem tiver de esperar dez anos para não sofrer a incidência maléfica do FP, perderá 130 meses de proventos de aposentadoria – isso porque os aposentados também recebem 13º. Se o valor for de um salário mínimo – menor valor de qualquer aposentadoria -, perderá R$ 102.440, tomando-se o salário de R$ 788, valor atual.

No que tange à comentada mitigação do FP, ainda que ela esteja longe de representar o completo afastamento deste monstro, todos(as) os(as) segurados(as) do RGPS devem mobilizar-se em prol de sua ratificação no Senado e pela sanção presidencial, pois ela representa um passo importante neste sentido.

*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee

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