Antecipação do calendário do golpe final foi acertada em churrasco na casa de Mendes
Nos bastidores do Planalto, corre a notícia que o responsável por acelerar o julgamento do impeachment da presidenta Dilma é o grande beneficiário, Michel Temer. Após conchavos com aliados, ele agiu para que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, mudasse a data o julgamento do impeachment para dia 25 ou 26 deste mês. O julgamento estava marcado para ser começar dia 29 e deveria ser concluído nos primeiros dias de setembro. O calendário havia sido confirmado por meio de nota divulgada sábado (30) passado pela assessoria de imprensa de Lewandowski.
Usando a desculpa de que queria ir ao G20, na China, como chefe de estado, Temer entrou em campo, com diversas reuniões e jantares na calada da noite com seus aliados, que passaram a defender a antecipação do calendário.
Mas há também quem diga que a pressa de Temer tem outros fatores. Hoje, nada é visto como maior risco para o governo interino do que Eduardo Cunha. Frequentador assíduo do Palácio do Jaburu nos últimos anos, Cunha está vendo o cerco se fechar tanto no Judiciário quanto na Câmara. Mesmo os aliados íntimos de Temer reconhecem que uma eventual declaração dele contra o interino ou integrantes do governo interino tornaria o cenário político absolutamente incerto. Como cedo ou tarde Cunha será fulminado, bateu pressa em Temer e em todos aqueles que tiveram campanhas eleitorais patrocinadas por Cunha.
Na noite de segunda- feira (1º), Temer, com os senadores peemedebistas Renan Calheiros (AL), Romero Jucá (RR), Eunício Oliveira (CE), e os ministros do partido Eliseu Padilha (Casa Civil) e Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo), com pecuaristas, foram a um churrasco na residência do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes. O churrasco foi organizado pelo ministro interino Blairo Maggi (Agricultura) e produtores de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul – terra de Gilmar Mendes. “Até cheguei depois dele (Temer) porque tinha sessão no TSE” , disse Gilmar Mendes a O Globo, confirmando sua presença no churrasco golpista.
Para não ficar evidente a conspiração (ou a comemoração antecipada da concretização do impeachment ), os convidados falaram em comemoração da abertura de mercados para a carne bovina brasileira. Mentiram. E a imprensa compactuou com a mentira.
Em 2015, o site Portal Brasil deu destaque a notícia: “Brasil exportará mais de 100 mil toneladas de carne bovina para EUA”:
“O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês) publicou, no dia 30 de junho de 2015, comunicado oficial em que reconheceu o status sanitário do rebanho bovino brasileiro, o Final Rule, necessário para a importação de carne in natura do Brasil.A liberação anunciada pelo governo norte-americano encerra uma negociação que já durava mais de 15 anos entre os dois países. Com a decisão dos Estados Unidos, abre-se um mercado potencial de pelo menos 100 mil toneladas por ano para os frigoríficos nacionais. A decisão foi tomada durante visita da presidenta da República, Dilma Rousseff, aos Estados Unidos. A ministra Kátia Abreu integra a missão brasileira.”
Na churrascada, ficou acertado de Renan conversar com Lewandowski para antecipar a data do golpe. Em troca, Temer nomeará para a pasta de ministro do Turismo um apadrinhado de Renan, o deputado alagoano peemedebista Marx Beltrão, réu no STF em processo por falsidade ideológica e fraude. A denúncia é de que, quando foi prefeito de Coruripe (AL), Beltrão teria apresentado ao Ministério da Previdência Social comprovantes de repasse e recolhimento contendo informações falsas.
Ontem (3), a imprensa noticiou que Lewandowski deu margem para que o julgamento tivesse início ainda neste mês, provavelmente no dia 25, conforme pediu Temer. Além disso, o presidente do STF definiu que a acusação e a defesa só poderão ter cinco testemunhas no julgamento, sendo que os advogados de Dilma queriam um número maior de testemunhas. Lewandowski também tem interesse de encerrar o processo antes de deixar a presidência do STF, em meados de setembro.
A antecipação do calendário do impeachment foi acertada em um churrasco na casa de Gilmar Mendes. Logo ele, que em 2008, lançou o código de ética para magistrados.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do qual Gilmar Mendes era presidente, responsável pelo controle externo do Judiciário, enviou em 2008, aos magistrados de todo o país o código de ética da categoria. Uma das recomendações aos juízes é para que recusem presentes ou vantagens por parte de pessoas que aguardam decisão judicial, para garantir a independência do profissional.
Sem mencionar valores dos mimos, o código diz que eles não devem ser aceitos de empresas privadas, pessoas físicas ou ente públic (o documento foi aprovado na 68ª Sessão Ordinária do Conselho Nacional de Justiça, do dia 6 de agosto de 2008, nos autos do Processo nº 200820000007337).
O churrasco oferecido por produtores de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, está valendo?
O texto pede que o juiz seja discreto, e não alguém com queda pelos holofotes: “O magistrado deve evitar comportamentos que impliquem a busca injustificada e desmesurada por reconhecimento social, mormente a autopromoção em publicação de qualquer natureza”. Coisas que Gilmar Mendes faz melhor que ninguém, aconselha “os outros” a não seguir seu exemplo.
Em um parágrafo do código, Gilmar Mendes diz: “A participação político-partidária do magistrado é proibida”…No entanto, na noite do sábado 28 de maio, Temer recebeu Mendes no Palácio do Jaburu.
Gilmar Mendes é relator no TSE do processo que analisa as contas da campanha da chapa da presidenta Dilma e de Temer. Pois é. A mídia domesticada partidária acha normal encontros de Temer e Gilmar Mendes, sendo que um é o juiz e o outro é investigado.
Gilmar Mendes também ocupa a presidência da Segunda Turma do STF, que é responsável pelo julgamento da maioria dos inquéritos que investigam a participação de políticos no esquema investigado pela Operação Lava Jato. A maioria dos que estavam no churrascão boca-livre é investigada na Lava Jato.
Advogado-Geral da União nos últimos anos do segundo mandato do tucano Fernando Henrique Cardoso, Mendes é um frequente crítico do PT e das gestões do partido no governo federal. Já viajou para Portugal para assistir palestra com o senador Aécio Neves (PSDB-MG). De volta, suspendeu as investigações contra o tucano e devolveu o processo para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Pressionado,voltou atrás e autorizou a continuação de inquérito.
É possível que Gilmar Mendes estivesse delirando quando criou o tal código de ética. As inconsequentes entrevistas dele à imprensa, o carnaval patrocinado por ele em torno de questões políticas quando se trata de adversários do PSDB, mostram sua cor partidária.
Gilmar Mendes diz em seu manual que o “juiz deve ser discreto”. O conselho não condiz com sua conduta de pautador da mídia.
A impressão que o ministro deixa é de que há uma atuação política de sua parte, de uma ideologização e partidarização que o classificam como líder da oposição porque sugere que, por trás de suas pronunciações feitas sistematicamente, está uma partidarização, o que, enfim, explicaria e justificaria seus pontos de vista.
Basta lembrar que, para conseguir ter sua indicação aprovada no Senado Federal, Gilmar Mendes precisou contar com uma mobilização tucana: registros do Senado mostram que a base de apoio ao governo tucano de FHC se mobilizou para garantir aprovação do de Mendes para o cargo. Teve 15 votos contrários à sua efetivação, o triplo do segundo candidato ao posto com maior rejeição, na época, o então ministro Eros Grau.