Cunha ameaça deputados: “Julgar sabendo que amanhã serão julgados”
Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que deve ser julgado nesta segunda-feira (12) pelo plenário da Câmara dos Deputados, disse considerar “absurdo” ter o mandato cassado sob a acusação de mentir. “Ser cassado sob acusação de mentir? Como se todo mundo só falasse a verdade?”, disse ele.
Cunha pede aos parlamentares que deixem o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir sobre o seu julgamento e que não cassem o seu mandato. “Se menti ou não menti, será resolvido quando o Supremo decidir [o caso]. Se for condenado, terei mentido. Se não for, não terei”, afirmou ele, não negando o fato de ter mentido sobre a existência de cinco contas na Suíça encontradas pelas investigações da Operação Lava Jato, que responde como réu no processo.
Aproveitou para advertir os deputados. Disse que eles precisam “julgar sabendo que amanhã serão julgados”. E fez questão de lembrar que cerca de 160 deputados são alvo de investigações. “Falam que fiz ameaça quando disse que mais de 160 parlamentares estão sob investigação, com inquérito, processo. Se eles forem julgados pelo texto da acusação, não vai sobrar ninguém”, disse.
Quando questionado sobre o processo de julgamento do impeachment no Senado que consumou o golpe contra o mandato da presidenta Dilma Rousseff iniciado por ele na Câmara, não mencionou os tais “crimes de responsabilidade” que ele disse haver para admitir a abertura do processo. Falou somente sobre as acusações contra o PT que tratam sobre doações de campanha como se sobre ele não pesassem as mesmas acusações com o agravante de que ele é réu, com direito ao flagrante de cinco contas não declaradas na Suíça.
“Por mais que ela queira dizer que não teve nenhum crime, o crime de caixa 2 da campanha dela vai ter a consequência da cassação da chapa no TSE. Não sei se vai incluir o [então] vice, essa é uma decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Mas, do foi apresentado ali, não tenho dúvida que vai caminhar para a cassação”, disse Cunha.
Cunha demonstra na entrevista que não está otimista quanto ao resultado da votação desta segunda. “Me punir passou a ser uma demanda. Então, como é uma demanda estão discutindo a dosimetria da minha punição (risos)”, ironizou.
Disse ainda que não se sente abandonado pelo seu partido, o PMDB, mas salientou que não se sente “nem amparado”.
Sobre o seu parceiro no golpe, Cunha admite que Temer vive uma crise de representatividade e que sua agenda de retrocessos não será aceita pelos 54 milhões de eleitores que votaram em Dilma sob outra plataforma de governo.
“Há a sensação de que ele fica refém, porque ele entrega a política e o governo para aqueles que foram a oposição, que perderam a eleição”, disse Cunha, citando o PSDB e DEM, do candidato derrotado Aécio Neves. “Se você quer legitimar o poder, tem que legitimar o poder eleito pelos 54 milhões. Quando você quer fazer o programa do PSDB e do DEM, passa a impressão de que quem está governando é o PSDB e o DEM. De uma certa forma, está trazendo para si a falta de representatividade”, completou ele, afirmando que Temer é refém dos tucanos.
Apesar de dizer por vezes que Temer é “legítimo” porque foi eleito na chapa que elegeu Dilma, Cunha afirma: “Não dá para se comportar como se tivesse se ganho uma eleição, com um programa que não foi discutido e apresentado à sociedade”.
Cunha considera que foi um erro de estratégia política ter rompido oficialmente com o governo da presidenta Dilma, escancarando que preferiria ter feito o jogo duplo, atuando nos bastidores contra o governo, como já vinha fazendo.
“O confronto exagerado que estabeleci [com Rodrigo Janot] acabou chamando uma reação corporativa do Ministério Público. E, talvez, eu devesse ter ignorado o governo, não ter partido para o rompimento. Estava convencido de que havia articulações para me constranger. O problema é que eu poderia ter continuado com a minha certeza e não ter reagido como reagi”, afirmou.
Disse que, caso seja cassado, pretende escrever um livro. “Vou escrever com todos os detalhes tudo o que aconteceu dentro desse processo do qual participei. Tenho uma boa memória, né? Tenho ele rascunhado dentro da minha cabeça. Pretendo ter ele pronto até o fim desse ano. Acho que, talvez, o ponto de partida seja as manifestações de 2013. Tudo começa ali”, disse.
E completou: “Não espero perder o mandato mas, se acontecer, o livro vai sair mas rápido. Vou ter mais tempo”.