Direitos suprimidos, reduzidos e armadilhas da reforma trabalhista
O consultor jurídico da Contee, José Geraldo de Santana Oliveira, preparou uma análise objetiva e detalhada sobre os direitos suprimidos, reduzidos e as armadilhas impostas pela reforma trabalhista, lembrando que é essencial a união dos trabalhadores e trabalhadoras para impedir a implementação desse retrocesso. Confira:
Por José Geraldo de Santana Oliveira*
Caríssimos(as) professores(as), auxiliares administrativos e de serviços gerais,
com os nossos cordiais cumprimentos, queremos convidá-los(as) para refletirem conosco sobre a reforma trabalhista, aprovada pela Lei N. 13.467, de 13 de julho de 2017, que entrará em vigor em 13 de novembro próximo vindouro.
Os propagandistas dessa reforma (governo, maioria do Congresso Nacional, imprensa, advogados de empresas, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho — TST e os chamados especialistas, que vendem as suas opiniões para os donos do capital) afirmam que ela modernizará as relações de trabalho, valorizará a negociação coletiva e não retirará nenhum direito dos trabalhadores.
Será que essas afirmações encontram eco na verdade? Vocês acreditam nelas? Nós não acreditamos; para nós, a reforma tem como objetivo único suprimir direitos e reduzir ao mais ínfimo patamar os que sobrarem.
Podemos assegurar-lhes que não estamos sozinhos. Pensam como nós: 17 ministros do TST, que assinaram manifesto contrário a ela, enumerando a redução de 25 direitos, desproteção de 23, além da redução da proteção da Justiça do Trabalho; a Associação Nacional dos Juízes Trabalhistas (Anamatra), que reúne mais 5 mil juízes; o Ministério Público do Trabalho (MPT); a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); e milhares de entidades sindicais de trabalhadores, centenas de advogados trabalhistas, autoridades políticas e científicas e juízes de direito comprometidos com o bem-estar e a justiça sociais.
Para lhes demonstrar o porquê de sermos contrários à comentada reforma, enumeramos, a seguir, os direitos que ela suprime ou reduz, bem como as armadilhas contra os trabalhadores, que foram nela inseridas, e, ainda, os entraves que cria para impedir e/ou dificultar o acesso deles à Justiça do Trabalho.
I Direitos suprimidos:
1 Cômputo na jornada de trabalho do tempo de deslocamento de casa para a empresa e vice-versa, em condução fornecida pelo empregador, para local de difícil acesso ou não servido regularmente por transporte público (horas in itinere).
2 Adicional noturno após as 5 horas da manhã, quando há prorrogação de jornada noturna.
3 Salário em dobro quando o trabalho recair em feriado, na jornada de 12×36 horas.
4 Intervalo de 15 minutos, antes do início de horas extras (sobrejornada), para as mulheres.
5 Garantia de que as gestantes não podem trabalhar em atividades insalubres.
6 Integração ao contrato de trabalho, ainda que habituais, da ajuda de custo, diária de viagem, prêmios e abonos.
7 Equiparação salarial com quem trabalha na empresa há mais de quatro anos.
8 Garantia de promoção alternada, por antiguidade e merecimento, se a empresa possuir quadro de carreira.
9 Exigência de homologação de quadro de carreira pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
10 Ultratividade das normas coletivas (adesão definitiva aos contratos trabalho); ao final de vigência das convenções e acordos coletivos, todos os direitos nele previstos perdem eficácia, desaparecendo dos contratos de trabalho.
11 Assistência sindical (homologação) nas rescisões de contrato com duração superior a um ano; as rescisões, não importando o tempo do contrato, serão assinadas na empresa, sem a presença do sindicato.
12 Aplicação da norma mais favorável; os acordos coletivos, ainda que inferiores às convenções coletivas, prevalecerão sobre elas.
13 Integração na remuneração de gratificação de função, exceto se ela decorrer de lei.
14 Responsabilidade objetiva do empregador (que depende só do fato), na indenização por dano moral, que passa a depender exclusivamente de critérios subjetivos inalcançáveis.
15 Gratuidade da justiça para quem ganhar mais do que 40% do teto do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que é de R$ 5.531,31.
16 Isenção de custas para o trabalhador beneficiário da justiça gratuita que faltar imotivadamente à audiência.
17 Isenção de honorários periciais e de sucumbência (condenação) para os trabalhadores beneficiários da justiça gratuita que tiverem seus pedidos julgados parcial ou totalmente improcedentes.
18 Garantia de indenização por uso da imagem; a empresa poderá veicular qualquer propaganda nos uniformes de seus trabalhadores sem lhes pagar nada por isso.
19 Auxílio-alimentação e as diárias para viagem deixam de ter natureza salarial.
20 Poder da Justiça do Trabalho para anular convenções e acordos coletivos prejudiciais aos trabalhadores, que ficam expressamente autorizados e insuscetíveis de discussão.
21 Aplicação dos princípios da primazia da realidade, da condição mais benéfica, da norma mais favorável, em caso de dúvida, a decisão deve ser pró-trabalhador e aptidão da prova (a prova deve ser produzida pela parte que dispuser de melhores condições para fazê-lo).
II Direitos reduzidos:
1 Jornada de 8 horas, podendo ser de 10, ou de 12×36, respeitado o limite de 44 por semana, inclusive nas atividades insalubres, a critério da empresa.
2 Intervalo para repouso e alimentação, na jornada de 12×36, que poderá ser substituído por indenização, a critério da empresa.
3 Férias de 30 dias ininterruptos; podem ser fracionadas em três períodos, sendo um de 14 dias e os outros dois de cinco, no mínimo, inclusive dos menores de 18 e maiores de 50 anos, a critério da empresa.
4 Remuneração integral do intervalo para repouso e alimentação que for concedido com tempo inferior a uma hora; somente o tempo suprimido é que será indenizado.
5 Equiparação salarial somente será possível com empregados do mesmo estabelecimento.
6 Prazo para pagamento de verbas rescisórias passa a ser de dez dias, após o fim do aviso prévio, quando cumprido, ou, no caso de afastamento sem cumprimento deste.
III Direitos que podem ser reduzidos, individualmente, sem a participação dos sindicatos:
1 Jornada de 10 horas.
2 Banco de horas.
3 Compensação de horas.
4 Jornada de 12×36, inclusive sem intervalo de descanso e alimentação; hoje, só é possível por instrumento coletivo — Súmula 444 do TST.
5 Teletrabalho.
6 Parcelamento das férias, em até três períodos, sendo um de 14 dias e os demais de cinco dias, no mínimo — hoje, somente em casos excepcionais, podem ser parceladas em dois períodos, não podendo nenhum deles ser inferior a dez dias — Art. 134, § 1º, da CLT.
7 Horário de descanso para amamentação de filho de até seis meses idade.
8 Contrato de trabalho autônomo, com ou sem exclusividade.
9 Contrato de trabalho intermitente.
10 Exclusão de todos os direitos legais e convencionais e de acesso à Justiça do Trabalho, para os empregados com diploma de curso superior e remuneração superior a duas vezes o teto de Regime Geral de Previdência Social (RGPS), atualmente, de R$ 5.531,31.
IV Direitos que podem ser reduzidos por convenção ou acordo coletivo:
1 Jornada de trabalho.
2 Banco de horas anual.
3 Intervalo intrajornada, que pode ser de apenas 30 minutos.
4 Adesão a programa de seguro-desemprego.
5 Plano de cargos, salários e funções. Regulamento empresarial.
6 Representante dos trabalhadores no local de trabalho.
7 Teletrabalho, regime de sobreaviso e trabalho intermitente.
8 Remuneração por produtividade. Modalidade registro de jornada de trabalho.
9 Troca do dia de feriados.
10 Enquadramento do grau de insalubridade.
11 Prorrogação da jornada em ambientes insalubres.
12 Prêmios de incentivo me bens ou serviço.
13 Participação nos lucros.
V Armadilhas contra os trabalhadores:
1 Rescisão de contrato de trabalho por acordo, por meio da qual o trabalhador perde metade do aviso prévio e da multa de 40% do FGTS, o seguro-desemprego e somente poderá sacar 80% do total do FGTS depositado ao longo do contrato.
2 Quitação anual de direitos trabalhistas, por meio de simples termo, a ser homologado pelo sindicato competente, ou pela Justiça do Trabalho, se este recusar-se a fazê-lo. O empregado que firmar termo dessa natureza nunca mais poderá reclamar, perante a Justiça do Trabalho, nenhum dos direitos por ele supostamente quitados.
3 Contrato de trabalho temporário, com duração de até nove meses, sem direito a aviso prévio, multa de 40% do FGTS e seguro-desemprego.
4 Contrato de trabalho autônomo, com ou sem exclusividade, sem direito a CTPS assinada, aviso prévio, férias, 13º salário e FGTS.
5 Contrato de trabalho intermitente — que, como disse o ex-ministro do Trabalho e do TST, Almir Pazzianotto, nada mais é do que a legalização do bico; nele, não há jornada estabelecida, e o trabalhador somente recebe pelas horas trabalhadas, estabelecidas a critério da empresa, se e quando lhe convier; com a incidência de férias, 13º salário e repouso semanal remunerado — todos proporcionais —, FGTS e contribuição previdenciária. Tem de ser celebrado por escrito e conter o valor da hora trabalhada, que não pode ser inferior ao salário mínimo-hora, hoje, de R$ 4,26.
Por esta modalidade de contrato, o trabalhador, mesmo que o firme com várias empresas, poderá ficar sem trabalhar dias, semanas ou meses, pois seu trabalho dependerá da vontade do empregador, que poderá chamá-lo se e quando lhe interessar, ou nunca o chamar.
6 Comissão de representantes, composta por trabalhadores que não precisam ser sindicalizados, eleitos em eleições organizadas e realizadas pela empresa, para substituir as funções sindicais.
Caríssimos(as), após a leitura dessa brevíssima síntese da reforma trabalhista, será que ainda restou alguma dúvida sobre os seus objetivos?
Acreditamos que não? Mas, caso haja, venham dialogar conosco.
Venham juntar-se a nós; somente unidos, teremos condições de impedir que essa reforma destrua direitos construídos ao longo de séculos.
*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee