Depois da UnB, outras universidades lançam disciplina sobre o golpe de 2016
A reação negativa do ministro da Educação, Mendonça Filho, à oferta de disciplina sobre o golpe de 2016 na Universidade de Brasília (UnB), provocou desdobramentos em outras instituições de ensino. Segundo apurou o Brasil de Fato, já estão confirmadas matérias sobre o mesmo tema nas universidades Federais da Bahia e do Amazonas, além das Estaduais da Paraíba e de Campinas.
O Departamento de Ciência Política da Unicamp, por exemplo, deverá iniciar em março curso com o mesmo nome do originalmente proposto pelo professor Luís Felipe Miguel, da UnB – “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”.
De acordo com o chefe do Departamento, Wagner Romão, a iniciativa é uma forma de demonstrar solidariedade ao professor Luís Felipe Miguel, responsável pela matéria que será ministrada na UnB. Ele tem sido fortemente atacado por grupos conservadores. Além disso, Romão assinala que a oferta do curso traduz uma tentativa de demarcar o papel da universidade diante do contexto político do país.
“Não se trata de um posicionamento político-partidário, como a gente tem ouvido falar, mas de uma defesa da liberdade e da autonomia das universidades em promover conhecimento sobre a nossa realidade”, acrescenta.
Segundo ele, o curso será aberto a todos os interessados e já conta com pelo menos 30 aulas previstas, que serão conduzidas por professores de diferentes áreas. Ele destaca o fato de pessoas de fora da comunidade acadêmica terem manifestado interesse na formação, inclusive com pedidos de transmissão on-line das aulas, para que elas possam ser acompanhadas em outros estados.
“Quando há um fato dessa forma e quando a própria universidade e a construção do livre conhecimento se veem atacadas, isso se agrega exatamente a essa carência de informação mais bem fundamentada sobre o que aconteceu no país”, afirma.
Outro curso com o mesmo título e o mesmo teor também será ofertado pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) em abril, por meio de uma articulação que conta ainda com docentes de outras três instituições.
De acordo com o professor Agassiz Almeida Filho, que está à frente do processo, a ideia é, além de destacar o papel do meio acadêmico nas reflexões sobre o país, avançar além da perspectiva estritamente política que domina o debate nacional.
“Nós entendemos que este era o momento de começar a discutir o golpe desde o ponto de vista teórico. Político [também], mas numa perspectiva da filosofia política, da ciência política”, explica.
A Universidade Federal da Bahia (UFBA) é outro exemplo de instituição que será palco de iniciativa semelhante. Ao todo, 22 docentes de cursos como História, Sociologia, Educação e Direito se uniram para ofertar uma disciplina sobre o tema. O professor de História Carlos Zakarias explica que a iniciativa veio no embalo da repercussão da conduta do ministro da Educação e que está relacionada a um “sentimento de indignação” do grupo.
“É em defesa da universidade, da liberdade de cátedra, do exercício livre das nossas inteligências e contra este governo, que, além de retirar recursos, de estrangular a ciência, a tecnologia e a educação do país, agora pretende calar a voz dos professores”, critica.
A iniciativa dos professores provocou diversas reações nas redes sociais. Um post do professor Zakarias no Facebook, por exemplo, chegou a receber mais de 2 mil comentários, a maioria deles com conteúdo agressivo.
“Isso nos diz de que estamos trilhando o caminho certo e de que é mais do que urgente e necessário discutir o futuro da democracia do país”, considera.
Governo
As reações do ministro Mendonça Filho foram manifestadas na semana passada, por meio de seu perfil no Twitter. Ele disse que iria cobrar da Advocacia-Geral da União (AGU), do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Ministério Público Federal (MPF) que apurassem sobre a conduta dos responsáveis pela criação da disciplina na UnB, sinalizando que poderia se tratar de um caso de improbidade administrativa.
Para o ministro, a universidade estaria sendo usada para “fazer proselitismo político e ideológico”. A reportagem tentou conversar com o professor Luís Felipe Miguel, mas ele informou que não está falando à imprensa para não alimentar o que considera uma “falsa polêmica gerada pela ação no Ministério da Educação (MEC)”.