A “cegueira branca” que anuvia o país

Por Adércia Hostin dos Santos*

Vivemos em Estado de Exceção desde o golpe de 2016, que destituiu a presidenta Dilma Rousseff, por meio do processo duvidoso de impeachment, além da prisão política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, expondo a parcialidade do Judiciário e as práticas antidemocráticas de promotores e juízes. A prisão política de Lula insere o país em um Estado que fere os direitos constitucionais, depois de duas décadas da Constituição de 1988.

Nesse movimento, que colocou em xeque a democracia, grande parte da sociedade foi movida por um discurso falso de anticorrupção reduzido ao antipetismo, que, na prática, teve o apoio segmentado e pautado em um projeto de poder, favorecendo mais ainda a concentração econômica e a política elitista. Setores da sociedade, como a grande mídia, defenderam a ruptura do crescimento econômico, com o fim da redistribuição de renda do país. Ruptura de um crescimento pelo qual o país vinha passando com os 14 anos de um governo progressista, com legitimidade dos trabalhadores para avançar nos processos de melhorias de condições de vida, sobretudo dos menos favorecidos.

Importante destacar que, no atual governo, não haverá investimento na educação, sobretudo de viés emancipador, assim como não haverá na saúde, na habitação e na assistência. Um governo sectário, que é omisso com a população marginalizada — negros, índios, quilombolas, do campo e das florestas, LGBT etc.

A redução drástica e — por que não? — trágica dos investimentos em políticas públicas dá fim ao projeto de redistribuição de renda que estava em curso por meio da ampliação da renda e do emprego. A falta de investimentos em educação coloca-nos novamente na marginalização de um país periférico sem investimentos em pesquisa e extensão.

Trabalhadores e suas entidades de representação estão sendo diariamente alvos dos ataques mais perversos, entre os quais a reforma trabalhista, a reforma previdenciária em curso, a reforma sindical em vias de entrar em pauta logo depois que a previdenciária for aprovada.

Vivemos em um país excludente que corta investimentos na área de educação, inviabilizando o funcionamento de universidades federais e institutos. Um governo que aprova uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) conteudista e que inviabiliza a administração e a gestão de instituições de ensino. Um projeto que ignora a importância de um Sistema Nacional de Educação de caráter de colaboração entre municípios, estados e União. Ao contrário, o atual governo defende uma reforma de ensino médio apequenada e voltada à privatização, nos moldes do que acontece no ensino superior, além da falácia da meritocracia e do formato de avaliação como o Ideb, sem medir a realidade de cada família inserida em seu contexto social, entre tantas outras mazelas. Por isso, precisamos sempre reforçar a importância da defesa incondicional de uma educação pública, gratuita e de gestão pública, laica e socialmente referenciada.

A reforma necessária é estrutural e afeta todos os âmbitos: educação, saúde, segurança, cultura etc. Precisamos de políticas de combate ao racismo em suas várias modalidades, à LGBTfobia e a invisibilização dessa população, ao machismo e sua capacidade perversa de silenciamento nas sutis estruturas de reprodução na sociedade.

Fazendo uma analogia com a obra “Ensaio sobre a cegueira”, do escritor português José Saramago, nossa sociedade vive uma cegueira social e os poucos que enxergam não podem desistir de lutar, de ajudar a evitar a barbárie. Assim sendo, cá estamos nós, envoltos da “cegueira branca” de muitos que dividem o espaço diariamente conosco; essa cegueira que representa o egoísmo, o medo, a covardia, a raiva e outros sentimentos que ferem a condição humana, conduzindo-a à perdição.

Mesmo diante de uma realidade desesperadora, cabe a cada um de nós uma autorreflexão: estamos enxergando ou já fomos tomados pela “cegueira branca”?
Convido-o/a a seguir firme e forte nos seus propósitos!

“Não passarão”.

*Adércia Hostin dos Santos é coordenadora da Secretaria de Assuntos Educacionais da Contee e presidenta do Sinpro Itajaí e Região

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