A doce poesia de Cora Coralina: O tempo do sonho é o tempo da vida…

Dia 20 de agosto, dia de Cora Coralina. A poeta completaria esta semana 135 anos. Cora virou estrela, flor, poesia em 10 de abril de 1985. Cora está no céu. Cora está na terra. Ela é onipresente. A Aninha de Goiás é imortal, segue mexendo o seu tacho de doces e ideias na “Casa Velha da Ponte”, continua encantando as pessoas com os seus versos e contos.

A menina Cora começou escrever bem cedo, aos 14 anos, mas só conseguiu publicar o seu primeiro livro quando tinha 75, demonstrando que o tempo do sonho é o tempo da vida. Nunca é tarde para se realizar grandes feitos e lutar pelos ideais.

Cora escreveu com a alma e o coração, transformou o cotidiano em arte sublime e se tornou uma das vozes femininas mais delicadas e poderosas da literatura nacional, resgatando a beleza das coisas pequenas, a sabedoria das pessoas simples e a grandiosidade dos sentimentos mais puros.

Soube cultivar de maneira bonita e singela sua rica vivência e seu profundo amor pela terra natal. Em sua obra, encontramos palavras de alento que falam sobre o dia a dia, a luta e a esperança. Seus escritos são sorrisos e abraços acolhedores.

Que tal provar os aromas e sabores de Aninha neste fim de semana? A Contee compartilha algumas guloseimas literárias dessa grande escritora do século XX.

LIVROS

1- Poemas dos Becos de Goiás e Outras Versões (1965)

Esta é a coletânea que deu visibilidade nacional a Cora Coralina. A obra é uma expressão poética da vida cotidiana e das tradições do interior de Goiás. A autora usa uma linguagem simples, mas rica em metáforas e imagens, para explorar temas como a natureza, a vida rural e as experiências pessoais. O livro é conhecido por capturar a essência da cultura goiana e o espírito resiliente das pessoas do campo.

2- Estórias da Casa Velha (1980)

“Estórias da Casa Velha” é uma coletânea de contos que explora a vida e os personagens de uma antiga casa em Goiás. Com uma prosa que mistura o real e o imaginário, Cora Coralina oferece uma visão detalhada da vida social e das lendas locais. Os contos revelam a sabedoria popular e a riqueza cultural da região, enquanto a autora destaca a importância da memória e da tradição.

3- Vintém de cobre – Meias confissões de Aninha (1983)

Quase memórias, ou meias confissões como a autora prefere, Vintém de cobre reúne poemas ricos de experiência humana, escritos em tom simples e comunicativo, no lirismo quase de toada sertaneja, peculiar a Cora Coralina.

POEMAS

1

O Cântico da Terra

Eu sou a terra, eu sou a vida.
Do meu barro primeiro veio o homem.
De mim veio a mulher e veio o amor.
Veio a árvore, veio a fonte.
Vem o fruto e vem a flor.

Eu sou a fonte original de toda vida.
Sou o chão que se prende à tua casa.
Sou a telha da coberta de teu lar.
A mina constante de teu poço.
Sou a espiga generosa de teu gado
e certeza tranqüila ao teu esforço.
Sou a razão de tua vida.
De mim vieste pela mão do Criador,
e a mim tu voltarás no fim da lida.
Só em mim acharás descanso e Paz.

Eu sou a grande Mãe Universal.
Tua filha, tua noiva e desposada.
A mulher e o ventre que fecundas.
Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.

A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu.
Teu arado, tua foice, teu machado.
O berço pequenino de teu filho.
O algodão de tua veste
e o pão de tua casa.

E um dia bem distante
a mim tu voltarás.
E no canteiro materno de meu seio
tranqüilo dormirás.

Plantemos a roça.
Lavremos a gleba.
Cuidemos do ninho,
do gado e da tulha.
Fartura teremos
e donos de sítio
felizes seremos.

2

Mulher da Vida

Mulher
da Vida, minha Irmã.
De todos os tempos.
De todos os povos.
De todas as latitudes.
Ela vem do fundo imemorial das idades e
carrega a carga pesada dos mais
torpes sinônimos,
apelidos e apodos:
Mulher da zona,
Mulher da rua,
Mulher perdida,
Mulher à-toa.
Mulher da Vida, minha irmã.
Pisadas, espezinhadas, ameaçadas.
Desprotegidas e exploradas.
Ignoradas da Lei, da Justiça e do Direito.
Necessárias fisiologicamente.
Indestrutíveis.
Sobreviventes…

3

Aninha e suas pedras

Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.

Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.

Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.

Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.

PASSEIOS

O CAMINHO DE CORA CORALINA

Uma das formas interessantes para se conectar com a poeta é fazendo o “Caminho de Cora” – um percurso de 300 quilômetros que reúne reservas naturais, trilhas, cachoeiras e passeio pelas cidades históricas.

Idealizado em 2013, o Caminho de Cora passa pelas cidades de Corumbá de Goiás, Pirenópolis, Cocalzinho, São Francisco de Goiás, Jaraguá, Itaguari, Itaberaí e cidade de Goiás. Para a professora e escritora Kátia Espíndola, refazer o trajeto é uma forma de buscar inspiração.

MUSEU CORA CORALINA

Visite o casarão onde Cora Coralina passou a infância e para onde retornou na velhice. A Casa Velha da Ponte, na cidade de Goiás Velho, tornou-se o Museu Casa de Cora Coralina, cujo acervo abriga manuscritos, cartas, objetos pessoais, fotos, mobiliário, utensílios domésticos, livros, entre outros itens da consagrada escritora.

Por Romênia Mariani

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