As perversidades da ‘reforma’ da Previdência e os impactos nefastos para os professores da rede particular
Por Rodrigo de Paula*
Todos sabem as condições de trabalho ainda extremamente adversas dos professores brasileiros, especialmente os da rede privada. De modo geral, cumprem jornadas de trabalho exaustivas e, no caso das mulheres, são submetidas invariavelmente a duplas ou triplas jornadas. Como se isso não bastasse, o governo Temer acaba de anunciar uma “reforma da Previdência” cujo impacto na vida e no trabalho de nossos professores e, principalmente, professoras do ensino particular será brutal e desastroso.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/16, chegou ao Congresso Nacional no último dia 5 de dezembro de 2016. Trata-se, sem dúvida alguma, a mais radical proposta de “reforma” – para pior – da Previdência após a Constituição de 1988. As principais alterações no atual sistema são:
- Fixação da idade mínima de 65 para requerer aposentadoria e elevação do tempo mínimo de contribuição de 15 anos para 25;
- Criação de uma regra de transição, em tese, para não prejudicar quem está perto da Por ela, quem estiver com 50 anos ou mais (homens) e 45 anos ou mais (mulheres) poderá se aposentar pelas regras atuais, mas terão que pagar um pedágio de 50% sobre o tempo que faltava para a aposentadoria (se for um ano, por exemplo, terá de trabalhar um ano e meio);
- Extinção da fórmula 85/95, que duraria até 2026. Com isso, a aposentadoria exclusivamente por tempo de contribuição no setor privado vai acabar. Valerá a idade mínima de 65 anos, mais um tempo mínimo de contribuição de 25;
- Unificação do regime para homens e mulheres. Hoje, as mulheres podem se aposentar antes dos homens, com cinco anos a menos. A proposta unifica em 65 anos a idade mínima para os dois sexos. A nova regra afeta principalmente mulheres com até 45 anos. Acima desta idade, valerá a regra de transição. Assim, a igualdade ocorrerá gradualmente, ao longo de 20 anos;
- Reformação da aposentadoria especial de professores do ensino fundamental e médio (os de universidades já foram equiparados aos demais servidores) entre outras aposentadorias Para servidores com menos de 50 anos (homem) e 45 anos (mulher), valerão as novas regras, com idade mínima de 65 anos. Quem estiver acima, entra na transição;
- Alteração das regras (para pior) das pensões, das aposentadorias por invalidez, dos benefícios acumulados, bem como dos critérios de paridade e integralidade para concessão dos benefícios.
Nós, professores da rede particular, que, de modo geral, começamos a trabalhar muito cedo – comumente aos 18 anos de idade, seremos duramente penalizados por essa proposta, que chega a ser mais perversa ainda com as mulheres professoras. Como não integramos o regime público, é fácil prever que a rede particular, para evitar custos, promoverá demissões em massa de nossos professores e professoras quando eles começarem a envelhecer. Um verdadeiro absurdo!
Pertencemos a uma categoria que lida com uma demanda grande de trabalho e, não raras vezes, nossos professores, em busca de uma vida mais digna, são obrigados a trabalhar em mais de uma escola e a se sujeitar a dois ou até três empregos para sustentar suas famílias, o que frequentemente compromete sua saúde e qualidade de vida.
De acordo com a Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem (Talis), realizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e coordenada no Brasil pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), publicada em 2014, o professor típico brasileiro é mulher (71%) e tem 39 anos de idade. O que mostra que nós professores estaremos entre os mais afetados.
Os professores brasileiros estão entre os que passam o maior número de horas por semana ensinando: 25 horas semanais, 6 horas a mais do que a média dos países da Talis. Essa realidade dos professores reduz e muito a média de idade dessa categoria. Se hoje com as regras atuais os professores do ensino básico usufruem muito pouco de suas aposentadorias, imaginem com as novas mudanças?
As justificativas para essa “reforma” não se sustentam. Alega-se um rombo na Previdência, um déficit que se aprofunda a cada ano, o fato de a população brasileira estar envelhecendo e, combinado a isso tudo, adicionam a redução da taxa de natalidade.
De acordo com a Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal – a ANFIP, a Previdência Social é parte integrante da Seguridade Social que é composta por um tripé formado pela Saúde, Assistência Social e Previdência. Em 2010, por exemplo, segundo a Associação, a Previdência Social teve um superávit de R$ 58 bilhões, e, nos últimos 5 anos, de R$ 100 bilhões por ano. A ANFIP destaca, ainda, que as contribuições dos trabalhadores vão para a Seguridade Social e não exclusivamente para a Previdência.
Além do mais, outras reformas, como a introdução do famigerado Fator Previdenciário, já foram realizadas pelos governos anteriores, desde FHC, sempre no sentido de aviltar os benefícios e dificultar o acesso às aposentadorias de toda natureza. Com essa proposta, teremos que trabalhar até a morte para nos aposentar. E nós, professores da rede particular, seremos ainda mais penalizadas pelas razões que expus anteriormente.
Países, como a Alemanha, que têm essa idade mínima para a aposentadoria (67 anos), os jovens trabalhadores começam a trabalhar entre 20 e 25 anos de idade, sendo alguns deles até próximo dos 30 anos, após concluírem um curso universitário. Realidade bem diversa da nossa, na qual começamos a trabalhar na adolescência, sendo alguns na infância em razão das profundas desigualdades sociais com as quais ainda convivemos.
Depois da pretendida aprovação da PEC 55 – a chamada “PEC da morte” – no Senado Federal, querem aprovar, sem uma discussão mais ampla na sociedade, essa nefasta “reforma” da Previdência. O objetivo, tanto com a PEC quanto com a mudança no sistema previdenciário, é um só: economizar para pagar as amortizações e juros de uma dívida pública que já compromete mais de um terço do Orçamento da República em detrimento das áreas essenciais e dos investimentos públicos.
Por todas essas razões, não podemos aceitar essa “reforma” e, mais do que isso, precisamos reagir para evitar que mais esse retrocesso seja perpetrado contra o povo brasileiro e, principalmente, contra nossa valorosa categoria. É fundamental unificar todo movimento sindical nesse sentido, pois o que está sob grave ameaça é o presente e, fundamentalmente, o futuro do Brasil.
* Rodrigo de Paula é professor, coordenador da Secretaria de Assuntos Institucionais da Contee, coordenador geral da Fetraeep e diretor jurídico do SIinproep-DF