Câmara dos Deputados aprova nova reforma do ensino médio

Para Contee, aprovação das 2.400 horas para formação básica é vitória, mas ainda há distorções que precisam ser superadas no Senado

A Câmara dos Deputados aprovou na noite de ontem (20) a nova reforma do ensino médio, que tem o objetivo de adequar as alternativas de formação dos estudantes à realidade das escolas. Depois de uma dura negociação, a principal conquista foi o aumento da carga horária da formação geral básica para 2.400 horas, somados os três anos do ensino médio, para estudantes que não optarem pelo ensino técnico.

Isso era o que constava no Projeto de Lei 5230/23, de autoria do Executivo. No entanto, o relator da proposta, deputado Mendonça Filho (União-PE) — que não poderia ter assumido a relatoria, uma vez que foi o autor, como ministro, da nefasta reforma do ensino médio de 2017 — havia tentado reduzi-la para 1.800 horas, mantendo o que havia sido estabelecido 7 anos atrás.

A carga horária total do ensino médio continua a ser de 3 mil horas nos três anos (5 horas em cada um dos 200 dias letivos anuais). Para completar a carga total nos três anos, esses estudantes terão de escolher uma área para aprofundar os estudos com as demais 600 horas, escolhendo um dos seguintes itinerários formativos:

– linguagens e suas tecnologias;

– matemática e suas tecnologias;

– ciências da natureza e suas tecnologias; ou

– ciências humanas e sociais aplicadas.

O ministro da Educação, Camilo Santana, que acompanhou a votação da proposta e disse que o diálogo garantiu a aprovação das 2.400 horas de formação geral básica, o que segundo ele, é a essência do projeto. “Garantimos a formação geral básica boa, retomando a carga horária, e também garantimos o ensino técnico profissionalizante, que é o que queremos avançar no Brasil”, destacou o ministro.

Distorções

No caso da formação técnica e profissional, a formação geral básica será de 1.800 horas. Outras 300 horas, a título de formação geral básica, poderão ser destinadas ao aprofundamento de estudos em disciplinas da BNCC (Base Nacional Comum Curricular) diretamente relacionadas à formação técnica profissional oferecida.

Como esses dois módulos totalizam 2.100 horas, outras 900 horas ficarão exclusivamente para as disciplinas do curso técnico escolhido pelo aluno quando ofertado pela escola, totalizando assim 3 mil horas.

Para a Contee, embora a aprovação das 2.400 horas para o ensino regular seja uma vitória, a flexibilização para o ensino técnico é uma distorção que precisa ser corrigida no Senado. Outro ponto ainda problemático, segundo a coordenadora da Secretaria-Geral da Confederação, Madalena Guasco Peixoto, é que o texto-base aprovado não deixou claro que as horas dos itinerários têm que necessariamente estar vinculadas às áreas de aprofundamento. Também não foi aprovado o ensino obrigatório de espanhol.

Ainda segundo o texto aprovado, o ensino médio será ofertado de forma presencial, mas será admitido, excepcionalmente, que ele seja mediado por tecnologia, na forma de regulamento elaborado com a participação dos sistemas estaduais e distrital de ensino.

Outra mudança em relação ao PL original do governo é que continua na lei a permissão para contratar profissionais de notório saber reconhecido pelos sistemas de ensino para ministrar conteúdos na educação profissional técnica de nível médio, mesmo que sua experiência tenha sido em corporações privadas. E esse é um problema contra o qual a Contee brada desde a reforma de 2017, tendo sido, inclusive, apontado pela Confederação como forma de desprofissionalização do magistério, denunciada na campanha “Apagar o professor é apagar o futuro”.

Itinerários

A Agência Câmara destacou outras questões do texto aprovado. Os sistemas de ensino deverão garantir que todas as escolas de ensino médio ofertem o aprofundamento integral de todas as áreas de conhecimento, exceto o ensino profissional, organizadas com, no mínimo, dois itinerários formativos de áreas diferentes.

Como os itinerários são formatados de acordo com o contexto local e as possibilidades dos sistemas de ensino, o estudante poderá optar por uma complementação com itinerários focados em duas áreas diferentes: matemática e ciências da natureza, por exemplo; ou linguagens e ciências humanas.

A montagem dos itinerários dependerá de diretrizes nacionais a serem fixadas pelo Ministério da Educação com a participação dos sistemas estaduais de ensino, reconhecidas as especificidades da educação indígena e quilombola.

Esses sistemas, por sua vez, deverão apoiar as escolas para a realização de programas e projetos destinados a orientar os estudantes no seu processo de escolha dos itinerários.

Carência de escolas

Do total de municípios brasileiros, 51% (2.831) possuem apenas uma escola pública de ensino médio, e a maior parte delas está em cidades com os menores níveis para o Indicador de Nível Socioeconômico do Inep.

Ainda segundo o MEC, em 2022, 48% das unidades federativas não haviam iniciado a implementação do novo ensino médio nas turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA), 15% declararam que não iniciaram nas turmas do ensino noturno e 22% não o fizeram em escolas indígenas.

Ensino técnico

Quanto ao ensino técnico, em vez de ele ter de ser previamente aprovado pelo Conselho Estadual de Educação, homologado pela Secretaria de Educação e certificado pelos sistemas de ensino, o novo texto prevê sua oferta por meio de cooperação técnica entre as secretarias estaduais de Educação e as instituições credenciadas de educação profissional, preferencialmente públicas.

Disciplinas

Em relação às disciplinas que o projeto original pretendia garantir na formação geral básica, o substitutivo de Mendonça Filho especifica que elas integrarão o ensino médio dentro da base comum curricular nas quatro áreas de conhecimento.

No entanto, o espanhol, como já criticado pela Contee, continuará a ser disciplina não obrigatória, que poderá ser ofertada como outra língua estrangeira preferencial no currículo, de acordo com a disponibilidade dos sistemas de ensino.

Propostas pedagógicas

O PL 5230/23 determina que as escolas deverão montar suas propostas pedagógicas considerando elementos como promoção de metodologias investigativas no processo de ensino e aprendizagem e conexão dos processos de ensino e aprendizagem com a vida comunitária e social.

Deverá haver ainda reconhecimento do trabalho e de seu caráter formativo e uma articulação entre os diferentes saberes a partir das áreas do conhecimento.

Aprendizagens e competências

Em regime excepcional, para fins de cumprimento das exigências curriculares do ensino médio em regime de tempo integral, os sistemas de ensino poderão reconhecer aprendizagens, competências e habilidades desenvolvidas pelos estudantes em experiências extraescolares.

Para isso, deverá haver formas de comprovação definidas por esses sistemas de ensino, considerando, por exemplo:

– a experiência de estágio, programas de aprendizagem profissional, trabalho remunerado ou trabalho voluntário supervisionado;

– a conclusão de cursos de qualificação profissional com certificação; e

– a participação comprovada em projetos de extensão universitária, iniciação científica ou atividades de direção em grêmios estudantis.

No planejamento da expansão das matrículas de tempo integral, deverão ser observados critérios de equidade para assegurar a inclusão dos estudantes em condição de vulnerabilidade social, da população negra, dos quilombolas, dos indígenas, das pessoas com deficiência e da população do campo.

Transição

O texto aprovado prevê a formulação das novas diretrizes nacionais para o aprofundamento das áreas de conhecimento até o fim de 2024 e a aplicação de todas as regras pelas escolas a partir de 2025.

Para os estudantes que estiverem cursando o ensino médio na data de publicação da futura lei, haverá uma transição para as novas regras.

Ensino superior

A partir de 2027, o processo seletivo para o ensino superior deverá considerar as diretrizes nacionais de aprofundamento definidas, permitindo ao estudante o direito de optar por uma das áreas de conhecimento, independentemente do itinerário formativo cursado no ensino médio.

Assim, por exemplo, o itinerário poderá ser linguagens mais matemática e suas tecnologias, e o aluno escolher ciências naturais e suas tecnologias no vestibular.

Escola do campo

No texto aprovado, o deputado Mendonça Filho aceitou emendas para incluir benefícios a estudantes do ensino médio de escolas comunitárias que atuam no âmbito da educação do campo.

Assim, esses estudantes se juntarão àqueles de baixa renda que tenham cursado todo o ensino médio em escola pública no acesso aos benefícios de bolsa integral no ProUni (Programa Universidade Para Todos) para cursar o ensino superior em faculdades privadas e à cota de 50% de vagas em instituições federais de educação superior. Poderão contar ainda com a poupança do ensino médio (programa Pé-de-Meia).

Com informações da Agência Câmara

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