Choramos juntas, lutamos juntas
Cristina Castro*
Sim, o choro nos pertence. Nós podemos chorar.
Sim, a ministra chorou. Na última segunda-feira (18), a ministra da Saúde, Nísia Trindade, durante reunião ministerial com o presidente Lula, desabafou e se emocionou ao relatar os desafios enfrentados em sua gestão. E deve ter chorado muitas vezes no governo anterior ao presidir a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), instituição histórica de ciência e tecnologia, enquanto o país era governado por um negacionista que se atrevia a receitar medicamentos inúteis enquanto centenas de milhares de pessoas morriam durante a pandemia de covid-19.
Qual o significado do choro? Trata-se de uma resposta natural e espontânea do corpo às emoções. É um mecanismo de descompressão, de alívio. Uma válvula de escape para nos esvaziar do estresse, da tristeza e da dor. Uma ferramenta importante tanto para a saúde física quanto para a mental.
O interessante é que, ao ver uma mulher chorar, há sempre uma associação com fraqueza, com
Desde a infância, os meninos eram ensinados — e alguns ainda são — que homem não chora e que a mulher ,por sua vez, chora porque é “frágil”. São duros estereótipos, que fazem a sociedade enxergar num choro determinada competência ou capacidade.
Lula chorou várias vezes:
“O presidente Lula chorou hoje ao fazer um discurso ao lado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, em um evento sobre florestas na COP28.”
“O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deu um discurso de 19 minutos no ato comemorativo ao aniversário do PT nesta 2ª feira (13.fev.2023) e chorou 3 vezes”.
“Trabalhadores e trabalhadoras desempregados, exibindo nos semáforos cartazes de papelão com a frase, que nos envergonha a todos: ‘Por favor, me ajuda’”, disse Lula que, em seguida, chorou.
Mas não lhe foram atribuídas
Chegaram a insinuar que a ministra deveria “cair” depois do choro. Inúmeras foram as narrativas construídas, mas poucas avaliaram os desafios gigantes, os problemas diários, a Emenda 95 — que restringiu o financiamento para a saúde e para a educação — ou os prejuízos trazidos pelas reformas (mais adequado seria dizer “deformas”)previdenciária e trabalhista, que contribuíram para o adoecimento das pessoas e dificultaram o acesso à assistência. Tampouco citaram os anos anteriores de desgoverno negacionista, cujo presidente, além de todos os despautérios cometidos na pandemia, sentia orgulho de negar a ciência e a pesquisa.
Sim, o choro é profundo. E é necessário um olhar político para entender o verdadeiro significado das palavras que o desmerecem: os ataques daqueles que querem a pasta e que precisam, a qualquer custo, eliminar a primeira mulher a conduzir esse ministério.
Já vimos esse filme antes. A presidenta Dilma Rousseff foi alvo de toda espécie de desqualificação moral, pessoal, física e política. E aqui é preciso lembrar a palavra cujo significado muitas desconhecem, mesmo nas rodas de conversa: misoginia. Misoginia
Neste mês de março, mês em que se celebrou o Dia Internacional das Mulheres, precisamos nos debruçar sobre o significado de termos usados aqui neste texto para além de seu significado teórico, focando no que representam, na prática, na vida das mulheres.
Que a superação dos preconceitos e que a igualdade nos sejam asseguradas, do choro aos direitos e possibilidades reais. Na vida diária. No trabalho, na escola, em todos os espaços sociais e familiares.
Toda energia e luz no caminho da ministra Nísia Trindade. A gente chora junta e luta junta. Mexeu com uma, mexeu com todas.
*Cristina Castro é professora, militante, sindicalista, da Direção do CES (Centro Nacional de Estudos Sindicais e do Trabalho), integrante da UBM (União Brasileira de Mulheres) e do Fórum 8M em Juiz de Fora/MG e coordenadora da Secretaria de Relações Internacionais da Contee
