CIDH recomenda ao Brasil “o aumento dos investimentos públicos em educação”

Relatório pautado por informações enviadas pela Campanha e parceiras e publicado em 05/03 trata ainda de exclusão escolar, discriminação de gênero e demonstra preocupações com as políticas de austeridade e militarização de escolas

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou relatório sobre a situação dos direitos humanos no Brasil. Na seção que trata das políticas educacionais, desigualdades e grupos em situação de risco, as informações citadas usam como fonte o Relatório Luz do GT 2030, em que a Campanha Nacional pelo Direito à Educação é ponto focal de educação. Segundo o relatório da Comissão:

“A CIDH observa com preocupação as limitações impostas pela Emenda Constitucional nº. 95/2016, que estabeleceu um limite para os gastos federais no Brasil pelo período de 20 anos. Dados os desafios ainda existentes quanto ao acesso à educação infantil e ao ensino superior, a alfabetização de jovens e adultos, a evasão escolar e, especialmente, considerando as desigualdades étnico-raciais no acesso à educação de qualidade, a Comissão entende como fundamental o aumento dos investimentos públicos em educação. Adicionalmente, a considerando que 3% das crianças se encontram fora do ensino “fundamental 1”, 4% estão fora do ensino “fundamental 2”, assim como 17% fora do ensino médio, em que levar a educação para todos e todas segue como desafio fundamental a ser enfrentado, causa preocupação que políticas dedicadas a enfrentar alguns destes desafios tenham sido descontinuadas, como é o caso do Programa Brasil Alfabetizado.

A CIDH manifesta ainda preocupação com o processo de militarização de escolas públicas a partir da criação do Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares.677 A garantia do direito à educação requer pedagogia que respeite a individualidade, promova a cidadania e a socialização com respeito aos direitos humanos e que requer pessoal especializado. Neste sentido, a Comissão chama a atenção para a distinta natureza das forças armadas em comparação com aquela destinada à dinâmica educacional.

(…)

Apesar dos vários avanços na educação que incluem a perspectiva de pessoas cuja orientação sexual e identidade e/ou expressão de gênero diferem dos padrões socialmente aceitos, a Comissão relata sua preocupação com o projeto de educação autointitulada em “defesa da ‘escola sem partido’” criticando a educação com perspectiva de gênero. Esse projeto, corporificado no Projeto de Lei Nº. 7180/2014, exige que os professores tenham uma posição neutra contra uma suposta “doutrinação ideológica de esquerda” que, de acordo com os idealizadores do projeto, estaria ocorrendo nos centros educacionais do país, incluindo o ensino de uma “ideologia de gênero”. De igual maneira, preocupa a Comissão a declaração de autoridades contra a educação com perspectiva de gênero687. Segundo informação, foram registradas declarações do Ministério da Educação indicando o esforço de combater a educação de gênero nas escolas.

Na opinião da Comissão, o Projeto de Lei nº. 7180/2014 possui um grande potencial de violar o artigo 13.2 do Protocolo de San Salvador enquanto ao direito à liberdade de expressão dos educadores. Nesse sentido, a CIDH recomenda que o Estado discuta as mudanças na educação com os pais das crianças e adolescentes, bem como com os educadores, buscando “capacitar todas as pessoas a participarem efetivamente de uma sociedade democrática e pluralista, alcançar uma subsistência digna, promover compreensão, tolerância e amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais, étnicos ou religiosos e promover atividades em favor da manutenção da paz”.

Em relação à educação com perspectiva de gênero, a CIDH recorda ao Estado que a perspectiva de gênero é uma ferramenta essencial para combater a discriminação e a violência contra mulheres e pessoas com diversas orientações sexuais e identidades de gênero; e um conceito que busca tornar visível a posição de desigualdade e subordinação estrutural das mulheres aos homens devido ao seu gênero. Portanto, a Comissão lembra ao Estado de sua obrigação em adotar medidas específicas para modificar os padrões socioculturais de comportamentos heteronormativos, incluindo o desenho de programas educacionais formais e não formais para combater preconceitos e costumes e todos os outros tipos de práticas baseadas em a premissa da inferioridade das mulheres ou de outros grupos historicamente discriminados por causa de sua diversidade sexual ou identidade de gênero.”

Em março de 2020, a Campanha enviou à CIDH ofício de solicitação de pedido de informações ao Estado Brasileiro sobre o Direito Humano à Educação no contexto da pandemia do novo coronavírus (COVID-19), juntamente com o Relatório “COVID-19: Educação e emergência no Brasil, Discriminações e violações decorrentes de políticas adotadas”, em conjunto com Ação Educativa, Cedeca Ceará, Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos – IDDH, MST e Plataforma DHESCA.

Também em março, a Campanha participou, sob a representação da coordenadora geral, Andressa Pellanda, de reunião juntamente com a CIDH/OAE, informamos sobre os problemas relacionados ao governo federal, em termos de garantia de todos os direitos humanos, com foco na educação, e discutimos desafios nos níveis subnacionais. A reunião também tratou do impacto da EC 95 para as políticas sociais, principalmente na área de educação.

Anteriormente, em 2016 e 2017, a Campanha participou de audiência na CIDH sobre as ameaças do Escola Sem Partido e em 2018, participou de denúncia coletiva sobre ameaças a professores e liberdade de cátedra.

“A CIDH/OEA reconhece em seu relatório as informações que temos enviado sucessivamente à Comissão sobre os impactos profundos e negativos das medidas tomadas pelo governo Bolsonaro para o direito à educação e recomenda o que vimos falando há tempos: é urgente aumentar os investimentos na área e é preciso redobrar medidas antidiscriminatórias, sob pena de efeitos desastrosos para a população”, afirmou Andressa Pellanda em análise sobre o relatório.

Campanha

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