Contee cobra abertura de processo de impeachment
A Contee enviou hoje (10) um ofício ao presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, solicitando a abertura de processo de impeachment contra Bolsonaro. Confira abaixo o documento.
Excelentíssimo Senhor Presidente,
com nossos respeitosos cumprimentos, em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) — que congrega 73 sindicatos e 10 federações que têm o dever de bem representar os profissionais de educação escolar (professores e técnicos administrativos) que se ativam nas aproximadamente 40 mil instituições privadas de ensino de nível básico e superior em âmbito nacional —, declaramos-lhe solenemente que nos associamos às mais de uma centena e meia de milhões de vozes democráticas — tendo como base o percentual de mais de 75% de brasileiros/as que preferem a democracia —, empenhadas na defesa intransigente do Estado Democrático de Direito, que aguardam ansiosas efetivo sinal de V. Exª, que pode representar o primeiro passo decisivo rumo ao resgate do Brasil preconizado pela CF, nunca dantes tão ameaçado pela sanha golpista orquestrada e regida sob a batuta do presidente Bolsonaro; sinal que se consubstancia no imediato recebimento de um só que seja dos mais de 130 requerimentos de abertura de processo de impeachment do presidente golpista, bem assim no cumprimento do rito determinado pelo Art. 19 da Lei N. 1079/1950, aplicável a casos que tais.
Frise-se, Senhor Presidente, que, em conformidade com o Art. 218, § 2º, do Regimento Interno dessa augusta Casa Legislativa, o referido e tão almejado sinal é privativo de V. Exª, não sendo dado a nenhuma outra autoridade política substituí-lo e/ou supri-lo.
2 Essas dezenas de milhões de vozes que se ecoam de forma retumbante em defesa da ordem democrática, negada, pisoteada e cotidiano objeto de zombaria pelo presidente Bolsonaro, fazem seu o libelo do cônsul romano Marco Túlio Cícero (64-63 a.c) contra o igualmente golpista Lúcio Sergio Catilina, por óbvio contra aquele, não contra este, assim exarado, em síntese:
“Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há de precipitar a tua audácia sem freio? […] Não sentes que os teus planos estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? Quem, de entre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, em que local estivestes, a quem convocaste e que deliberações foram as tuas. Ó tempos, ó costumes!”
A resposta a esse brado de milhões começa pelo aludido sinal de V. Exª, que, a toda evidência, se a ele faltar, estará faltando com a nação e com o resgate do Brasil.
3 O Brasil, desde o fatídico dia 1º de janeiro 2019, data da posse de Bolsonaro como presidente da República, acha-se mergulhado numa realidade fantasmagórica, em que o mais alto mandatário do país, de maneira teratológica e sem precedente em âmbito mundial, não age como tal. Age diuturnamente, isto sim, como orquestrador, organizador e regente de atos e fatos que conspiram contra a ordem democrática, atacando impiedosamente a CF, que a sustenta, e a qual ele jurou solenemente respeitar e defender.
Importa dizer: Bolsonaro não age como presidente da República, mas sim como chefe mor da desordem e dos desordeiros, de toda sorte de bravatas e de atos de violência contra quem ousa dissentir de seus vis propósitos.
4 A desfaçatez e a sanha golpista do presidente Bolsonaro chegaram ao extremo de ele sequestrar, para seus nefastos objetivos, um dos mais importantes símbolos da nação: o dia 7 de setembro.
O dia 7 de setembro de 2021, que registrou o centésimo nonagésimo nono ano da independência do Brasil, com toda certeza, ficará marcado por todo o sempre como o surreal dia em que o presidente da República patrocinou e regeu gravíssimos levantes que pretendiam se transformar em réquiem para a ordem democrática.
5 É bem de ver-se, Senhor Presidente, que à luz do Art. 2º da Lei N. 1079/1950, são punidos com a pena de impeachment atos consumados e tentados do presidente da República contra a ordem constitucional, previstos no Art. 85 da CF, como no caso sob discussão.
Veja-se o que diz o realçado Art. 2º da Lei N. 1079/1950:
“Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República”.
6 Como se não bastassem os gravíssimos, repetidos e decantados atos contra a ordem constitucional, notadamente contra a independência e a separação dos poderes, hoje, de largo conhecimento mundial, há, ainda, o quadro de catastrófica crise sanitária, econômica social e política, propositadamente ignorado pelo presidente Bolsonaro, nunca dantes visto na história do Brasil, ao menos nos últimos cem anos.
7 Tomando-se por base a declaração de voto de V. Exª pela autorização de abertura de processo de impeachment da presidente Dilma, aos 17 de abril de 2016, domingo, esse quadro de crise já seria bastante para o recebimento dos pedidos de impeachment do presidente Bolsonaro.
Àquela oportunidade, V. Exª declarou, para o presente e o futuro: “O Brasil está parado e nós temos que encontrar essa saída”; e, para V. Exª, a saída era o impeachment da presidente Dilma; o que, efetivamente, se deu, como é consabido.
8 Se, para o Brasil parado, o impeachment era a saída, o que dizer do Brasil em célere marcha para o passado de trevas, como patenteia a última pesquisa nacional de amostras por domicílio (Pnad), divulgada ao dia 31 de agosto próximo pretérito?
9 Eis os desoladores dados coletados pela Pnad: 14,4 milhões de desempregados; 7,4 milhões de subocupados; 10,2 milhões de pessoas na força de trabalho potencial, que poderiam trabalhar mas não trabalham, nos quais se incluem 5,6 milhões de desalentados; 30,2 de trabalhadores com carteira de trabalho assinada, o menor número de todos os tempos; 10 milhões de empregados sem carteira assinada no setor privado; 24,8 milhões de trabalhadores por conta própria, sendo que a taxa de informalidade chegou a 40,6% da população ocupada, ou 35,6 milhões de trabalhadores informais.
10 Como precedente histórico a justificar o ato que se espera ser praticado por V. Exª, sem mais delonga, vale trazer à baila aquele esposado pelo senador Nilo Coelho, no já longínquo ano de 1983, ao dia 21 de setembro, na tumultuada e inesquecível sessão do Congresso Nacional que aprovou o Decreto Legislativo N. 72, que rejeitou o Decreto-lei N. 2024, de 25 de maio daquele ano, que impunha o maior arrocho salarial até então conhecido, uma espécie de antecedente das medidas provisórias Ns. 905/2019, 927/2020 e 1046/2021.
11 Naquela sessão, o presidente do Senado e do Congresso Nacional, senador Nilo Coelho, do PDS-PE, ao se recusar a esposar as manobras do regime militar — de quem Bolsonaro é confesso órfão — para, ao reverso do que se deu, rejeitar o citado decreto legislativo e, com isso, abrir período temporal necessário à consolidação do realçado decreto-lei em lei, por decurso de prazo, foi alvo de ostensivo ato de censura pelo líder do PDS na Câmara Federal, Ricardo Fiuza, seu companheiro de partido e conterrâneo em domicílio eleitoral.
Como resposta a essa nefasta censura, o senador Nilo Coelho, após a aprovação do comentado Decreto Legislativo, afastou-se, por um momento, da Presidência e bradou, em síntese:
“Devolvo a censura, ou por delegação, ou por fala própria, do líder Ricardo Fiuza, do meu partido, ao presidente do Congresso Nacional. […] Não sou presidente do Congresso do PDS. Sou presidente do Congresso do Brasil”.
12 Por todo o exposto, Senhor Presidente, é chegada a hora de V. Exª, como que a parafrasear o senador Nilo Coelho, reafirmar a condição de presidente da Câmara Federal da República Federativa do Brasil, e não presidente da Câmara de Bolsonaro; o que, aliás, é compromisso de campanha, como candidato vitorioso à Presidência da Câmara Federal.
Atenciosamente,
Gilson Reis
Coordenador-geral