Crime contra os trabalhadores: Análise do texto e da aprovação do PL 4.330

Por José Geraldo de Santana Oliveira*

O dia 6 de junho de 1944, data em que se deu o desembarque das tropas aliadas nas praias da Normandia, França, para sepultar, de uma vez por todas, a força do exército alemão, é considerado o mais longo dos dias, de toda a Segunda Guerra Mundial, apesar de, por óbvio, ter a mesma duração que os demais. Este atributo decorreu das tensões, angústias e riscos que acometeram tais tropas.

Na história do Brasil, com certeza, o dia 8 de abril de 2015 ficará registrado como mais longo, agonizante e nefasto dia dos últimos 51 anos; só comparável ao fatídico 1º de abril de 1964, que foi palco do golpe militar.

Neste dia, os direitos fundamentais sociais brasileiros sofreram o mais duro e certeiro golpe de todos os tempos, rasgando-se, impiedosamente, os fundamentos da dignidade humana (Art. 1º, inciso III), dos valores sociais do trabalho (Art. 1º, inciso IV), da dignidade do trabalho humano (Art. 170), do primado do trabalho e do bem estar e da justiça sociais (Art. 193), todos da Constituição da República Federativa do Brasil (CR). Isso devido à aprovação do Projeto de Lei N. 4330/2004, que tem como essência a terceirização sem limites e fronteiras, tornando-a permitida e legalizada em qualquer das atividades da empresa, como se acha destacado nos seus Arts. 2º, incisos I e II, e 4º.

Indiscutivelmente, a essência do mencionado PL está no fim de toda e qualquer barreira, até aqui, impostas à terceirização pela Súmula N. 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que só a considera lícita para a atividade-meio, sendo terminantemente vedada para a atividade-fim.

Com a aprovação desse PL, não há mais barreiras, fronteiras e limites, insistam-se. Por essa razão, toda a peroração que se fez em torno do conteúdo dele era mera cortina de fumaça. O único deputado federal, ferrenho defensor de sua aprovação, que ousou dizer, com todas as letras, qual é o seu principal objetivo, foi José Carlos Aleluia, do DEM da Bahia. Para provocar o PT, afirmou que o desespero deste fundava-se na sua consciência de que, a partir de agora, não haverá mais categoria profissional; em outras palavras, só haverá terceirizados.

É bem de ver-se que soa falsa e sem fundamentos a categórica afirmação do deputado Paulinho da Força, SD de SP, de que com o enquadramento sindical garantido fica superada a discussão sobre atividades-fim e meio.

Por isso, não há como se sublinhar este ou aquele dispositivo do comentado PL que possa representar conquista dos trabalhadores, pois que, repita-se, a morte da essência representa a morte de tudo.

Desse modo, entendo que, na votação dos destaques, na próxima terça-feira, dia 14 de abril de 2015, os deputados contrários a este crime de dimensões e consequências ainda incomensuráveis devam concentrar os seus esforços na alteração dos já citados Arts. 2º, incisos I e II, e 4º, que rompem todas as fronteiras da terceirização; bem assim, no Art. 15, para garantir que a responsabilidade da contratante seja, em primeiro lugar, solidária; e, ainda, na garantia de isonomia salarial e dos demais direitos entre os empregados da contratante e da contratada.

Se é que se pode falar em alguma garantia advinda do realçado PL, o que é, no mínimo, duvidoso, há de realçar:

1- O Art. 2º, inciso III, e §§ 3º e 5º, que falam em empresa especializada, que possui qualificação técnica, objeto social único e qualificação técnica; o que, ao menos, inibe a possibilidade de o contratado ser pessoa física, além de abrir a perspectiva para a discussão judicial de nulidade de contratos com empresa que não comprove estes requisitos.

2- O Art. 4º, § 3º, que proíbe a intermediação de mão de obra, em que pese a ressalva nele incluída, que abre um vasto leque para tanto, ou seja, podem ser aprovadas leis específicas com esta finalidade.

3- O Art. 9º, que autoriza o provisionamento de valores da fatura mensal para pagamento de obrigações previdenciárias e trabalhistas.

4- O Art. 14, que, de forma indireta, caracteriza a sucessão trabalhista, nos termos dos Arts. 10 e 448, da CLT.

5- O Art. 15, parágrafo único, que trata da responsabilidade conjunta entre a contratante e a contratada para com todas as obrigações previdenciárias e trabalhistas no caso de subcontratação, a chamada quarteirização.

6- O Art. 16, caput, que determina à empresa contratante que exija a comprovação mensal de cumprimento das obrigações previdenciárias e trabalhistas, sob pena de a sua responsabilidade tornar-se solidária; § 1º, que autoriza a contratante a reter a fatura mensal, se não for comprovado o adimplementos das sublinhadas obrigações; o § 2º, que autoriza a contratante, em caso de retenção da fatura, promover o pagamento destas.

7- O Art. 17 e o 18, que determinam à contratante que promova as devidas retenções na fonte.

8- O Art. 22, que prevê penalidades, para os casos de fraude a quaisquer das obrigações elencadas na lei.

No tocante aos pontos negativos, para além da questão essencial já abordada, devem ser anotados:

1- O Art. 4º, § 2º, que exclui a possibilidade vinculo empregatício com a tomadora, quando esta for empresa pública ou de economia mista.

2- O Art. 5º, inciso III e §1º, que estabelecem, como garantia, o pífio percentual de 4% da fatura.

3- O Art. 6º, que versa sobre os documentos exigidos para a contratação, mas que, efetivamente, não exige nada para além das formalidades gerais.

4- O Art. 8º, que trata do enquadramento sindical dos terceirizados, que, além de sua redação confusa, é restritivo.

5- O Art. 15, que representa a maior derrota, depois da liberação da atividade, por limitar a responsabilidade da contratante à condição subsidiária.

Frise-se que o deputado Paulinho da Força informou aos demais pares que o relator do PL tinha acatado a sua emenda de inversão da ordem da s obrigações, vindo em primeiro lugar a solidária, que defendemos, e, em segundo, a subsidiária, caso a empresa contratante consiga provar que cumpriu rigorosamente a fiscalização que lhe cabe. Porém, isto não aconteceu.

6- O Art. 20, que concede ao sistema financeiro mais benesses que aos outros, que delas já se fartam.

No que pertine aos destaques, o presidente da Câmara, respondendo à questão de ordem suscitada pelo deputado Miro Teixeira, afirmou que poderão ser apresentados até às 14 horas do dia 14/4, e que poderão ser supressivos, aglutinativos e/ou modificativos. Apesar de isso contrariar o Regimento da Casa, por acordo de lideranças, será possível.

Vale registrar a importância do destaque apresentado pela deputada Dorinha, DEM do Tocantins, para excluir os professores, de todos os níveis, etapas e modalidades deste crime.

Ressalta-se que o Líder do PSDB, deputado Nilson Leitão, afirmou que não só apoiará este destaque como é coautor dele. O que nos traz esperança de sua aprovação.

*José Geraldo de Santa Oliveira é consultor jurídico da Contee

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