Crise que atinge sindicatos e Estado ameaça sobrevivência do Dieese
Instituto criado em 1955 sofre com inadimplência de sócios e atraso em repasse de entidades parceiras. Para se manter, lançou uma campanha pública de apoio
por Vitor Nuzzi
São Paulo – A dois dias de completar 62 anos, o Dieese enfrenta aquela que, na avaliação de seu diretor técnico, Clemente Ganz Lúcio, é a mais severa crise entre as muitas de sua existência, sob impacto da situação difícil do próprio movimento sindical, que o sustenta, e do próprio Estado, parceiro do instituto em vários projetos. Há risco de fechamento, inclusive, e para evitar isso o Dieese lançou uma campanha de apoio institucional.
“O objetivo é garantir a sustentabilidade da instituição e permitir a intensificação dos trabalhos de assessoria às entidades sindicais, nesse momento em que direitos dos trabalhadores e a organização sindical estão ameaçados”, afirma o Dieese, destacando a capacidade técnica do instituto. “Tempos difíceis trazem desafios que exigirão do movimento sindical ousadia, novas ideias, criatividade, capacitação, visão estratégica, táticas de negociação e muita unidade.”
A situação inclui atraso de salários e dispensa de mão de obra, neste último caso nem tão recente. De dois anos para cá, o instituto cortou 70 dos seus funcionários, reduzindo o total para 270 – e deve diminuir mais. Projetos tiveram redução. A Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) deixou de ser realizadas em três regiões metropolitanas (Belo Horizonte, Fortaleza e Recife) e está ameaçada em Porto Alegre. A pesquisa da cesta básica, que era feita nas 27 unidades da federação, perdeu seis capitais.
“O impacto é várias vezes mais severo do que já tivemos, porque é uma crise estrutural dos sindicatos. O Dieese sofre a consequência de uma pesada desestruturação. É também uma crise do Estado brasileiro”, diz Clemente, apontando uma “acentuada queda de receita”. Em torno de 70% da receita é sindical e 30%, não sindical. No caso de convênios com órgãos públicos, muitos estão com pagamento em atraso. Alguns sócios também estão inadimplentes.
“Há um risco de entidades sindicais fecharem. Esse mesmo risco pode atingir o Dieese”, observa Clemente. A perda de receita se tornou mais acentuada após a “reforma” trabalhista – que, em contrapartida, também pode exigir mais prestação de serviços. “A nossa ideia é que essas mudanças tragam aumento de demanda para o Dieese”, diz o diretor técnico.
Na campanha de apoio, o instituto solicitou às entidades filiadas – aproximadamente 700 – o aporte de uma 13ª mensalidade. Para os não sócios, foi pedida uma contribuição, que dará acesso a alguns serviços. Pessoas físicas também podem participar. Confira como, aqui.
Nesta quarta-feira (20), o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, ex-presidente do instituto, divulgou um texto cujo título é Não podemos deixar o Dieese fechar. “Seus técnicos estão procurando, a duras penas, manter o trabalho, porque a interrupção de uma pesquisa joga tudo o que foi feito no lixo”, escreveu, citando atraso nos salários desde setembro e uma dívida não paga do Ministério do Trabalho.
“Os trabalhadores perdem com o fechamento do Dieese, pois é o Dieese que tem a melhor capacidade e legitimidade para situá-los no contexto econômico e social. Toda luta e toda reivindicação precisa de dados e estatística que a justifiquem. (…) Sem mecanismos que questionem a realidade, com as estatísticas com fundamentos científicos, não há informação apurada e confiável.” O instituto nasceu, nos anos 1950, justamente para contrapor-se a dados oficiais de inflação.