Educação, alvo estratégico da ultradireita na Câmara dos Deputados

Por Silvia Barbara

A escolha do deputado federal Nikolas Ferreira (PL/MG) para presidir a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados tem um alcance que vai muito além do papel institucional que cabe aos presidentes das comissões temáticas, compostas por parlamentares para discutir e votar projetos de lei específicos.

As comissões foram criadas para serem uma instância de debate mais qualificado sobre os projetos de lei e permitir um diálogo maior com os cidadãos e entidades representativas da sociedade. Em geral, os parlamentares escolhidos para compor esses colegiados têm conhecimento técnico e afinidade com o assunto específico. Não é o caso do deputado Nikolas…

Não há nada em sua vida pública que o credencia para a Comissão de Educação. Durante a pandemia, Nikolas Ferreira afrontou a ciência, defendeu a cloroquina e, por ironia, foi obrigado a imunizar-se tardiamente para viajar ao Reino Unido e participar de um evento antivacina.

Em 8 de março, num ato de boçalidade explícita, apresentou-se com uma peruca na tribuna da Câmara dos Deputados, para ironizar os ‘homens que se sentem mulheres’, segundo suas palavras. Por fim, é réu num processo por ter exposto uma adolescente transexual de 14 anos nas redes sociais, filmada (pela irmã do deputado) no banheiro feminino da escola em que estudava. O deputado já tem uma condenação, em segunda instância, por transfobia.

Comissões

Voltando às comissões, embora tenham sido criadas como espaço de debate qualificado, elas perderam parte de seu protagonismo na Câmara dos Deputados, especialmente nas duas últimas legislaturas, em face do poder da presidência da casa em levar matérias importantes para serem votadas diretamente no plenário, sem passar por comissão.

Ainda assim, a disputa pelo comando desses colegiados tem se acirrado por conta dos vultosos recursos destinados a emendas de comissão e dada a polarização política que transformou cada um desses espaços em palco de disputas ideológicas. É esse o contexto, acirrado e belicoso, que explica a opção por Nikolas Ferreira.

A Comissão de Educação tornou-se uma cabeça de ponte de setores ultraconservadores e bancadas religiosas para manter sua pauta de costumes na ordem do dia. Entre as propostas mais frequentes defendidas por esses grupos estão a proibição de abordagens sobre questões de gênero nas escolas, a perseguição e censura a professores, livros didáticos e conteúdos de aula, a educação domiciliar, o ensino de religião, inclusive com uso de recursos públicos, e as escolas cívico-militares.

A estratégia não se limita à atuação parlamentar na Comissão. Em outubro de 2023, por exemplo, foi criada a Frente Parlamentar em Defesa da Escola sem Doutrinação Ideológica que tem como vice-presidente o deputado Nikolas Ferreira.

Segundo reportagem da Agência Pública (Educação é o principal foco de projetos conservadores na Câmara), o Instituto de Estudos da Religião (ISER) monitorou projetos de lei apresentados por deputados identificados como católicos ou evangélicos e concluiu que a educação respondia pela maior parte das proposições, inclusive entre os parlamentares de direita.

Bolsonaro foi derrotado nas urnas, mas o projeto político da ultradireita continua assombrando. A disputa e o controle pela pauta da educação dão visibilidade a esse projeto e possibilitam que ele se expanda por espaços políticos que vão além do Congresso Nacional. Quem perde com isso é a sociedade brasileira. Se alguém tem alguma dúvida, basta acompanhar uma sessão da Comissão de Educação. É triste, muito triste.

Silvia Barbara. Professora e diretora do SinproSP.

Da Agência Sindical

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