Eleições 2014: Que o voto seja pela construção do Brasil almejado
Por José Geraldo de Santana Oliveira*
“Que ingenuidade a minha, pedir aos donos do poder para reformá-lo.”
Este brado de protesto e denúncia, que atravessou os séculos e mantém-se atualíssimo ainda hoje, é do filósofo italiano Giordano Bruno, lançado à sua geração e às que o sucederam, por tempos imemoriais, minutos antes de ser queimado vivo, como herege, pela Inquisição, em 1600, porque se recusou a negar que o Sol era maior que a Terra e que esta girava em torno dele.
Os protestos dos(as) trabalhadores(as), cotidianamente lançados contra o arraigado conservadorismo e as rotineiras posições avessas à garantia da cidadania plena, pelo Poder Executivo e Poder Legislativo, em âmbito nacional e estadual, guardadas as devidas proporções, soam como o brado de Giordano Bruno, pois que, via de regra, com poucas exceções, os ocupantes destes poderes são representantes do poder econômico, sendo fiel aos seus interesses, que quase sempre caminham na contramão das políticas públicas que pavimentam o caminho para a construção segura e duradoura do bem estar e a justiça sociais, que são os objetivos da Ordem Social, determinados pelo Art. 193 da Constituição da República Federativa do Brasil (CR).
No Congresso Nacional, as propostas de emendas constitucionais (PECs) e os projetos de lei (PL), que visam a ampliar os direitos fundamentais e sociais ou são rechaçados de plano, ao descarado argumento de inconstitucionalidade, ou são submetidos à eterna hibernação. São exemplos claros desta deliberada conduta a PEC N. 231/2.005, que reduz a carga horária semanal de trabalho de 44h para 40h, sem redução da remuneração; o PL que extingue o fator previdenciário; o PL N. 8.035/10, que se transformou na Lei N. 13.005/2.014, que aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE), não antes de se arrastar por mais de três anos e meio; a Convenção N. 158, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que proíbe a dispensa imotivada; e muitos outros.
No entanto, quando se trata de criar e/ou ampliar privilégios para o poder econômico, a agilidade e a generosidade são surpreendentes.
A título de ilustração, toma-se o PL N.3.941/1.989, que regulamentava o aviso prévio proporcional de que trata o Art. 7°, inciso XXI, da CR, e que ficou mais de 21 anos engavetado na Câmara Federal. Porém, mal o Supremo Tribunal Federal (STF) acenou com a regulamentação deste preceito constitucional, por meio de Mandado de Injunção, de maneira decente, chegando o ministro Marco Aurélio a defender a proporcionalidade de mais dez dias de aviso por ano de trabalho, o referido PL foi desengavetado e aprovado, nas duas casas do Congresso, em tempo recorde, e sancionado pela Presidente da República, transformando-se na Lei N. 12.506/2.011, que assegura pífios três dias por ano e com limite de 60, ou seja, o aviso máximo é de 90 dias, para quem atuou 20 anos ou mais na mesma empresa. Algo quase surrealista devido à superlativa e permitida rotatividade no emprego.
Pois bem. A cada quatro anos, os milhões de eleitores que não se comprometem com os escusos interesses do poder econômico têm em suas mãos a possibilidade de alterar esse quadro dantesco, elegendo governantes, em sentido estrito e lato, comprometidos com a construção da cidadania plena. Todavia, não o fazem, com exceção do primeiro mandatário do país, nas últimas três eleições.
Contam-se nos dedos das mãos, dentre os 513 deputados e os 81 senadores, os que efetivamente tenham compromisso com o bem estar e a justiça sociais. Mas, uma coisa é certa, todos eles foram eleitos e não por fantasmas, mas, sim, por cidadãos(ãs). Nem se argumente que foram eleitos por quem comunga das posições políticas que defendem, porque o total de eleitores que abraçam essas teses é insuficiente para eleger tantos parlamentares que as representam, como é realidade do Congresso, já há várias legislaturas.
O saudoso político de primeira grandeza, Mário Covas, em suas múltiplas e vitoriosas campanhas eleitorais, dizia aos eleitores que não se deve votar em alguém; deve-se, isto sim, votar-se por alguém, quer dizer, pelo povo trabalhador, pela democracia e pela cidadania plena. Lamentavelmente, não é assim que os eleitores têm votado. Caso contrário, não haveria tantas leis de cunho antissocial e tantos bons projetos engavetados.
Infelizmente, por várias razões que não cabem neste estreito espaço, a maioria dos eleitores brasileiros, em repetidos processos eleitorais, vem comprando gato por lebre, metaforicamente falando. Ora acreditando em falsas promessas, como aconteceu nas eleições presidenciais de 1989; ora no velho que se traveste de novo, como em 1994 e 1998, igualmente nas eleições presidenciais; ora acreditando que tudo que é novo é bom – melhor seria dizer, o que não foi experimentado –, não importando o andor que o carrega nem o bosque que o circunda; ameaça que paira no ar, como nuvem pesada, para a próxima eleição.
No que diz respeito ao Parlamento, isso tem sido prática reiterada, o que dá sustentação a este calamitoso estado de coisa. O pior é que cada escolha inadequada, para não se dizer errada, tem reflexos nefastos em mais de uma geração.
No dia 5 de outubro próximo, haverá mais uma oportunidade para se optar pela construção do Brasil almejado, sendo que, no âmbito nacional, efetivamente, não há terceira via: ou se opta pela continuidade na nova realidade, que teve início com a eleição de 2002, e que apesar dos percalços e de muitos erros, vem caminhando com certa segurança; ou se opta pelo retrocesso, de triste memória.
É bem de ver-se que estão em disputa projetos antagônicos e não o carisma e a conduta singular de cada candidato. Aqui, repete-se o brado de Giordano Bruno, é ingenuidade pensar que o(a) presidente governa só com sua vontade e com a sua personalidade. Governa, isto sim, com as forças que lhe dão sustentação. Vide a tragédia de 1961, quando o então presidente Jânio Quadros quis pôr-se acima das forças que o sustentavam.
No tocante ao Congresso Nacional, não se difere muito. É preciso analisar a história de vida de cada candidato, a sua coerência, quem o apoia e quais são os seus compromissos políticos. Isto antes de confiar-lhe o voto, que poderá ser o seu passaporte para a Câmara Federal e/ou o Senado. Uma vez lá, o eleito, se não for bem escolhido, poderá, ao reverso da expectativa dos eleitores, votar contra os seus anseios e contra as leis que impulsionarão o progresso social.
Uma má decisão temporária poderá ter efeitos negativos duradouros, por décadas a fio.
É imperioso que cada eleitor pense nisto, antes de confirmar o voto.
*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee