Faces da desprofissionalização: A reforma do ensino médio
No último domingo (5), foi realizada a primeira etapa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que se encerra no próximo dia 12. A importância da avaliação é inquestionável, já que é ela a porta de entrada de milhares de jovens nas universidades públicas federais do país, bem como o critério de concessão de bolsas do Programa Universidade para Todos (ProUni) e também de empréstimos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).
No entanto, assistimos, estarrecidos, a presidenta do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, negar no último sábado (4), pedidos da Procuradoria Geral da República (PGR) e da Advocacia Geral da União (AGU) para permitir a anulação das redações do Enem com violações aos direitos humanos, mantendo a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) do último dia 25 que proíbe que textos com esse teor sejam zerados pelos examinadores. Enquanto isso, temos uma reforma do ensino médio tecnicista e excludente que em nada contribuiu para a formação humana, democrática e cidadã dos estudantes.
As questões podem, à primeira vista, não parecer interligadas, mas estão. E em em seu cerne, entre tantos pontos, encontra-se a desprofissionalização do magistério e tentativa de apagamento dos profesosres que a Contee visa a denunciar e combater com a campanha “Apagar o professor é apagar o futuro”. Porque, se por um lado, o argumento para a decisão judicial acerca da redação do Enem é uma suposta defesa da “liberdade de expressão”, a verdadeira liberdade de expressão, conforme nota é justamente aquilo que o movimento Escola Sem Partido e seus defensores (que entraram com o pedido de liminar contra a anulação dos textos) não conhecem ou que tenta deliberadamente atacar ao propor Leis da Mordaça em todo o país para censurar, coagir e criminalizar professores.
Sobre a relação da Lei da Mordaça e a desprofissionalização do magistério, o Portal da Contee discutirá mais ao longo desta semana. Acontece que a reforma do ensino médio tem participação direta nesse contexto. Em primeiro lugar porque representou um retrocesso em relação à própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que, décadas atrás já tinha superado a discussão dos itinerários formativos e aprovado a importância de uma formação única, propedêutica, ou seja, com cursos introdutórios de cada disciplina nas diferentes áreas de conhecimento para todos. Com isso, a reforma eliminou de alguns dos itinerários formativos a serem supostamente escolhidos pelos estudantes — quando nem oferta nem direito de escolha estão efetivamente garantidos, uma vez que a lei não assegura os recursos para tanto, ainda mais depois da Emenda Constitucional 95 e do congelamento dos investimentos públicos por 20 anos — disciplinas consideradas fundamentais para a reflexão e a formação crítica, como filosofia, sociologia e até mesmo história e geografia.
Em segundo lugar, a reforma do ensino médio criou, para o ensino técnico e profissionalizante, a possibilidade de contratação, para lecionar, de profissionais com “notório saber“ ou com experiência profissional atestados por titulação específica ou prática de ensino, o que não só compromete gravemente a qualidade do ensino ofertado, como vai contra a nossa luta em defesa da formação, acabando com as licenciaturas e com a própria profissão de professor.
É extremamente preocupante que o ensino médio, justamente o nível de ensino que, como mostra o Enem, é aquele que abre o caminho para a entrada na educação superior, seja entregue a essa lógica perversa, contribuindo para o rebaixamento da formação dos estudantes e ainda para o apagamento dos professores. Como a Contee reiterou desde a apresentação da medida provisória que deu origem a essa reforma do ensino médio, reformulações na educação são complexas e exigem muito debate e construção com toda a participação da comunidade escolar e participação imprescindível do magistério, sem o qual não há futuro possível.
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