‘Flexibilizar o currículo do ensino médio significa deixar de oferecer matérias’
São Paulo – Centenas de estudantes secundaristas de São Paulo marcharam ontem (18) do vão livre do Masp, na Avenida Paulista, até a sede da Secretaria Estadual da Educação, na região central da cidade, em protesto contra a reforma no ensino médio, anunciada pelo governo Michel Temer no último dia 22, e contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que congelará investimentos sociais da União por 20 anos. Outros atos ocorreram em Santos, no litoral paulista, e em cidades de Goiás, Paraná, Rio de Janeiro e Ceará.
Após o protesto, os estudantes fizeram um “catracaço”, pulando a catraca da estação República do metrô para chamar atenção para a reivindicação. Um grupo de seguranças reprimiu a ação, utilizando cassetetes e empurrando os secundaristas. Um menor de idade foi detido por um segurança e encaminhado para uma sala e, em seguida, para uma delegacia na Barra Funda, na zona oeste. A presidenta do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo (Condepe), Maria Nazareth Cupertino, que passava pelo local, presenciou as agressões.
O relator sobre Direito da Criança e Adolescente no órgão, Ariel de Castro Alves, dirigiu-se para a delegacia e permaneceu com o jovem, de 15 anos, até ele ser liberado, por volta das 16h, como seu advogado e curador. O adolescente é acusado de lesão corporal contra um segurança e de dano ao patrimônio por atirar um cone direcionador de fluxo contra um segurança. Ele nega. Amanhã, o jovem deverá comparecer à Vara da Infância e Juventude.
“A reforma é uma falácia. Ela propõe educação integral, que exige merenda e mais professores. Ao mesmo tempo articulam uma medida que reduzirá muito os investimentos em educação. Como será possível implantar o projeto assim?”, questionou a secundarista Biana Poliatto, que estuda em uma escola técnica (Etec) de São Paulo. “Essa medida também abre a possibilidade de empresas investirem em escolas e acreditamos que essa é uma obrigação do Estado. Educação não é mercadoria.”
Entre as medidas previstas na reforma do ensino médio, estão o aumento da carga horária de 800 horas-aula por ano para 1.400, flexibilizando o currículo de forma que os alunos passem a escolher entre as áreas de linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação técnica e profissional. As disciplinas de artes, educação física, filosofia e sociologia deixam de ser obrigatórias e os professores não precisariam mais ter diploma de licenciatura.
A concentração começou por volta das 8h30. Às 10h30, eles decidiram ir em marcha até a Secretaria da Educação. Seguiram pela avenida Nove de Julho e pelo Viaduto do Chá até a Praça da República, entoando as palavras de ordem “educação precarizada, tira da pública e põe na privada” e “tira a mão da tesoura”, em alusão aos cortes em investimentos sociais realizados por Temer. O ato seguiu escoltado pela Polícia Militar. Dois oficiais carregavam armas de balas de borracha.
“Estamos vendo uma série de cortes na área social, na saúde e educação. Na crise, o governo optou por manter o lucro da burguesia e cortar dos trabalhadores. Nós vamos frear isso na rua”, disse um aluno de Etec que preferiu se identificar apenas como Chico.
A reforma do ensino médio, apresentada por meio da Medida Provisória (MP) 746, foi elaborada às pressas, sem consulta à comunidade escolar. Ela é criticada por especialistas, por ser considerada ultrapassada e por fragmentar e empobrecer a formação. Logo após o anúncio da medida, estudantes iniciaram uma série de ocupações de escolas em diversas cidades do país. O Paraná concentra o maior número: até as 13h50 desta terça-feira, eram 688 escolas ocupadas, além de dez campi universitários e dois núcleos de educação.
“Estamos nos mobilizando nas ruas porque está impossível fazer ocupações em São Paulo. Os estudantes estão sofrendo muita pressão nas escolas, por parte das diretorias. Em outras, há presença da Polícia Militar, como na (escola estadual) Fernão Dias. Ficamos sabendo que a polícia tem um álbum com 24 fotos de secundaristas que ocuparam escolas e que estão perseguindo eles nas ruas. Nós vamos denunciar a polícia para quem?”, questionou a estudante Lilith.