Freio à privatização: conferência reúne organizações do mundo todo para assinar marcos orientadores ao envolvimento do setor privado na educação
Especialistas e ativistas de Educação e Direitos Humanos do mundo todo se reúnem nesta semana em Abidjan, Costa do Marfim, para a adoção de princípios orientadores que fortaleçam o direito ao acesso gratuito à educação pública de qualidade no contexto de crescente envolvimento do setor privado na educação.
A Campanha Nacional pelo Direito à Educação está presente na Conferência de Adoção dos Princípios de Abidjan e é representada por Daniel Cara, coordenador geral, e Andressa Pellanda, coordenadora executiva. Ainda, Fernando Cássio, professor da UFABC e integrante da Rede da Campanha compõe o comitê de experts que analisou os insumos do documento para chegar à sua versão final. Além da Campanha, cerca de 50 organizações da sociedade civil de todos os continentes também participam do evento, que ocorre entre os dias 11 e 17 de fevereiro.
“A cada dia, a educação tem sido tratada, pelos governos e empresas, como mercadoria e não como direito. Os principais atores da sociedade civil global e da comunidade internacional decidiram colocar um freio a esse processo e nós estamos levando o Brasil a esse movimento em defesa do direito à educação”, analisou Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
A assinatura do texto referente aos Princípios de Abidjan ocorre nesta quinta-feira (14) e deve se tornar o novo ponto de referência para que governos, educadores e demais agentes da área possam debater e regular a atuação do setor privado na educação.
“O documento abarca as muitas expressões da privatização no mundo. Não se trata de forma alguma de um estímulo a novas formas de privatização, mas de um texto que obriga os estados nacionais a intervirem no setor privado toda vez em que a ação desses atores significar uma ameaça ao Direito à Educação”, afirmou Fernando Cássio, integrante do grupo de experts para o documento.
Os Princípios de Abidjan
Para servir de guia à elaboração de legislação e políticas públicas, os Princípios de Abidjan abordam, principalmente, orientações que visam assegurar a não interferência de interesses privados na garantia do direito à educação pública e de qualidade a todas e todos.
“Foi um processo intenso de debates para a elaboração deste documento, apoiado por atores importantes do campo da educação no âmbito internacional. Sua adoção nesta semana deve ser uma propulsora para pautar ainda mais debates no mundo todo e contribuir para a elaboração de resoluções e marcos globais sobre o direito à educação em agências multilaterais e também instituições nacionais”, afirmou Andressa Pellanda, coordenadora executiva da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.
De acordo com o documento, caberá aos governos criar mecanismos de regulação e monitoramento das atividades do setor privado, para que sejam garantidos o respeito, a proteção e o cumprimento do direito à educação. Os padrões mínimos sugeridos pelos Princípios de Abidjan envolvem uma série de temáticas fundamentais à área, como a governança das instituições privadas, o respeito à liberdade acadêmica e pedagógica, a proteção contra todas as formas de discriminação e a garantia de acessibilidade e inclusão nas instituições de ensino.
Contexto
Nos últimos 20 anos, muitos países assistiram ao rápido avanço do setor privado nas diversas áreas da educação. Feita de maneira difusa e sem obedecer a orientações previamente elaboradas, a atuação do setor privado torna-se preocupante à medida que pode prejudicar seriamente o progresso alcançado globalmente na garantia de direitos universais e do acesso à educação pública, gratuita e de qualidade.
A Organização das Nações Unidas juntamente com diversas instituições ligadas aos direitos humanos têm abordado cada vez mais a questão, fazendo surgir a necessidade de se compilar todas as fontes legais de informação em um único texto. Com esse objetivo, os Princípios de Abidjan, documento assinado em 14 de fevereiro de 2019, tornam-se um marco de orientação legal para que governos e agentes da educação possam elaborar a regulação da atuação do setor privado da área.
Na ocasião da Conferência de Adoção, a Professora Ann Skelton, representante da Cátedra de Direito Educacional da UNESCO na África e Presidente do Comitê de Redação do documento, afirmou: “Esses Princípios Orientadores podem ajudar a garantir que os Estados estabeleçam regras e regulamentos que garantam que as escolas privadas operem de maneira positiva e não afetem negativamente o direito de todos de acessar a educação pública, gratuita e de qualidade.”
O documento é fruto de uma série de consultas internacionais, regionais e temáticas feitas entre 2016 e 2018 para a elaboração de um texto capaz de abordar as diferentes realidades e contextos dos mais de 40 países participantes. Essas consultas foram coordenadas pelo Consórcio Global sobre Privatização da Educação e Direitos Humanos, do qual a Campanha Brasileira integra sua direção.
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