Governo instala grupo de trabalho para discutir política nacional da primeira infância
Uma política para a primeira infância muda a realidade da família, da comunidade e da cidade, e por consequência do país, diz Alexandre Padilha
O governo federal instalou nesta quarta-feira (23) um grupo de trabalho (GT) para discutir uma política nacional para a primeira infância. O GT foi criado no âmbito do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), mais conhecido como Conselhão. O grupo se reuniu no Palácio do Planalto, com a presença do presidente em exercício, Geraldo Alckmin, dos ministros da Educação, Camilo Santana, do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, e das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, representantes de outras pastas e inúmeros conselheiros.
Professor e escritor, secretário municipal de Educação de São Paulo na gestão de Fernando Haddad, Gabriel Chalita disse que o país precisa cuidar da primeira infância se quiser ser mais seguro no futuro, com mais tecnologia e desenvolvimento humano. No entanto, ante essa urgência, “o Congresso Nacional ainda está discutindo home schooling. No momento em que nós precisamos pensar que precisamos trazer as famílias para a escola, há grupos que acham que crianças não precisam ir para a escola”, protesta.
Chalita lembrou que dados sobre violência contra crianças mostram números “assustadores” segundo os quais muita violência acontece dentro de casa. “Como a gente fica sabendo disso? Nas escolas. As escolas acabam sendo um ambiente protetivo”, disse, destacando o papel dos professores. “Não podemos esquecer dos professores, que vão ser quem vai trabalhar com essas crianças.”
Mariana Luz, presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, defendeu que o grupo de trabalho “precisa de todos unidos, ministérios juntos, e entes federados trabalhando juntos”. Isso porque, segundo ela, se o Brasil avançou nos últimos 20, 30 anos (em termos de proteção à infância), “a realidade ainda é dura”. “Dos 20 milhões de crianças na primeira infância, quase metade delas está em alguma situação de vulnerabilidade. Um terço das crianças, na pobreza e extrema pobreza”, disse.
“A pobreza aumenta a pobreza”
O social se revela com clareza nesses números porque mostram que crianças pretas, pardas e indígenas “não têm condições de alcançar os estímulos para o desenvolvimento acontecer. A pobreza aumenta a pobreza, não permite quebrar os ciclos inter-geracionais das desigualdades”, explicou Mariana.
Para Cláudia Costin, diretora do centro de políticas educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), “olhar para a primeira infância não deveria ser tarefa apenas das secretarias municipais, mas das estaduais também”. Mais do que isso, a gestão da primeira infância pelas instituições deveria “olhar para a interssetorialidade”, envolvendo ações em saúde, assistência social e educação conjuntamente.
A educadora e economista mencionou experiências no Rio de Janeiro de construir creches ao lado de centros de saúde, “para construir sinergias”. Ela sugeriu ainda “voltar a pensar em vacinar crianças nas creches, com autorização dois pais”.
Falta de creche mata
Alckmin contou um episódio envolvendo diálogo sobre câncer infantil, quando era governador de São Paulo. Ele ouviu de uma professora e médica baiana que o que mata mais crianças não é a doença, mas acidentes. Segundo o relato da sua interlocutora, a criança “cai no buraco, na piscina, se acidenta no cozinha”. Essa realidade – acrescentou o vice-presidente – mostra a importância da creche, e ilustra a “interssetorialidade” mencionada por Costin.
Médico de formação, Alexandre Padilha defendeu um “olhar articulado” na defesa e proteção da primeira infância. Segundo ele, ter uma política para a primeira infância tem um efeito sistêmico. “O cuidado muda a realidade do entorno. Ter uma política para a primeira infância muda não só a realidade daquela criança, da família, mas da comunidade e da cidade, e por consequência do país. Não é possível pensar desenvolvimento sustentável sem pensar uma política pra primeira infância”, frisou ainda o ministro.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou em 4 de maio o decreto que recrio o Conselhão. O colegiado, consultivo, tem 246 conselheiros e seus debates subsidiam a formulação de políticas públicas, de todas as áreas da sociedade civil.