Justiça manda Doria devolver às escolas apostilas que abordavam gênero
A Justiça de SP determinou que o governador do Estado de São Paulo tem 48 horas para devolver às escolas da rede estadual as apostilas que foram recolhidas no último dia 3, sob alegação que promoviam “apologia à ideologia de gênero”. A decisão é uma resposta à uma ação popular movida por um grupo de professores de universidades públicas do Estado de São Paulo, nesta terça-feira, em que pediam a suspensão da retirada dos materiais das escolas e sua devolução em plenas condições de utilização.
Além de conceder liminar favorável aos professores, a juíza de direito Paula Fernanda de Souza Vasconcelos Navarro determinou, para além de prazo de devolução, uma multa em caso de descumprimento da ordem.
A ação, que teve como autores professores da UFABC, Unifesp, UFSCar, IFSP, USP e Unicamp, partiu do entendimento que o governador violou a Constituição, a legislação educacional, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o próprio Currículo Paulista com base apenas em uma visão ideológica sobre o tema.
Doria alegou que as apostilas que seriam utilizadas pelos estudantes do 8º ano do Fundamental continham “erros inaceitáveis” e que promoviam a “ideologia de gênero”, fazendo alusão a textos que abordavam a questão da sexualidade e da identidade de gênero. A Secretaria de Educação, por sua vez, alegou que o tema da identidade de gênero estaria em desacordo com a Base Nacional Comum Curricular, aprovada em 2017 pelo Ministério da Educação e também com o Novo Currículo Paulista, aprovado em agosto de 2019.
Os documentos, no entanto, não descartam o tema da sexualidade e afirmam a necessidade de reconhecê-la em sua integralidade, a partir de argumentos que evidenciem as dimensões biológicas, socioculturais, afetivas e éticas, valorizando e respeitando a diversidade de manifestações e expressões da identidade humana e compreendendo o preconceito e a discriminação como uma construção social”.
Para o professor da UFBAC, Fernando Cássio, um dos autores da ação, “é inaceitável que um documento curricular recém-aprovado e que preconiza o ensino de aspectos socioculturais, afetivos e éticos da sexualidade seja utilizado para justificar atos de censura. Não há justificativa”, contesta.
O professor Salomão Ximenes, que também assina a ação, complementa: “O autoritarismo do ato de censura violou regras básicas de funcionamento do sistema educacional e de direito à educação. Não cabe ao Governador produzir o currículo com base em sua própria ideologia, essa é uma tarefa que a Lei atribui aos profissionais da educação, seguindo as diretrizes curriculares aprovadas nas instâncias competentes”.
Os professores envolvidos na ação contaram com o apoio do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu). A advogada Eloísa Machado, integrante do coletivo, explica: “a censura é vedada pela Constituição. O Governador não pode interferir em material didático porque gosta ou desgosta de seu conteúdo. O STF já avisou que ‘cala a boca já morreu’”.