Lula e Alckmin lançam diretrizes programáticas, com unidade histórica de sete partidos

Aliança inédita de partidos, que nunca estiveram juntos em eleição presidencial desde a redemocratização, enfatizou a unanimidade em torno das propostas, assim como sua plena capacidade de serem factíveis

Lideranças dos sete partidos que compõem a aliança de apoio à pré-candidatura de Luis Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin enfatizaram nesta terça-feira (21) a unanimidade e a convergência em torno das diretrizes de programa de governo da chapa presidencial. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSB), lançaram, em São Paulo, o documento com as diretrizes do programa de governo. O evento teve a participação dos presidentes do PT (Gleisi Hoffmann), PSB (Carlos Siqueira), PCdoB (Luciana Santos), PV (José Luiz Penna), Rede (Randolfe Rodrigues), Psol (Juliano Medeiros) e Solidariedade (Paulinho da Força). Participaram também personalidades convidadas ligados a diversos segmentos sociais.

A sociedade também é convidada a contribuir para o programa de governo, sugerindo propostas neste site. “Quando a gente toma a decisão de fazer uma plataforma é porque nós queremos que a sociedade brasileira assuma a plenitude da sua responsabilidade e diga ‘eu elegi vocês, mas eu quero participar da minha governança, eu quero dar o meu pitaco, dar o meu palpite’”, disse Lula.

“Nós estamos dando a demonstração de que nós não temos medo. E eles têm que se preparar porque, no orçamento da União, nós vamos reproduzir a plataforma para construir o orçamento nacional. Nós já tivemos sucesso extraordinário nas prefeituras (com o orçamento participativo). Não dá para a gente recuperar este país com orçamento secreto. Não dá, efetivamente não dá”, afirmou.

Em seu discurso, Lula destacou que as diretrizes do programa apresentadas hoje são “o alicerce”. “Vamos ter que construir a casa ao longo do tempo”. Segundo ele, “governar é mais difícil do que ganhar a eleição. Sobretudo quando estamos com a tarefa de reconstruir”.

“Se a gente está falando em reconstrução, a gente deveria comparar essas diretrizes à construção de uma casa. Nós vamos ter os tijolos da parede que significa acabar com a fome outra vez, vamos ter os tijolos que significam aumentar o salário mínimo e nós vamos construindo tijolo por tijolo até chegar na cobertura da casa, que é o material da soberania”, explicou o ex-presidente.

“Um país não será soberano apenas porque cuida da fronteira, do espaço aérea. Não. Um país será soberano quando seu povo for respeitado, tiver emprego, tiver educação, tiver salário, comer, tiver saúde. Quando o povo tiver conquistado uma cidadania digna, que todo ser humano tem direito, que está na nossa Constituição, está na Declaração Universal dos Direitos Humanos e está, inclusive, na Bíblia.”

Mas ele enfatizou a importância da população votar em deputados e senadores comprometidos com a “reconstrução” do Brasil. “Para que, chegando no dia D, a gente possa ter uma maioria qualificada para fazer as mudanças que o país precisa.”

A aliança com Alckmin, segundo Lula e várias outras lideranças presentes, é “o grande fato novo da política brasileira”. “Jamais imaginei que a gente pudesse estar junto numa campanha. Acho que Alckmin também jamais imaginou, e de repente a gente está junto.” Para o ex-presidente, os mais resistentes ao ex-governador paulista, após o estranhamento inicial, perceberam que a aliança era necessária para haver mais chance “não apenas de ganhar as eleições, mas de governar o país”.

Lula voltou a alertar para as dificuldades envolvidas nestas eleições, devido ao comportamento do adversário Jair Bolsonaro. “Um cidadão desequilibrado, um cidadão do mal, que não foi capaz de derramar uma única lágrima pelas vítimas da covid.”

“Esse governo vai terminar (e) ele nunca recebeu os dirigentes sindicais, os governadores, os prefeitos, nenhum movimento social, nunca atendeu ninguém da sociedade”, observou o petista, que citou o caráter “desumano” de Bolsonaro diante da tragédia com as chuvas em Pernambuco. “Mais de 130 pessoas morreram, esse cidadão foi lá, sobrevoou, nem desceu, e foi pra Santa Catarina andar de jet ski, depois foi fazer motociata em Miami. Precisa ser estudado pra ver de onde surgiu essa figura”, afirmou Lula.

Ainda segundo ele, um programa de governo não pode propor o que é irrealizável. No primeiro mês de governo, a tarefa é reunir os 27 governadores para começar a reconstruir o pacto federativo. “Quero saber o que eles têm de projeto, de infraestrutura, pra que a gente não perca tempo.”

Reconstrução, esperança e compromisso

Alckmin disse que a viagem que fez com Lula na semana passada foi enriquecedora pela experiência de “ouvir” diversas vozes da sociedade. Citou a agricultura familiar, o cooperativismo, artesanato, educadores, a cultura, artistas, reitores das universidades e professores. “Não se faz um programa de governo democrático em cima de motociata e jet ski, mas ouvindo a população, dialogando”, afirmou o ex-governador que, nas últimas semanas, esteve com Lula no Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe.

Para o ex-governador, a palavra mais repetida no documento e que o sintetiza é “reconstrução”. Isso devido aos valores da cidadania envolvidos no “desmanche do Estado” pelo bolsonarismo. Citou também “esperança” e “compromisso”. “Não tem promessa, mas tem compromisso. E o primeiro compromisso que Lula tem destacado é com quem mais necessita, perdeu o emprego, passa fome, foi levado de volta à miséria.”

Mencionou também o salário mínimo com Bolsonaro: “Esse triste presidente será o único da história que deixará como legado um salário mínimo menor em termos reais do que quanto entrou”. Alckmin, que é médico, estacou o SUS como “ganho civilizatório” e exemplo de política de Estado a ser retomada como prioridade.

Sobre economia, defendeu um “crescimento inclusivo”, com regime tributário que permita distribuição. “A inflação não é socialmente neutra, atinge mais os mais pobres”. O desenvolvimento não pode destruir o meio ambiente, enfatizou. “Estamos vendo na Amazônia uma coisa inacreditável”, disse. O sistema amazônico “é destruído por criminosos para que amanhã o presidente possa titular essa terra e eles venderem”.

“O valor maior que nos une é a democracia. Nós precisamos ter boas instituições e fortalecer a Federação. Hoje, é só briga entre o governo federal, governadores, prefeitos. Vamos unir o país para a gente avançar mais. É uma questão de lado. E nós estamos do lado do povo e do lado da democracia. Vamos juntos”, convidou o ex-governador de São Paulo.

Plenamente realizável

As lideranças partidárias enfatizaram o caráter factível e plenamente realizável do programa, assim como a unanimidade em torno dele, apesar das diferenças entre as forças partidárias envolvidas em sua formulação. O documento é “uma síntese” do que pensam todos os membros da aliança, disse Gleisi Hoffmann. Ela classificou a aliança das sete legendas como “histórica”.

A petista apontou o caráter participativo dessas diretrizes para reconstruir o país. “Combater a fome e a miséria é a primeira coisa que temos que fazer.” “Os sete partidos constroem esse programa, com a grande colaboração não só das militâncias, mas da academia, dos movimentos sociais, do movimento sindical. Em cima dessas diretrizes, as pessoas vão poder colocar para nós as sugestões, que caminhos devemos seguir, quais são suas propostas para melhorar. É assim que a gente reconstrói o país. A vida do povo é a prioridade. Aqui tem a saída para o Brasil, não tenho dúvida”, afirmou.

A vice-governadora de Pernambuco e presidenta Nacional do PCdoB, Luciana Santos, reforçou que a reconstrução do Brasil precisa ser um esforço coletivo, com participação não apenas dos partidos, mas de toda a sociedade brasileira. “É um feito chegarmos a esse conteúdo em convergência, fruto do diagnóstico de uma realidade de retrocesso”.

“É necessário um processo de reconstrução deste país, ver as questões que estamos enfrentando para devolver a esperança ao povo, melhorar a qualidade de vida da população. Temos um dos planos mais ousados de integração latino-americana, para aproveitar os ventos que sopram a nosso favor no continente”, destacou ela, lembrando a vitória de Gustavo Petro na eleição da Colômbia.

“Vivemos uma situação de destruição das principais ferramentas indutoras de desenvolvimento, um momento em que voltamos para o mapa da fome. Precisamos resgatar o papel do Estado. Nem o Estado máximo, nem mínimo, mas o Estado necessário, que possa desenvolver as vocações extraordinárias do Brasil, suas potencialidades econômicas, a diversidade que temos e, sobretudo, valorizar a inteligência brasileira. Não podemos abrir mão de instrumentos como a Petrobras, a Eletrobrás, o BNDES”, disse.

Segundo a vice-governadora, o programa precisa animar a população, sinalizando tudo o que Lula representa e o legado que ele deixou. “Queremos falar de esperança, mas com propostas concretas, apontando caminhos que impactem na vida das pessoas, que possam melhorar a qualidade de vida do povo”, completou.

O senador Randolfe Rodrigues (AP), pela Rede, destacou a importância de recuperar o que foi construído nos últimos 30 anos e está sob ameaça do governo atual, especialmente na floresta amazônica. Ele disse que a frente vai “conduzir a maior tarefa de nossas vidas”. De acordo com o parlamentar, a crise atual é a mais grave da história, porque “é uma ameaça ao pacto civilizatório que formamos com a redemocratização do Brasil estabelecido na Constituição de 1988”.

Ele mencionou a retomada da democracia, e estabilização da moeda, a contenção da inflação e o resgate de milhões de brasileiros da miséria como as principais conquistas dos últimos 30 anos, atualmente ameaçadas pelo projeto bolsonarista de destruição. Dirigindo-se a Lula e Alckmin, afirmou que eles encontrarão “um país muito mais devastado do que o que receberam em 2002”.

“A Amazônia está sob a maior ameaça de sua história. A região foi entregue ao crime, ao narcotráfico, ao garimpo ilegal, desmatamento, pesca e caça ilegais. Precisamos melhorar a economia e fazer o resgate da Amazônia com desenvolvimento. É o maior patrimônio florestal do planeta”, disse o senador amapaense.

O presidente do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Carlos Siqueira, ressaltou que a plataforma foi decidida pelos partidos de forma unânime, e salientou a necessidade do “cimento da unidade” formada no movimento “Juntos pelo Brasil” para derrotar Bolsonaro. “As forças progressistas devem conquistar outros setores da sociedade para vencer o governo. É vencer ou vencer”, afirmou.

Siqueira ainda afirmou que a retomada do desenvolvimento brasileiro passa por investimentos em áreas estratégicas, como Ciência e Tecnologia e Inovação. “Não acreditamos no desenvolvimento de um país como o Brasil sem investir nelas como forma de reforçar nossa soberania, usando como base empresas importantes como a Petrobras, a Eletrobras e a Embraer”, disse ele.

José Luiz Penna, do PV, falou da “satisfação de estar na luta para recuperar a civilidade no nosso país. Agora temos a visão de que há uma reação e consistência que produzirá a vitória da civilidade diante do escândalo. A sociedade brasileira vai saber, com essas diretrizes, que poderá participar de uma maneira colaborativa, com suas ideias”.

Ele prevê uma “reação consistente que produzirá uma vitória acachapante da inteligência, do conhecimento e da brasilidade, diante desse escândalo dessa administração, onde todos estamos apavorados diante da chacina de Bruno Pereira e Dom Phillips”.

Presidente do Solidariedade, o deputado federal Paulinho da Força disse que o conjunto de forças reunido na frente “representa a esperança de que a gente possa tirar o país do buraco”. Ele destacou a falta de emprego e de renda como os principais problemas do país, e defendeu uma reforma para modernizar o sindicalismo brasileiro. Paulinho acrescentou que as diretrizes apresentadas hoje acertam ao prever, entre outros pontos, a revogação dos “marcos regressivos da atual legislação trabalhista”, a recuperação do salário mínimo, “marca dos governos Lula”.

“A falta de renda é um dos principais problemas do Brasil. A reforma sindical, a revogação de partes da reforma trabalhista, a recuperação do salário mínimo, a discussão de uma recuperação do salário dos aposentados, e do trabalho por aplicativos nos agrada muito. Nossa esperança é de que seja um programa de melhorias para o povo brasileiro”, destacou o sindicalista.

Juliano Medeiros, do Psol, destacou a convergência e a síntese do texto apresentado pelos sete partidos, garantida pela experiência política do ex-ministro Aloízio Mercadante, coordenador do programa. “Há muita diversidade entre nós, conseguir uma síntese é louvável. Estamos muito satisfeitos com o resultado”.

Segundo Medeiros, as diretrizes e a unidade têm o objetivo de interromper “o ciclo de ataques aos direitos sociais e às empresas públicas do Brasil, iniciado em 2016 com o impeachment de Dilma Rousseff”. “Para isso, queremos a revogação do teto de gastos, que impede que o Estado cumpra sua função, e temos o compromisso de revogar medidas regressivas da reforma trabalhista e mudar a política de preços da Petrobras. Não é possível enfrentar a crise de outra forma”, finalizou.

Para ex-senador e ex-ministro Aloizio Mercadante, a frente representa um “pacto histórico”, que reúne partidos que nunca estiveram juntos em eleições presidenciais passadas. A aliança tem a tarefa de reverter o desmonte e a tragédia histórica atual. Ele ressaltou, durante entrevista coletiva ao final do evento, “a liderança inigualável do presidente Lula” como essencial ao processo. Destacou “a atitude do presidente Lula de convidar Alckmin, e a ousadia do pré-candidato a vice-presidente, de aceitar o desafio”.

O coordenador da elaboração do documento reforçou que 140 emendas foram adicionadas pelos partidos à proposta elaborada pela Fundação Perseu Abramo, que ele preside. “Este documento não é a chegada, é um ponto de partida”, ressaltou o presidente da Fundação Perseu Abramo.

Uma das medidas mais discutida com os jornalistas foi a necessidade de revisão do teto de gastos, argumentando que o país já tem 11 regras para o controle dos gastos governamentais, enquanto o mecanismo criado após o golpe de 2016 não cumpriu seu objetivo. Ele se referia ao fato de o teto já ter sido quebrado inúmeras vezes pelo governo Bolsonaro.

Ele destacou que os coordenadores estão avaliando várias experiências internacionais, para apresentar uma proposta, e que sempre se levará em conta a credibilidade previsibilidade das finanças. “Não tem nenhum país da OCDE, nem da União Europeia, que mantenha um mecanismo como esse [do teto de gastos] para controlar suas contas públicas”, disse.

“Precisamos de projetos estruturantes para alavancar o crescimento. O Brasil foi um dos países que se desindustrializou mais rapidamente no mundo, porque priorizou o sistema financeiro em vez do produtivo”. Você perde valor agregado, perde empregos de qualidade, perde rendimento. Precisamos pensar numa nova indústria, mais verde, um novo modelo desenvolvimento”, disse Mercadante.

Ele ainda criticou abertamente o chamado “orçamento secreto”, que gera enormes distorções orçamentárias. Siqueira fez coro às criticas, mencionando os efeitos que bilhões de reais liberados para prefeituras, sob critérios nada republicanos, podem ter sobre as eleições pondo em risco o sistema democrático.

CLIQUE AQUI PARA LER A ÍNTEGRA DAS DIRETRIZES DO PROGRAMA

Vermelho

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